Geller: “Visão da amazônia intocável ou de exploração sem compensação, prejudica população”
Gabriel Geller diz que é necessário encontrar um meio termo em relação ao desenvolvimento da região.
O advogado Gabriel Geller, analista financeira, esteve na redação da TV Impacto e Jornal O Impacto, onde concedeu entrevista exclusiva ao jornalista Osvaldo de Andrade. Estamos em época de eleição para vários cargos. É importante que neste ano, cada pessoa saiba de nossa responsabilidade. Gabriel Geller faz uma avaliação dessa situação com todo esse movimento de candidaturas, ao nível nacional e estadual.
“Eleição é sempre um momento decisivo, onde a população faz valer sua vontade. Dentro desse tema de perspectiva para desenvolvimento econômico, social e ambiental, precisamos conhecer o que esses candidatos pensam, como é que eles enxergam o desenvolvimento de nossa região. Em nível nacional, por exemplo, como é que os candidatos a Presidente, Senado e Deputado Federal, percebem o processo de desenvolvimento da Amazônia. Há duas visões hoje muito fortes e que não nos servem. Existe uma visão que permeia diversas Ongs, órgãos ambientais e setores do próprio Judiciário do Governo, que entendem a Amazônia como um santuário intocável. E aí, nós temos ironicamente que dizer, que nós temos que viver aqui uma eterna contemplação da natureza intocável. Só que nós somos mais de 25 milhões de pessoas nos estados que compõem a Amazônia Legal e vivemos na zona urbana, precisamos, temos necessidades e desejos semelhantes à população do Sul e Sudeste; precisamos de saúde, comunicação, ter acesso aos confortos da vida e tecnologia. Tudo isso tem seu preço e precisa ter possibilidades para que as pessoas tenham condições de brigar por aquilo que querem. Outra visão que tem preponderado nas relações do Pará com a União, é a exploração de nossos grandes recursos, mineral, elétrico e outros, sem a devida contrapartida. Por exemplo, quando é construída uma hidrelétrica aqui na região, todo ônus social e ambiental é nosso. Essa energia não vem para abastecer nossa população, e o ICMS gerado na comercialização dessa energia não fica aqui, pois é pago onde é consumida a energia, nos grandes centros do País. No caso da mineração, nossos recursos minerais são explorados e exportados ao exterior, a Lei Kandir isenta ICMS e o estado do Pará não arrecada nada. Isso reflete, para mim, uma certa visão histórica que a Amazônia é um lugar pra ser explorado, pra suas riquezas serem exploradas, sem uma preocupação maior com a construção verdadeira da riqueza dos amazônidas. Temos que ter uma visão que contemple a criação e a geração de riquezas aqui. Vai precisar cortar questões ambientais pra isso? Vai, desde que o benefício gerado por essas atividades econômicas, em termos de empregos, renda e arrecadação, seja maior que ônus causado. Aí acho que a gente pode começar a entender o processo de desenvolvimento sustentável para nossa região, nossas cidades, que atenda realmente os interesses da população. Agora, isso não é bonito de falar, o discurso fica bacana, mas colocar isso em prática, construir esse entendimento, é muito difícil, mas é imprescindível. Uma coisa é certa, um ponto de partida para o debate é que nós precisamos atender à necessidade de 25 milhões de pessoas e boa parte delas vem da zona urbana, então, com todo respeito à questão de minorias, como indígenas e quilombolas têm seus direitos e devem ser respeitados, mas eu estou falando da ampla massa urbana desempregada ou subempregada que precisa de oportunidade”, esclareceu.
Essa avaliação toda deveria ter a participação dos que pretendem chegar ao poder para que eles tomassem um rumo? Questionamos. “O primeiro passo é saber da parte do eleitor se os candidatos são sensíveis a esses temas, como eles enxergam esses temas, se isso está na agenda deles de construção de uma Amazônia mais justa e, se tiver, aí então teremos visões distintas, o candidato vai olhar de uma maneira, outro candidato vai enxergar de outra. Isso é um processo democrático, mas isso tem que estar na pauta, tem que ser primeira linha na pauta dos candidatos”.
