O Ministério Público pode ditar ato político?

Artigo do advogado socioambiental Ismael Moraes

A OAB reagiu a uma Recomendação (aliás, deselegante ao ponto de observar erros de português na redação dos vereadores, mas também conter erros de vernáculo incompatíveis à formação dos subscritores) enviada pelo Ministério Público estadual em Santarém ao prefeito e ao presidente da Câmara Municipal. Recebi uma cópia dessa Recomendação, e constatei que os promotores de Justiça adentram no mérito do ato político dos agentes eleitos pelo povo de Santarém. Isso é possível?

A Constituição diz que os poderes da República são o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. O Ministério Público faz parte do capítulo reservado às funções essenciais ao funcionamento da Justiça, assim como a Advocacia e a Defensoria Pública. A OAB, por seu lado, é a única entidade profissional não subordinada a qualquer poder público a quem a Constituição Federal confere poderes de interferir perante o Judiciário em assuntos de interesse da República, da Democracia e em defesa dos direitos fundamentais da coletividade. Isto porque os advogados, no exercício do seu “ministério privado”, “prestam serviço público” (Lei Federal nº8.906/94).

Assim, os membros do Legislativo e Executivo recebem mandato dos cidadãos para darem cumprimento ao que o povo quer para aquele momento histórico, conforme os anseios econômico e social. O mérito das decisões dos políticos eleitos, as leis e os decretos, só podem ser revistos pelo Poder Judiciário através dos controles de constitucionalidade.

Então, onde operam as funções do Ministério Público, uma vez que sequer está o órgão no mesmo de grau de poder que os 3 citados?

É na forma, na legalidade do procedimento ou do processo legal legislativo pela qual os referidos agentes políticos eletivos (ou seja, excluindo os magistrados) ditarem as normas pode ser controlada por qualquer cidadão ou associação, através de advogados, pela Defensoria Pública e também pelo Ministério Público.

Ou seja, o MP pode fazer controle de legalidade do processo legislativo, sem jamais adentrar na opção política dos agentes eleitos pelo povo. Assim, o Ministério Público que foi criado no século XIV pelo rei Felipe IV da França como instrumento autocrático para desapropriar bens, hoje quer ser mais realista do que o rei e, de criatura, aspira a criador.

Isso não retira, absolutamente, os bons propósitos dos membros do parquet, porque a nossa democracia funciona em tese e a compra de votos retira toda a legitimidade de grande parte dos políticos eleitos. Todos nós sabemos que temos políticos corruptos porque a maioria do povo se corrompe por algum favor ou pela venda direta do voto. Então, essa distorção moral que decompõe a sociedade e causa grandes danos só será resolvida pelo próprio povo ao escolher melhor ou ao deixar de eleger quem compra seu voto.

Até que isso aconteça, os membros do Ministério Público não tem como sobrepor suas aspirações políticas, econômicas e sociais àquilo que os vereadores e o prefeito decidirem.

E com isso também não estou afirmando que esse ou aquele vereador e o prefeito de Santarém compraram votos ou que a opção política contida no projeto de lei em questão não corresponda à maioria do que o povo de Santarém realmente quer.

O que o Ministério Público deve fazer é tentar convencer o Poder Judiciário que existe vício de legalidade no devido processo legal legislativo ou que o mérito do projeto de lei é inquinado de inconstitucionalidade.

E vamos ver se o MP também irá encaminhar alguma Recomendação ao Poder Judiciário para que o magistrado faça a sentença de acordo com que querem os promotores de Justiça, porque inexiste nenhuma diferença de estrutura de poder e valor republicano de uma hipótese absurda dessas comparada ao que pretendem impor aos vereadores.

Fonte: Jornal O Impacto

 

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