Justiça poderá tomar terras de Juruti
Uma ação possessória em tramitação no Fórum de Juruti poderá obrigar o Pará a ressarcir prejuízos supostamente causados pelo Japão, durante a Segunda Guerra Mundial, e de quebra ainda abrir mão de seu patrimônio fundiário sobre uma área de quase 300 mil hectares. E pior: por fatos que não se originaram aqui e para os quais o Estado em nada contribuiu. A não ser, talvez, por imperícia em episódio pontual ao tentar barrar na Justiça as pretensões dos demandantes, o que, de resto, ainda está para ser comprovado.
O processo tem um enredo longo e intrincado, com alguns aspectos que seriam por si suficientes para fazer dele um caso quase único nas lides judiciárias do Brasil. Mas ele vai além e acaba marcado, do início ao fim, por uma impressionante sequência de equívocos. Os erros são tão grosseiros, e alguns tão primários, que a definição, no final, se torna inescapável, fazendo desse episódio nada menos que uma aberração no campo jurídico. Sobre ele, em parecer datado de 2005, o advogado Carlos Lamarão assim se expressou: “o caso se reveste de tantas irregularidades que representa, sem dúvida alguma, um dos mais graves atentados aos princípios jurídicos do país”.
Quando emitiu esse parecer, Carlos Lamarão o fez como procurador do Estado. Na época era diretor jurídico do Instituto de Terras do Pará. Hoje, já como presidente do Iterpa, mantém o entendimento, convencido de que o processo é nulo por vícios de origem. Fica claro, na análise dos fatos, é a rombuda incompetência de organismos federais no caso, como o Incra e o Banco do Brasil. Além, é claro, da já conhecida anarquia que ao longo de décadas tem caracterizado a ocupação da Amazônia.
Para ter pelo menos uma noção mais ou menos precisa de tudo o que aconteceu, é necessário recuar no tempo até os idos de 1927. Nesse ano, o Governo do Estado do Amazonas fez a concessão de uma área que abrangia, originariamente, um milhão de hectares, a dois cidadãos japoneses, Geusaburo Yamanishi e Kinroko Anazu. Tal concessão, através de contato de opção, apenas permitia, como condição resolutiva, que os beneficiários realizassem estudos técnicos para escolher local apropriado à implantação de um núcleo colonial em território amazonense.
Até aí, nada haveria a objetar. O problema viria a seguir, com sucessivas transferências de domínio da área e a sua matrícula, o que chega a ser espantoso, em cartório do Pará. Mais intrigante ainda é o fato de uma concessão feita pelo governo do Amazonas incidir sobre terras pertencentes ao Pará. Pois foi precisamente isso que aconteceu, sendo a área matriculada no Cartório de Registro de Imóveis da comarca de Óbidos. A possessão estende seu pretenso domínio sobre aproximadamente 280 mil hectares no município de Juruti, coincidindo, inclusive, com parte do terreno sobre o qual tem direito de uso a Alcoa, que explora naquele município uma grande mina de bauxita.
Expropiada após Segunda Guerra Mundial: O roteiro tortuoso do processo ganharia novos capítulos nos anos seguintes. Em fevereiro de 1934, sete anos depois de efetuada a concessão, o prazo contratual foi renovado por mais dois anos, conforme despacho proferido no governo do então interventor do Estado do Amazonas, capitão Nelson de Melo. Na alteração contratual, foi também reduzida a dimensão da área, que, de um milhão de hectares para 300 mil hectares. Os direitos sobre a área, até então pertencentes a Geusaburo Yamanishi e Kinroko Anazu, foram transferidos pelo mesmo ato para Tsucasa Ujetsuka.
Em novembro de 1942, Tsucasa Ujetsuka transferiu os direitos referentes à concessão originária para a Companhia Industrial Amazonense, antigo “Instituto Amazonas”, com sede no local denominado Vila Amazônia, como passou a ser conhecida toda a extensão da área. Quatro meses depois dessa transferência, porém, o governo do presidente Getúlio Vargas baixou decreto incluindo, entre outros bens e propriedades, a Companhia Industrial Amazonense numa lista de expropriações que seriam executadas como forma de reparação por perdas de guerra.
