Onze mulheres estão na lista de ameaçados de morte

Laísa Santos Sampaio, irmã da extrativista assassinada Maria do Espírito Santo, é o alvo da vez em Ipixuna do Pará
Laísa Santos Sampaio, irmã da extrativista assassinada Maria do Espírito Santo, é o alvo da vez em Ipixuna do Pará

Das 38 pessoas diretamente ameaçadas de serem assassinadas no sul e sudeste do Pará, onze são mulheres. Se antes elas carregavam a sina de serem viúvas de lideranças sindicais rurais que precisavam cuidar do que restara da família, nos últimos anos o próprio papel de líderes no campo colocou mais mulheres na rota das balas. A violência agrária já não escolhe sexo.

Um dos nomes que chama a atenção atualmente é o de Laísa Santos Sampaio. Irmã da extrativista Maria do Espírito Santo, assassinada em Nova Ipixuna em 2011, Laísa é o alvo da vez no município. Ela e o marido José Maria Gomes Sampaio, o Zé Rondon, estão sendo ameaçados de morte desde o assassinato de Maria e José Cláudio Ribeiro da Silva. Há exatamente um ano, no dia 30 de março de 2012, uma pessoa foi até a porta da casa de Laísa e matou a tiros o cachorro do casal. Um gesto intimidador. Nos dias seguintes, foram disparados tiros próximos à casa de Laísa e Zé Rondon.

Laísa já não dorme tranquilamente e não pode sair de casa sem acompanhamento. A rotina pessoal mudou, afetando diretamente a organização social da família, na relação com os filhos e no trato da lavoura e do extrativismo no lote do casal. A Comissão Pastoral da Terra acredita que as ameaças têm sido feitas por pessoas que provavelmente fizeram parte do consórcio dos proprietários de terras, madeireiros e carvoeiros que assassinou José e Maria. As ameaças de morte foram registradas na Delegacia de Conflitos Agrários do Sudeste do Pará (DECA).

A situação de Laísa chama a atenção. Nos próximos dias, com o julgamento do caso de Nova Ipixuna, os olhos do Brasil e do mundo estarão voltados para a situação agrária no município. Mas há outros casos similares nesse pedaço do Pará.

Em Rondon do Pará, Zuldemir Santos Jesus, a “Nicinha” e Maria Joel Dias Costa são nomes conhecidos pela intensa participação na organização de trabalhadores rurais. Zuldemir faz parte da diretoria do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Rondon do Pará. É um sindicato visado. Vários trabalhadores rurais e lideranças do STR já foram assassinadas nas últimas décadas. Entre eles, Alfim Alves, José Dutra da Costa e Ribamar Francisco.

Zuldemir recebeu proteção da Força Nacional entre outubro de 2011 a maio de 2012. Continua sendo monitorada, à distância, pela Sociedade de Defesa dos Direitos Humanos. Depois da retirada da segurança ostensiva da Força Nacional, ‘Nicinha’ deixou de acompanhar regularmente as atividades do Sindicato por se sentir insegura.

DIALETO DO MEDO

Insegurança passou a fazer parte do vocabulário de Maria Joel Dias Costa, coordenadora regional da Fetagri, desde a morte do marido, o sindicalista José Dutra da Costa, o Dezinho, assassinado em Rondon do Pará no dia 21 de novembro de 2000, a mando dos fazendeiros Décio José Barroso Nunes e Lourival de Sousa Costa.

Depois da morte de Dezinho, Maria Joel assumiu a direção sindical de Rondon em substituição ao marido. Assumiu também a luta pela apuração do assassinato de Dezinho e de outros trabalhadores assassinados no município em razão dos conflitos pela terra. Passou então a receber ameaças de morte. Por isso há seis anos foi inserida no Programa de Defensores de Direitos Humanos e passou a ter proteção ostensiva 24 horas.

“Não saio mais desacompanhada”, diz Regina Maria Gonçalves Chaves, em Eldorado dos Carajás. Regina é presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais do município. No dia 15 de junho de 2012 um grupo de fazendeiros invadiu a sede do sindicato e a ameaçou diretamente. “Os fazendeiros deixaram um recado: estariam com grupos armados à espera de qualquer tentativa de ocupação por parte dos movimentos sociais”, diz ela. Dias depois, pessoas estranhas foram vistas rondando a sede do sindicato e à procura de Regina na casa dos familiares dela.

BALA NA CARNE

Além do medo, Graciete Souza Machado convive com um indesejado inquilino no próprio corpo. Uma bala alojada a apenas dois centímetros da coluna vertebral. Resultado direto do envolvimento dela com o Sindicato dos Trabalhadores Rurais no município de Breu Branco.

Em 2010, um grupo de 1.500 famílias de trabalhadores rurais, coordenado por Francisco Alves de Macedo ocupou a fazenda Castanheira, próxima a Breu Branco. Graciete Souza Machado, filha de Francisco Macedo, assumiu liderança do grupo junto ao pai. No dia 11 de outubro de 2010, pistoleiros tentaram assassinar pai e filha. Graciete foi baleada. Cinco meses depois Francisco Alves foi morto por pistoleiros. Num caso raro, os mandantes do crime estão presos, mas alguns pistoleiros continuam soltos e fazendo ameaças.

“Eu sou ameaçada de morte desde 2010. Não temos liberdade para sair de casa com nossas crianças. Vivemos totalmente inseguros e com muito medo, pois a qualquer momento, como aconteceu com o meu pai, pode acontecer comigo. Eu tenho muito medo. Se pudessem ajudar com o meu tratamento médico já seria muito bom”, diz ela.

Em Santana do Araguaia, Elizabete Lima da Silva ficou frente a frente com o pistoleiro contratado para matá-la. “Não vou fazer o serviço”, disse o pistoleiro de nome ‘Amaral’. Isso não bastou para tranquilizar a integrante do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Santana do Araguaia e coordenadora da Associação ‘Deus por nós’.

Elizabete atua num projeto de assentamento criado na década de 80. A maior fazenda dentro do projeto é uma terra de 400 alqueires, ocupada ilegalmente, segundo a Comissão Pastoral da Terra, pelo fazendeiro João Moreira. O grupo de acampados da Associação “Deus por nós” tomou conhecimento da situação irregular da fazenda e ocupou a área em 2009.

Logo depois da ocupação, um pistoleiro não identificado foi até a casa da mãe de Elizabete e disse para ela sair da fazenda, caso contrário seria morta. Pessoas desconhecidas voltaram à casa da mãe de Elizabete outras vezes, com ofertas que chegaram a R$ 100 mil, para que Elizabete desistisse. Em vão. Como retaliação, em agosto de 2010 um grupo de aproximadamente 20 homens armados e encapuzados expulsaram os acampados da fazenda. Uma pessoa foi baleada na perna.

A líder rural teve que se esconder em uma mata próxima, enquanto ouvia os pistoleiros dizendo, que “era para matar a Elizabete”.

Os procuradores do Incra já ingressaram com uma ação de reintegração de posse da área perante a Justiça Federal, para retirar o fazendeiro João Moreira. O processo está parado em razão de um conflito negativo de competência. Elizabete Lima da Silva convive com o medo e a intranquilidade. Sabe que corre sérios riscos, por apoiar os trabalhadores rurais do Acampamento Pé da Serra.

Fonte: Diário do Pará

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *