Sem presença da Polícia Federal crack avança pelos rios da Amazônia

Base Garatéia

Se depender dos gestores da Polícia Federal, a meta da presidenta Dilma Rousseff de combater o tráfico de drogas nas fronteiras não passará da retórica política de um gesto bem intencionado. Em pleno rio Solimões, corredor para entrada de drogas no Brasil, no município de Santo Antônio do Içá, a mil quilômetros de Manaus (AM), a Base Garatéia, da Polícia Federal, está quase ao abandono.

Na última semana, apenas um policial federal estava em serviço na base que, pelo menos em tese, deveria ser um ponto de contenção da rota de drogas, provenientes principalmente do Peru.

Números obtidos pela Agência Fenapef mostram que 40% do crack consumido no Brasil é trazido do Peru, pela Amazônia. Quadrilhas de traficantes têm no rio Solimões uma rota para droga que irá abastecer os grandes centros urbanos do País. Calcula-se que hoje já são cerca de 1,8 milhão de brasileiros usuários da droga, o que permite estimar o volume de consumo diário próximo de 4 toneladas de crack. Por este cálculo, todos os dias, quase 2 toneladas de crack passariam pelos rios e estradas da Amazônia.

Há anos, sucessivas direções da PF têm colocado em segundo plano a repressão ao tráfico de drogas nas fronteiras do País, em prol de uma política que prioriza as chamada grandes operações com repercussão garantida na mídia. Contudo, em muitos casos, com pouca eficácia do ponto de vista da condenação de acusados.

O descaso com a contenção do tráfico de drogas nas fronteiras é tão grave que a “Operação Cobra”, que por muito tempo foi a principal ação coordenada dos federais, na Região Norte, contra os traficantes, hoje está parada. Em Tabatinga (AM), que foi uma das principais bases da “Cobra”, hoje a única referência visível à operação policial permanente é uma placa jogada em um depósito de sucata.

Sem colocar em prática ações de combate ao tráfico, a Polícia Federal trata sua própria estrutura com descaso. A Base Garatéia é um exemplo concreto.

Restos da Operação Cobra Garatéia

Construída para substituir a Base Anzol, fechada por falta de condições mínimas de trabalho para os policiais, a Garatéia conta com um único policial federal, que não pode fazer praticamente nada sozinho, ao longo das centenas de quilômetros de rio. Com ele, apenas mais três policiais militares também tentam fazer frente ao crime. Igualmente, o número de policiais é inexpressivo diante do desafio de barrar traficantes e guerrilheiros das Farc, que não raro invadem o território brasileiro.

Mesmo que quisesse pegar sua pistola Glock e um fuzil e sair feito um Rambo, pelo rio Solimões ou pelo labirinto de igarapés na imensidão da Floresta Amazônica, à caça de traficantes, o policial federal teria que usar uma embarcação que não oferece nenhuma condição de trabalho e segurança.

As duas únicas lanchas ancoradas na base foram apreendidas e não estão adaptadas para o trabalho policial. Além disso, não há coletes balísticos, nem coletes salva-vidas, muito menos telefone celular ou rádio, que permita contato permanente entre o policial e a delegacia da PF mais próxima, em Tabatinga, distante a cerca de 9 horas de barco da base.

No mesmo estado do Amazonas, há três meses, quando usavam uma embarcação bem parecida com as que estão na Base Garatéia, dois policiais federais foram mortos e um ferido por traficantes de cocaína.

No último dia 21 de fevereiro, a presidenta Dilma Rousseff voltou a reforçar a necessidade de um combate efetivo ao tráfico de drogas nas fronteiras. A Presidente ressaltou que o “Plano Integrado de Enfrentamento ao Crack e outras Drogas” prevê a ampliação do combate ao tráfico, especialmente nas fronteiras do País. “Vamos atrás do traficante internacional e, ao mesmo tempo, vamos agir para acabar com o pequeno tráfico”, disse.

Há quase uma década, a Federação Nacional dos Policiais Federais vem alertando para a necessidade do fortalecimento da Polícia Federal nas fronteiras do Brasil para o efetivo combate ao tráfico de drogas, de armas e outros crimes. No ano passado, os policiais propuseram a criação do cargo de Oficial de Polícia Federal para a execução do papel de polícia administrativa e coordenação das operações de combate ao crime.

“A cada vez que vamos a Amazônia visitar nossos colegas, em delegacias e bases da PF, nos deparamos com uma situação pior”, revela Francisco Sabino, Diretor de Relações do Trabalho da Fenapef. Ele ressalta que o sucateamento da Polícia Federal na Amazônia é evidente. “Não temos efetivo, não temos equipamentos adequados, não temos política de combate aos traficantes. Hoje o enfrentamento ao crime só acontece em razão do voluntarismo e bravura dos federais”, diz.

Sabino lembra que o último diretor geral da PF, o delegado Luiz Fernando Corrêa, elegeu a Amazônia como uma de suas prioridades. “Desde então, bases foram desativadas, equipamentos estão sucateados, colegas perderam a vida e os traficantes de drogas avançam. Imagine se a Amazônia não fosse prioridade?”, questiona Sabino.

Fonte: Agência Fenapef

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