Por 11 votos a 9, cassação de Cunha avança na Câmara

Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara
Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara

No processo mais longo de sua história –oito meses após a apresentação da denúncia–, o Conselho de Ética da Câmara aprovou nesta terça-feira (14) por margem apertada parecer favorável à cassação do mandato de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), já afastado de suas funções desde o dia 5 de maio.

Por 11 votos a 9 e após muito bate-boca, o colegiado corroborou o relatório do deputado Marcos Rogério (DEM-RO), para quem não faltam provas de que Cunha quebrou o decoro parlamentar ao omitir a existência de contas no exterior que, segundo a Procuradoria-Geral da República, foram abastecidas em parte com dinheiro do petrolão. “Estamos diante do maior escândalo que esse colegiado já julgou”, disse Marcos Rogério.

Cunha só perderá o mandato, porém, caso o plenário da Câmara confirme o parecer do Conselho com o voto de pelo menos 257 dos seus 512 colegas. A votação é aberta e ainda não tem data para ser realizada.

O voto decisivo foi dado pela deputada Tia Eron (PRB-BA), que sofreu intensa pressão nos últimos dias, faltou à sessão de votação na semana passada e era considerada pelos aliados de Cunha como apoio certo para salvar o mandato do peemedebista.

Em uma fala inflamada nesta terça, ela atacou colegas que criticaram seu sumiço e seu silêncio, afirmando não ter sido “abduzida” e que estava se resguardando. E disse que estava ali para resolver “o problema que os homens não conseguiram resolver”. “Não mandam nessa nêga aqui!”´. As indicações da deputada de que poderia votar contra Cunha levaram o Conselho a desistir de adiar a votação mais uma vez. Em seu voto, ela disse que não poderia absolver Cunha.

Wladimir Costa (SD-PA), um dos mais ardorosos defensores de Cunha, mudou o voto e apoiou a cassação após a decisão de Tia Eron.

RELATOR

Em seu discurso final, o relator afirmou não ter dúvidas da culpa de Cunha.

“Estamos diante do maior escândalo que esse colegiado já julgou, trata-se de uma trama para mascarar uma sucessão de crimes. (…) O que há aqui, com todo respeito, é uma verdadeira ‘laranjada'”, disse Marcos Rogério, em referência à suposta tentativa de Cunha de ocultar seus bens no exterior.

Segundo o relator, provas não faltam nesse processo. “Para determinar se Eduardo Cunha é ou não titular da conta [da Suíça], basta fazer como ensina o caso Watergate [que levou à renúncia de Richard Nixon]: seguir o dinheiro, o caminho do dinheiro é revelador, mostra quem é o dono, quem tem as senhas, quem movimenta a conta, a quem o banco deve mandar correspondências e a quem deve prestar contas. Ora, não é adequado premiar a esperteza em detrimento da verdade.”

A representação contra Cunha foi apresentada na Câmara pelo PSOL e pela Rede em 13 de outubro de 2015.

Apesar de Cunha ser hoje réu, denunciado e alvo de inquéritos e de pedidos de inquérito sob a acusação de integrar o petrolão, as investigações do Conselho acabaram se concentrando quase que exclusivamente na afirmação de que ele mentiu aos seus pares em depoimento espontâneo à CPI da Petrobras. Na ocasião, março de 2015, ele negou ter “qualquer tipo” de contas no exterior.

O advogado de defesa de Cunha, Marcelo Nobre, também fez uma fala inflamada afirmando que Cunha não mentiu à CPI já que não teria conta, apenas ligação com trusts [administradoras de bens ou direitos de terceiros]. “Não existem provas, o que está acontecendo aqui é linchamento. (…) Cadê o nome da conta do meu cliente, o nome do banco e o nome dele? Cadê a conta? Não existe”, afirmou, exibindo um papel com a inscrição “cadê a conta?”.

AFASTAMENTO

A limitação da investigação se deu principalmente pela ação de aliados e do próprio Cunha, que até o início do mês passado presidiu a Câmara com grande ascendência sobre seus pares.

As manobras acabaram levando o Supremo Tribunal Federal a decidir, por unanimidade, afastá-lo de suas funções sob o argumento de que sua permanência à frente de uma das casas do Legislativo era deletéria para as investigações da Lava Jato e do Conselho de Ética.

Entre as manobras que levaram o atual processo a ser o mais longo da história estão a destituição do relator inicial do caso e a anulação da primeira votação preliminar em decisões tomadas pelo presidente interino da Casa, Waldir Maranhão (PP-MA), também apoiador de Cunha. Maranhão também foi o responsável por proibir o Conselho de ampliar o rol de acusações contra o peemedebista.

Na sessão desta terça, a maioria dos discursos foi favorável à cassação do peemedebista. “Se o resultado que sair daqui não for a aprovação desse relatório, quero dizer que esse Conselho de Ética deve se extinguir, que esse Conselho não terá legitimidade ou autoridade para cassar nenhum outro deputado. Nenhum caso teve tantas evidências, tantas provas. Esse Conselho, se não aprovar a cassação, deixa de ter qualquer autoridade moral para punir quem quer que seja”, disse o deputado Betinho Gomes (PSDB-PE).

Entre os defensores de Cunha estavam os deputados Sérgio Moraes (PTB-RS), que há alguns anos se notabilizou ao dizer se lixar para a opinião pública ao defender outro colega que estava sob risco de cassação, e Carlos Marun (PMDB-MS). “Aqui não existem provas que nos levem à pena capital, à pena de morte a um deputado que com muita competência conduziu essa Casa”, disse Marun.

PRÓXIMOS PASSOS

A decisão desta terça não representa o fim da linha para Cunha. Sua defesa irá recorrer à Comissão de Constituição e Justiça, a principal da Casa, para tentar anular a votação. O argumento é o de que o Conselho praticou variados atentados processuais durante a tramitação do caso.

Além disso, seus aliados tentarão aprovar no plenário da Câmara uma punição mais branda, como a suspensão do mandato por três meses.

Para isso, aliados contam com a alteração das regras para cassação dos mandatos. Por iniciativa de Maranhão, a CCJ deve votar nos próximos dias parecer que, entre outras coisas, permitirá a presentação de emendas ao relatório aprovado pelo Conselho de Ética durante a votação no plenário.

Aliados ainda tentam convencer Cunha a renunciar à presidência da Câmara como forma de dar aos deputados argumento para votar a favor de uma punição mais branda.

Fonte: Folha de São Paulo

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