Cachoeira intermediou venda da casa de Marconi Perillo
Uma gravação da Polícia Federal, obtida pelo GLOBO, entre Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, e o ex-vereador de Goiânia Wladmir Garcez revela a participação do contraventor na venda da casa de Marconi Perillo (PSDB), governador de Goiás. Cachoeira chega a ordenar que o dinheiro da venda seja levado para o governador no Palácio das Esmeraldas, sede do governo de Goiás. No diálogo, interceptado às 8h23m do dia 12 de julho do ano passado, Garcez diz que irá se encontrar com o presidente da Agência Goiana de Transportes e Obras (Agetop), Jayme Rincón. A escritura da venda do imóvel ocorreu um dia depois do telefonema.
Perillo, que depõe nesta terça-feira na CPI do Cachoeira, tem afirmado que a negociação se deu por intermédio de Garcez e que não recebeu dinheiro pela transação, mas três cheques, que foram depositados em sua conta. Os cheques foram assinados por um sobrinho de Cachoeira, mas o governador afirma que não sabia disso. Na semana passada, o professor Walter Paulo Santiago, que se intitula administrador da Mestra Participações, em nome da qual está a casa, disse que pagou pela imóvel em dinheiro vivo, em pacotinhos de notas de R$ 50 e R$ 100.
Gravação não identifica emissário
Na ligação, Garcez dá a entender que está esperando um emissário. Não fica claro se se trata de Lúcio Fiúza, assessor especial de Perillo que pediu exoneração na semana passada, ou do professor Walter Paulo. O ex-vereador diz a Cachoeira que irá se encontrar com Jayme Rincón em um shopping. Antes, o contraventor questiona se seria bom ele estar presente, mas Garcez o desestimula, porque não vê uma boa explicação para justificar a presença do chefe no encontro.
— Tá aí? — pergunta Cachoeira, sem se referir a uma pessoa específica.
— Não. Ele ligou agora (disse) que tá chegando. Atrasou um pouquinho — responde o auxiliar.
— Quer que eu vá ai? — pergunta o contraventor.
— Precisa não, você que sabe — sugere Garcez, para complementar — O que você está fazendo aqui?
— É verdade, então não vou aí, não — admite Cachoeira.
— O Jayme já está indo lá no Alpha Mall, marcou comigo, qualquer coisa vou encontrar com ele na Agetop — informa Garcez.
Cachoeira fala para o auxiliar ligar para Jayme Rincón e dizer que atrasou, mas que é para ele aguardar Garcez na própria Agetop. E demonstra pressa na conclusão da transação. Na ligação, Cachoeira manda Garcez fechar o negócio no mesmo dia.
— Você liga para o Jayme, fala para ele te esperar na Agetop, que atrasou. Tô indo lá, encontrar com o menino. Vende este trem hoje, hein. Pega o dinheiro logo, urgente — ordena o bicheiro.
— Aquilo que nós combinamos. Não vou perder. Dois mil (milhões) a gente já fechou. Se ele não fizer mais nada que dois, mete bronca. Mas vou tentar os R$ 2.250. Se não der… aí eu te dou uma ligada disfarçada, daquele jeito, viu — combina o ex-vereador.
Cachoeira pede para o auxiliar dizer que é para entregar o dinheiro para o governador, no Palácio.
— Fala: é pro governador. Vamos lá pagar ele logo no Palácio, chega lá pro Jayme. Já manda ele levar o dinheiro. Já entrega a chave pra ele, entendeu. Depois tira os trens que tem que tirar aqui — diz o contraventor.
A casa de Perillo foi vendida com todos os móveis. O valor da transação informado na escritura, no entanto, é de R$ 1,4 milhão.
— Eu já liguei pro Lúcio, inclusive, falando que qualquer coisa eu estou indo lá, falar com ele — declara Garcez, em referência a Lúcio Fiúza.
Na semana passada, o professor Walter Paulo apresentou um recibo, no valor de R$ 1,4 milhão, em nome de Garcez e de Fiúza. Depois do depoimento de Walter Paulo na CPI, Fiúza pediu exoneração. Ele também é apontado pelo jornalista Luiz Carlos Bordoni como o responsável pelo pagamento da prestação de serviço durante a campanha de Perillo. Bordoni fez um trabalho de locução e R$ 40 mil de uma empresa ligada ao esquema de Cachoeira foram depositados na conta da filha dele.
Walter Paulo seria vice de Demóstenes
O contraventor também manda Garcez argumentar com Walter Paulo que não seria bom ficar negociando muito desconto na transação imobiliária, porque o professor podia se tornar candidato a vice na hipotética chapa de Demóstenes Torres (sem partido) para a prefeitura de Goiânia.
— Já resolve isso logo. Vai baixando, de R$ 2,3 milhões para R$ 2,2 milhões. Vamos fechar isso aqui logo. O cara não pode ter má impressão sua não. Mexer com picuinha. Você vai ser o vice do Demóstenes.
Numa outra ligação, no mesmo dia 12, às 8h52m, Garcez informa que está ao lado do professor Walter Paulo e que está concluindo a negociação. E informa a Cachoeira que, antes, Jayme Rincón esteve com eles.
— Tô (sic) com o professor Walter, já estou terminando. Assim que terminar, encontro com você. Mas o menino esteve aqui, o Jayme, tudo ok. Pode se despreocupar, que ele esteve com o cara ontem à noite — informa Garcez.
— Tá com o professor aí? Fechou? — indaga Cachoeira.
— O professor está mandando um abração para você. Tá louquinho. Nunca vi um homem duro igual esse não, Carlinhos — diz o ex-vereador, que solta uma gargalhada.
— Manda fechar logo, rapaz. Quanto? — quer saber Cachoeira, mas o valor não é informado.
Na sequência, ele informa que irá se encontrar com os negociadores:
— Eu vou dar um pulo aí daqui a pouco.
— Vem cá, nós estamos aqui. Vem cá — conclui Garcez.
O GLOBO procurou a assessoria do governador Marconi Perillo, mas não teve resposta até o fechamento desta edição.
Versões conflitantes
Marconi Perillo — O governador de Goiás diz ter recebido três cheques pela compra da casa, que vendeu para o empresário Walter Paulo Santiago. Segundo ele, o ex-vereador Wladimir Garcez foi o intermediador do negócio. Perillo divulgou um diálogo gravado pela PF que mostra que o bicheiro Carlinhos Cachoeira conversou com Garcez para que o ex-vereador enganasse Walter Paulo, fingindo que está conversando com Lúcio Fiúza, assessor do governador.
Walter Paulo Santiago — Diz ter comprado o imóvel por R$ 1,4 milhão em dinheiro, em notas de R$ 50 e R$ 100, e que o dinheiro foi entregue para Garcez e para Fiúza.
Wladimir Garcez — Disse que comprou a casa de Perillo por R$ 1,4 milhão, com dinheiro que pediu emprestado a Cláudio Abreu, ex-diretor da Delta Centro-Oeste, e a Cachoeira. Ao depor na CPI, disse que só repassou a casa para Walter Paulo por não ter conseguido pagar o empréstimo. Ele a vendeu por R$ 1,4 milhão e faturou comissão de R$ 100 mil.
PF — O delegado Matheus Mella Rodrigues diz que a casa foi paga com três cheques nominais a Perillo, assinados por Leonardo Ramos, sobrinho de Cachoeira. Os cheques seriam da Excitant Confecção, empresa da cunhada de Cachoeira e que recebeu dinheiro da Alberto e Pantoja Construções, uma das beneficiadas por repasses da Delta.