Sociólogo Santareno explica as causas da 'preguiça' paraense
O calor e a elevada umidade do ar em Santarém (PA) fazem com que a sesta seja um hábito para a população, o que muitas vezes provoca interpretações equivocadas para quem não conhece a cultura local. Para evitar uma visão preconceituosa a ponto de chamar os paraenses de “preguiçosos”, o sociólogo Éfrem Galvão explica as razões culturais e climáticas para o costume da chamada “parada técnica” após as refeições.
]”Isso vem desde os primeiros viajantes que passaram aqui no Norte, de origem europeia. Eles estranharam a rotina de vida aqui no Pará. O povo, que era tipicamente indígena, passava muitas vezes dias e mais dias remando pelos rios. Depois, ficavam meses deitados nas redes e fazendo filho, evidentemente. Isso chamava a atenção dos navegantes, que não conheciam os hábitos da região”, disse Galvão.
Segundo ele, há outras motivações a serem levadas em consideração para a tal preguiça. “Essa parada que se faz aqui após o almoço é necessária. Isso é feito aqui por causa do calor, que chega a ser sufocante em determinado período do dia. Quem vem de fora sofre mais ainda. Não é só o calor intenso, mas é a umidade do ar que faz o mormaço. Isso, na minha opinião, faz com que os indígenas tenham se caracterizado por essa indolência. Nós caboclos também temos sangue indígena na composição étnica amazônica.”
Galvão considera que o efeito da sesta paraense no imaginário de turistas tenha virado uma lenda urbana. “Credito essa fama a uma espécie de lenda. Essa preguiça entre aspas é normal. Temos de lembrar que os índios são capazes de caçar, pescar e de dormir apenas três horas por noite. Eles ficam o restante do dia remando pelos rios. Ainda há muitas comunidades que ainda vivem de atividades primárias como essas. Muitos não são mais considerados indígenas natos, mas têm componentes culturais do índio.”
O sociólogo disse que se o clima do Sudeste fosse igual ao do Pará o hábito da soneca após as refeições seria mais comum. “De certa forma, olho isso como um modus vivendi. Diferente das pessoas em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Brasília. Nestas cidades não existe mais essa coisa de ir almoçar em casa. Aqui, saímos do quintal e vamos almoçar em casa.”
Galvão, bem humorado, avisa que os turistas devem maneirar na gastronomia local quando visitarem Santarém. “O caboclo da Amazônia não é preguiçoso, é um trabalhador, apenas aprendeu a lidar com as condições climáticas desfavoráveis. São cerca de seis meses de calor intenso. Se o sujeito abusar na comida gordurosa ele vai ter de descansar depois. A temperatura aqui é terrível e o nosso ambiente é úmido. Aqui na Amazônia você fica cozinhando. Essa paradinha técnica é essencial”, disse o sociólogo, que tem 76 anos e faz a sesta diariamente.
Por: Glauco Araújo, do G1