Ao ser questionado se, com sua visão e experiência, ele destacaria alguns segmentos que estão demonstrando que podem ser o caminho a seguir, Gabriel Geller disse: “Afunilando essa realidade que a gente falou sobre Amazônia, Pará e Santarém, somos aqui em média 300 mil habitantes, um milhão de habitantes na região de influência de Santarém, a população economicamente ativa continua em torno dos 150 mil e o saldo de geração de empregos foi instável esse ano, 353 empregos positivos. No geral temos aproximadamente 30 mil empregos formais no município de Santarém para essa população de 150 mil em idade economicamente ativa. É pouco, está precisando gerar mais empregos, para Santarém sair dessa renda per capta menor que a metade da renda nacional. Somos uma cidade com riquezas, porém, com uma população ainda pobre em termos de recursos financeiros. Temos que apostar em uma diversidade de setores, temos potencial turístico com riqueza natural e cultural. Está aí, para melhorar a estrutura é apostar nisso, na pecuária e agricultura, tanto na agricultura familiar como de exportação, já bem mostrado por resultados, que representa 10% do nosso PIB junto com investimento na pecuária. Tem gente fazendo isso, está apostando em melhoramento genético de rebanho em ganhos de eficiência, adotando modelos diferentes daquele antigo da pecuária extensiva da várzea aqui da Amazônia e tendo resultados bons sobre isso. A indústria, porque nós temos que comprar produtos industrializados de fora, nós só temos aqui a pequena indústria como panificação ou gráfica. Os produtos naturais de nossa região, boa parte não são beneficiados aqui, a gente vai no supermercado e compra cada coisa simples de se produzir, algo que poderia ser produzido aqui, mas compramos o que é produzido fora. Esses dias eu comprei uma manteiga beneficiada e fiquei satisfeito em ver que era daqui. Eu acho que o empresariado tem acordado para isso, já tem muitas iniciativas ainda começando no sentido de beneficiar nossa produção para vender para o consumidor local primeiramente. Não precisa montar uma indústria para vender e concorrer com São Paulo, talvez a gente possa começar uma pequena indústria beneficiando um alimento aqui e vendendo para o mercado local até ganhar força. Na área de serviços, além do turismo, temos a gastronomia; tem gente fazendo sucesso com a gastronomia santarena, temos festivais de gastronomia aqui em Santarém. Santarém é um pólo centralizador de serviços de saúde, essa população de um milhão de habitantes, que é grande em torno, vem aqui para buscar tratamentos de saúde e nessa esteira da saúde pode se entrar a área da estética e cosmética, todos os cuidados com o bem-estar. Me refiro ao setor público e privado, ao atendimento no setor privado de saúde em Santarém, via convênios e cartões de descontos cresceu, novas empresas surgindo, empresas que já são tradicionais sempre se renovando e crescendo, então, é um setor bom para se investir e crescer em Santarém. Podemos mencionar o setor de lazer, buscando outras opções e oportunidades de lazer, onde se é complicado e que é um setor que está se reinventando em Santarém, porque o modelo antigo não vai mais se encaixar e a gente ainda não encontrou os caminhos dos novos modelos. O comércio, Santarém sempre foi muito forte em seu comércio e representa metade do seu PIB pelo lado da produção e o comércio antigo e tradicional, que foi feito há muitos anos, enfrentou dificuldades nessa crise e, diante dessas dificuldades muitas lojas fecharam. A concorrência hoje é brutal com a internet, também existe o problema da informalidade no comércio, até mesmo com relação a mercadorias saídas de zonas de benefícios fiscais, então, o comércio está precisando se reinventar. O comércio como foi feito ao longo dos anos, eu entendo que ele vai ter cada vez mais dificuldade, o nosso comércio é predominantemente um comércio popular e vai continuar sendo, pois é o perfil de renda da nossa população. A gente vê que os empreendimentos que buscam um público mais premium, um público de renda mais alta, ainda não encontraram maturação; no caso os shopping centers, estão surgindo, mas estão patinando para encontrar sua maturação; alguns empreendimentos isolados têm sucesso. Nosso comércio popular vai continuar existindo e sendo forte, mas quem está no comércio é geralmente quem mais está precisando buscar alternativas para se reinventar”.
Tem aquela situação dos portos, que tentaram implantar e que teve aquela reação toda. Também se reclamou de novo com relação à infra-estrutura da Santarém-Cuiabá e da Transamazônica. “É outro ponto que ainda não tocamos e que eu considero um viés importante para o desenvolvimento econômico de Santarém. Que nós sejamos um entreposto comercial logístico, temos uma posição geográfica privilegiada”.
Seria o momento em que os pretendentes a cargos políticos fazerem uma espécie de acordo com os que querem chegar à Presidência, assumir um compromisso com a região? Perguntamos.
“Esse é um tema sensível porque muitos candidatos e autoridades públicas têm receio em se manifestar favoráveis. Por exemplo, a instalação de zonas portuárias em Santarém, porque tem muita gente que é contra e perde voto. Eu não tenho receio de dizer dentro do que manda a Legislação com responsabilidade ambiental, tem que ter uma zona portuária mais forte em Santarém. Tem alguma coisa, mas precisamos de mais, nós temos uma janela importante geograficamente muito bem localizada, acesso a meios de transportes, navios de grande escalada chegam aqui e acho que é uma das alternativas para se gerar riqueza e renda em Santarém”, informou.
Nossa região é muito abastecida devido à situação de pobreza da população com o Bolsa Família. Há informações que famílias que recebiam que eram contempladas com esse programa deixaram de receber. Como o senhor avalia essa questão? Voltamos a perguntar.
“A gente tem no município de Santarém pelo registro do Cad Único mais de 60 mil pedidos do Bolsa Família. Tínhamos antes dessa revisão cerca de 30 mil benefícios do Bolsa Família concedidos. Isso, de imediato, soa como uma alarme. Isso não é um bom sinal, que a gente tenha essas pessoas nesse estado de necessidade. Como é que eu enxergo o programa Bolsa Família? Ele tem que ser uma assistência humanitária para a população que esteja em uma situação em que não tenha condições de produzir renda. Humanitária e temporária, tem que ter porta de saída, não tem que ser um programa de perpetuação de qualquer um no poder. Tem gente que comenta: ‘Ah!, se fulano entrar vai perder o Bolsa Família. Vota em mim porque eu te dou o Bolsa Família’. Isso não faz o menor sentido, só política de Estado. Nós não podemos compactuar com a realidade de um cidadão passando por necessidade absoluta, tipo fome, o programa tem sua finalidade, mas o Bolsa Família tendo servido em diversas circunstância como forma de troca eleitoral. Tinha gente recebendo que não se enquadrava nos requisitos, então, realmente tem que fazer essa limpeza no cadastro para dar o benefício para quem efetivamente necessita, porque os recursos são escassos. O Estado brasileiro não possui recursos ilimitados para investir em todas essa frentes, são três anos com déficit e a perspectiva não sai desse déficit até os dois anos,ainda que haja toda forma de organização, ajuste fiscal e responsabilidade fiscal”, finalizou Gabriel Geller.
Por: Allan Patrick
Fonte: RG 15/O Impacto