O Brasil adotava, assim, uma medida que estava sendo aplicada por todos os países aliados em relação a bens pertencentes a pessoas e empresas de origem alemã, italiana ou japonesa, seus adversários na Segunda Guerra Mundial. No caso da Vila Amazônia, o Banco do Brasil, investido na condição de agente especial do governo brasileiro, procedeu à execução dos bens e direitos da Companhia Industrial Amazonense, incluindo a área de 300 mil hectares. Esta foi alienada posteriormente em hasta pública para a Sociedade de Comércio e Transporte Ltda, com sede em Manaus, conforme escritura, certificado e depósito bancário no valor de 700 mil cruzeiros (o padrão monetário da época).
Em 1972, a área mais uma vez mudou de mãos, numa operação em que a Sociedade de Comércio e Transportes Ltda transferiu seus bens e direitos para Luiz do Valle Miranda e Antônio Cabral Abreu. Em setembro de 1987, para aumentar ainda mais a confusão, um decreto presidencial (nº 94.969) declarou parte da área como de interesse social para fim de reforma agrária. O Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) fez o procedimento expropriatório, destacando da área original cerca de 78,2 mil hectares. Hoje, nessa área, residem centenas de famílias, que precisarão ser indenizadas pelo governo do Pará se o Estado perder na Justiça a ação possessória movida pelo demandante Antônio Cabral Abreu.
Iterpa afirma que todos os atos são nulos desde o início: Dois episódios, segundo Carlos Lamarão, são particularmente reveladores dos desacertos que caracterizaram, desde o início, o tumultuado processo do Vila Amazônia. Um foi a liquidação do ativo e passivo da Companhia Industrial Amazonense, executada pelo Banco do Brasil na condição de agente especial do governo brasileiro, a título de reparação das perdas de guerra supostamente causadas ao Brasil pelo Japão.
O Banco do Brasil, segundo ele, jamais poderia executar bens que, na realidade, não pertenciam à empresa Companhia Industrial Amazonense, já que não haviam sido cumpridas as condições resolutivas previstas no contrato original. Os bens pertenciam, no papel, ao Governo do Amazonas. De fato e de direito, porém, pertenciam ao Estado do Pará.
“O Pará, em verdade, acabou sendo a grande vítima dessa sequência de desmandos administrativos, que chegaram ao absurdo de ensejar a matrícula de toda a área no Cartório de Registro de Imóveis da comarca de Óbidos”, afirma o presidente do Iterpa. De acordo com Carlos Lamarão, o Banco do Brasil somente poderia alienar a área em hasta pública depois de definir a sua exata localização e extensão. Em vez de se ter a área topograficamente demarcada, como exige a legislação, foi usado um mero artifício, não admitido por lei, de apenas delimitar os contornos perimétricos do imóvel, mediante simples traçado cartográfico em mapa.
Igualmente inconcebível, no entender de Carlos Lamarão, foi o fato de não haver o Incra desnudado os “vícios insanáveis” que estão evidentes em toda a documentação. Sobretudo, disse ele, por ocasião do procedimento expropriatório de 78,2 mil hectares, destacados da área principal, procedimento este autorizado por decreto em novembro de 1987. “São atos que não têm como subsistir, porque nulos de pleno direito”, diz.
Fonte: Diário do Pará
A terra pertence a quem nela vive e trabalha. As famílias dizem que \”compraram as terras\” décadas atrás, mas nunca nela viveram, tampouco lavraram o solo ou pescaram em seus rios. Lugar de latifundiário, grileiro e expropriador é na cadeia.
Seja lá onde começou os equivocos, minha familia agiu de boa fé comprando essas terras desde os anos 70. Engraçado que so agora que envolve muito dinheiro e interesses políticos querem contestar a titularidade das terras que de fato comprovado pertecem aos Valle Mianda e Abreu.
ISSO AÍ É IGUAL MATÉRIA DE COMO TUDO, QUE NÃO EXISTE COMO NADA E NEM POR ISSO E NEM POR AQUILO, ENQUANTO MAIS PRINCIPALMENTE; ENTENDEU?