Cerveró afirma que foi indicado por Lula por ‘reconhecimento de ajuda’

Ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva
Ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva

O ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró afirmou, em delação premiada, que sua indicação para a Diretoria Financeira e de Serviços da BR Distribuidora, uma subsidiária da Petrobras, em 2008, foi feita pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em “reconhecimento da ajuda” na contratação da Schahin para operar o navio-sonda Vitória 10.000.
Cerveró disse que a indicação aconteceu em troca da “quitação de um empréstimo do PT, perante o banco Schahin, garantido por José Carlos Bumlai”. O ex-diretor afirmou ainda que “havia um sentimento de gratidão do Partido dos Trabalhadores” pela viabilização do contrato com a Schahin quando ele foi exonerado da Diretoria Internacional, em 2008. As informações foram publicadas pelos jornais “Valor Econômico” e “Folha de S. Paulo” e confirmadas por O GLOBO.
O documento traz também trecho do termo de colaboração de outro delator da Lava-Jato, o lobista Fernando Antônio Falcão Soares, conhecido como Fernando Baiano. Segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), ele era amigo pessoal de Cerveró.
Baiano relatou ter procurado ajuda do lobista Jorge Luz e de Bumlai para que Cerveró permanecesse na Diretoria Internacional. Segundo ele, nenhum dos dois teve êxito. Bumlai afirmou a Baiano que procurou Lula, mas ouviu dele que não poderia interferir na questão, uma vez que havia prometido a diretoria à bancada mineira do PMDB. Bumlai também procurou o atual vice-presidente da República Michel Temer, então presidente do PMDB, mas ele também disse não poderia contrariar a bancada de Minas Gerais.
Baiano relatou ainda que um advogado, cujo nome não se lembra, mas falando em nome da bancada mineira, liderada pelo deputado Fernando Diniz, sugeriu a manutenção de Cerveró no posto, desde que ele pagasse aproximadamente R$ 1 milhão mensais aos deputados peemedebistas de Minas. Baiano disse que explicou ao advogado que não seria possível prometer isso, porque a Diretoria Internacional não tinha contratos constantes, apenas negócios pontuais. Baiano afirmou ter contado a Bumlai a proposta de R$ 1 milhão mensais.

Trecho do termo de colaboração de Baiano - Editoria de Arte
Trecho do termo de colaboração de Baiano – Editoria de Arte

“Que, certo dia, num domingo à noite, José Carlos Bumlai telefonou para o depoente e disse-lhe que estava em Brasília, no Palácio Alvorada, ressaltando que tinha conversado com Lula e que não tinha mais como manter Nestor Cerveró na Diretoria Internacional; que, na mesma ocasião, José Carlos Bumlai informou que, em razão da ajuda de Nestor Cerveró na contratação do ‘Grupo Schahin para operação do navio sonda Vitória 10.000, fato detalhado em termo de colaboração próprio, ele havia sido indicado para o cargo de Diretor Financeiro da BR Distribuidora; que, pelo que o depoente subentendeu, essa questão da indicação de Nestor Cerveró para a Diretoria Financeira da BR Distribuidora, em retribuição à ajuda prestada na contratação da Schahin para operação do navio sonda Vitória 10.000, teria sido tratada com o presidente Lula; que no dia seguinte o depoente telefonou para Nestor Cerveró e conversou sobre o assunto; que Nestor Cerveró ainda não sabia que seria indicado para a Diretoria Financeira da BR Distribuidora; que Nestor Cerveró terminou sendo nomeado para o cargo em questão”, diz trecho do termo de colaboração de Baiano, reproduzido na denúncia.
PROVÁVEL DECISÃO DE LULA
O pecuarista José Carlos Bumlai, amigo do ex-presidente Lula, está preso desde novembro e é acusado de intermediar um empréstimo de R$ 12 milhões com o banco Schahin, em 2004. Em depoimento realizado em dezembro, Bumlai afirmou que o destino do dinheiro foi o PT. Na ocasião, o pecuarista desvinculou o ex-presidente de qualquer envolvimento com o negócio. Disse que Lula é seu amigo, que se encontravam nos fins de semana, mas que tinham como regra não falar de assuntos políticos ou econômicos. Negou que tenha pedido a Lula que mantivesse qualquer diretor da Petrobras no cargo, em referência às informações de que teria pedido ao presidente para manter Cerveró na área Internacional.
Na delação, Cerveró atribuiu sua permanência na Petrobras à intermediação do negócio. O ex-diretor afirmou ainda que o loteamento de cargos da BR Distribuidora, ligados ao senador Fernando Collor (PTB-AL), teria sido uma “provável” decisão de Lula. Cerveró alegou que o ex-presidente pretendia trazer o PTB para a base do governo e esvaziar a CPI da Petrobras, no Congresso Nacional. Cerveró disse também que a influência de Collor teria sido reforçada no governo Dilma Rousseff. Cerveró contou que participou de reuniões com outros políticos para tratar de propinas desviadas da Petrobras e citou o senador Delcídio Amaral (PT-MS), que está preso, e o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).

Trecho do depoimento de Nestor Cerveró em que cita sua indicação por Lula para a Diretoria Financeira e de Serviços da BR Distribuidora - STF
Trecho do depoimento de Nestor Cerveró em que cita sua indicação por Lula para a Diretoria Financeira e de Serviços da BR Distribuidora – STF

“Que, em 2008, o declarante foi exonerado da Diretoria Internacional da Petrobras; que, em razão de o declarante ter viabilizado a contratação da Schain como operadora da sonda Vitória 10.000, quando ainda era Diretor Internacional da Petrobras, havia um sentimento de gratidão do Partido dos Trabalhadores – PT para com o declarante; que essa contratação, conforme explicado em termo de colaboração próprio, objetivava a quitação de um empréstimo do PT, perante o Banco Schain, garantido por José Carlos Bumlai; que, como reconhecimento da ajuda do declarante nessa situação, o Presidente da República Luís Inácio Lula da Silva decidiu indicar o declarante para uma diretoria da BR Distribuidora, a Diretoria Financeira e de Serviços”, diz parte do termo de colaboração de Cerveró.
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A própria PGR endossa a versão: “Nestor Cerveró foi politicamente indicado para o cargo de Diretor Financeiro e de Serviços da Petrobras Distribuidora S/A por intervenção direta da Presidência da República. Na época, Nestor Cerveró ocupava a Diretoria Internacional da Petrobras, que deveria ser entregue à bancada mineira do PMDB de Minas Gerais. Como forma de compensação pelo fato de ele ter favorecido os interesses do Partido dos Trabalhadores em determinado contrato da Diretoria Internacional da Petrobras, logo depois de ter sido exonerado, recebeu o cargo em questão na BR Distribuidora”, diz trecho da denúncia.
O depoimento de Cerveró está sob sigilo, mas trechos dele foram incluídos na denúncia apresentada pela PGR no inquérito 3.990, que está no Supremo Tribunal Federal (STF) e investiga o deputado Vander Loubet (PT-MS), o ex-ministro Pedro Paulo Leoni Ramos, que fez parte do governo Collor, e outras três pessoas. A denúncia foi feita em 17 de dezembro do ano passado.
Em resposta ao “Valor Econômico” e à “Folha de S. Paulo”, o Instituto Lula disse que não comenta “vazamentos ilegais, seletivos ou parciais de supostas alegações que alimentam a um mercado de delações sem provas em troca de benefícios penais.” O Palácio do Planalto informou que não vai comentar o assunto.
Fonte: O Globo

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