Justiça anula licitação vencida por Cachoeira no Pará
A empresa Cial Comércio e Indústria de Alimentos Ltda, ligada ao bicheiro Carlos Augusto Ramos, o “Carlinhos Cachoeira”, que havia vencido uma concorrência pública de R$ 100 milhões para fornecer comida aos 12 mil presos e 3 mil servidores do sistema penal do Pará, foi declarada “inabilitada” para prestar o serviço, segundo decisão de mérito do juiz da 2ª Vara da Fazenda de Belém, Marco Antônio Castelo Branco. Ele deu ganho de causa à empresa Oliveira Alimentos, que havia ficado em segundo lugar, para que ela continue fornecendo as “quentinhas” aos presos. O juiz julgou procedente o pedido da Oliveira Alimentos, anulando a decisão da pregoeira da Secretaria de Segurança Pública, Luciana Cunha da Silva, que na fase de habilitação das concorrentes à licitação havia considerado a Cial Alimentos como apta.
Castelo Branco, que já havia se manifestado em três decisões liminares sobre a denúncia de irregularidades envolvendo a Cial na licitação – a primeira delas autorizando a empresa a fornecer a comida e outras duas suspendendo o contrato dela com a Segup -, desta vez, ao julgar o mérito da causa, anulou o ato administrativo do secretário adjunto de gestão administrativa da Segup, que não havia aceitado o recurso interposto pela Oliveira Alimentos contra a decisão que considerou legal a participação da empresa de Cachoeira na licitação.
Em vista disso, o juiz também anulou a adjudicação e a homologação em favor da Cial feita pela Segup. O Estado vai recorrer para tentar derrubar a decisão do juiz na Câmara Cível do Tribunal de Justiça. O caso, agora, será distribuído a um desembargador. A empresa de Cachoeira foi ainda condenada a pagar 20% do valor da causa à parte contrária a título de honorários advocatícios.
A Cial é investigada em um inquérito aberto pela Divisão de Investigação e Operações Especiais (Dioe) porque teria se utilizado de meios ilegais, como a combinação de preços entre os participantes da licitação da Segup, para ficar com a maior fatia do bolo de R$ 100 milhões, de acordo com uma série de reportagens publicadas desde o final do ano passado pelo DIÁRIO. As conversas entre os empresários, gravadas em um DVD que está anexado ao inquérito, foram reproduzidas pelo jornal. O inquérito está em fase de conclusão e depois será remetido ao Ministério Público para a abertura de uma ação penal.
Foram três os argumentos da Oliveira Alimentos para anular a licitação: ausência de comprovação da qualificação econômico-financeira da Cial, que teria deixado de apresentar o balanço patrimonial; a falta de comprovação de qualificação técnica, haja vista que a nutricionista que consta como responsável pela Cial no alvará de autorização sanitária não integra o quadro de pessoal da empresa e nem há provas de que possui registro no conselho regional; e, por fim, a existência de ação civil pública em Goiânia por suposta improbidade praticada pela Cial.
MORAL
“Quanto à ausência de comprovação de qualificação econômico financeira da Empresa Cial, procede, tendo em vista que a simples consulta ao Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores (Sicaf) não comprova a capacidade econômica da empresa”, diz Castelo Branco na sentença. A ausência de comprovação de qualificação técnica da nutricionista que consta como responsável da empresa, mas que não era do quadro, também pesou na decisão do juiz. No caso da idoneidade da Cial, ele lembrou a existência de ação civil pública que tramita em Goiânia tendo a empresa como investigada. “A idoneidade aqui não é profissional ou técnica, mas, moral, que é requisito constitucional para admissão ao serviço público”.
Para Castelo Branco, a tentativa de um acordo proposto pela empresa de Cachoeira à Oliveira Alimentos seria “no mínimo imoral”, afirmando que a transparência “deve prevalecer em processos licitatórios”. No caso do DVD com as conversas nada republicanas, ele diz que, ainda que não haja trânsito em julgado dos fatos que estão sendo apurados, “não posso fazer de conta que o material não foi analisado antes de ser remetido ao Ministério Público, onde a investigação vai dirimir definitivamente os fatos”.
Entenda o caso
1- Em dezembro do ano passado o promotor Nelson Medrado recebeu um DVD contendo várias conversas entre empresários do ramo de alimentos que disputavam uma licitação de R$ 100 milhões para o fornecimento de alimentação aos presos, agentes penitenciários e militares que atuam nas penitenciárias de todo o Pará.
2- Nas conversas, a empresa Cial, ligada ao contraventor Carlinhos Cachoeira, fazia propostas indecentes, sugerindo preços que a fariam ganhar a maioria dos lotes de fornecimento da comida, dando em troca pequenas fatias aos que concordassem em fazer parte da maracutaia.
3- Uma das empresas, Oliveira Alimentos, não aceitou fazer parte do esquema, e por isso foi derrotada no pregão eletrônico da Secretaria de Segurança, perdendo por incrível um centavo.
4- Um inquérito, onde os envolvidos foram ouvidos, está em andamento na Divisão de Investigação e Operações Especiais (Dioe), que tem no comando o delegado Rogério Moraes. Quando for concluído, esse inquérito será enviado ao Ministério Público para abertura de ação penal.
5- O pedido de saída da Cial do processo licitatório da Segup foi motivado por três razões, agora acolhidas no julgamento do mérito da questão pelo juiz Marco Antônio Castelo Branco: ausência de comprovação da qualificação econômico-financeira, falta de qualificação técnica e a existência de ação civil pública em Goiânia por suposta improbidade praticada pela Cial.
6 – O governo do Estado vai recorrer ao Tribunal de Justiça, para tentar cassar a decisão do juiz Castelo Branco. O recurso deve ser julgado por um desembargador de Câmara Cível.
Fonte: Diário do Pará