Milton Corrêa
Minirreforma eleitoral pode ser votada em agosto, mas ainda não há consenso
Da agência Câmara de Noticias
Texto elaborado por grupo de trabalho libera pré-campanhas na internet e autoriza candidatura de quem teve as contas rejeitas pela Justiça Eleitoral. Frente parlamentar diz que proposta não corrige distorções do sistema político e atenta contra a Lei da Ficha Limpa.
O Plenário da Câmara pode votar em agosto o texto de uma minirreforma eleitoral que, entre outras alterações, define novas regras para a prestação de contas pelos partidos, autoriza pré-campanhas na internet e muda prazos para a substituição e escolha de candidatos.
A proposta que vai a voto tem por base o Projeto de Lei 5735/13 e foi elaborada pelo Grupo de Trabalho da Nova Lei Eleitoral, instalado em abril e coordenado pelo deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP). Desde o dia 9 de julho, o projeto tramita em regime de urgência, porém ainda não existe consenso em torno das alterações propostas pelo grupo.
Segundo Vaccarezza, o objetivo das mudanças é tornar as eleições mais democráticas, compreensíveis para a população e mais facilmente fiscalizáveis. Entre possíveis avanços em relação à legislação atual, ele destaca a regra que proíbe que o segundo colocado nas urnas, nas eleições majoritárias, tome posse em caso de cassação do mais votado. Ele defende ainda a mudança que impede o político de renunciar à candidatura (a qualquer cargo) a menos de 20 dias das eleições.
“Pela lei atual, por exemplo, um candidato a governador pode renunciar até no sábado que antecede a eleição e, ainda assim, o partido pode indicar um substituto”, afirma Vaccarezza. “Nesse caso, a urna mostrará o nome e a foto do candidato que renunciou e o povo pensa que está elegendo ele, mas não está”, completa, acrescentando que considera essa regra uma “excrescência na democracia”.
Prestação de contas
Entre os pontos mais polêmicos estão mudanças nas regras de prestação de contas por partidos e candidatos. Pelo texto, a aprovação das contas eleitorais deixa de ser pré-requisito para a certidão de quitação eleitoral, que poderá ser obtida com a apresentação das contas de campanha, independentemente da aprovação delas.
Ainda conforme a proposta, as despesas de natureza pessoal do candidato não precisarão ser comprovadas na prestação de contas. Alguns parlamentares defendem que essas mudanças podem representar brechas na Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar 135/10), aprovada pelo Congresso com grande apoio popular.
Críticas
Já a coordenadora da Frente Parlamentar pela Reforma Política com Participação Popular, deputada Luiza Erundina (PSB-SP), diz que o grupo de trabalho produziu um relatório sem transparência e sem a participação da sociedade. Segundo Erundina, após três reuniões, a frente concluiu que a proposta não contribui para corrigir as grandes distorções do sistema político e tem um viés autoritário, centralizador e antiético.
“O texto atenta contra a Lei da Ficha Limpa, reduz os mecanismos de controle sobre o processo eleitoral e é tolerante com a corrupção, comprometendo a transparência no processo eleitoral e favorecendo o abuso do poder econômico”, argumenta Erundina.
Fundador do Movimento Contra a Corrupção Eleitoral – que deu origem ao projeto da Lei da Ficha Limpa –, o juiz Marlon Reis sustenta que as mudanças propostas pelo grupo de trabalho não atendem aos anseios populares e que a minirreforma piora o sistema atual. Reis demonstra preocupação especificamente com uma possível impunidade para candidatos que venham a ter contas rejeitadas. “Não tem mais [na proposta] consequência negativa para a diplomação e para futuras disputas, porque o candidato pode receber a quitação mesmo com as contas rejeitadas por atos fraudulentos”, alerta o juiz, que também compartilha da opinião de que não faz sentido o Congresso encaminhar qualquer reforma do sistema eleitoral que não seja uma reforma política de fato.
Votação
A falta de consenso em torno da minirreforma eleitoral já fez com que Vaccarezza desistisse de levar adiante alguns pontos, como, por exemplo, a descriminalização de boca de urna e de carreatas no dia das eleições. O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, anunciou que a votação deve ocorrer mesmo em agosto, mas ainda não há data definida.
Projeto das fundações de direito privado para a saúde pode gerar polêmica no Plenário
Além da medida provisória do Programa Mais Médicos (MP 621/13), outra proposta relacionada à saúde deve gerar polêmica a partir da próxima semana, com o retorno das sessões de votação na Câmara. Trata-se do projeto de lei complementar que permite a criação de fundações públicas de direito privado para áreas como saúde e assistência social (PLP 92/07).
Por sugestão da maioria dos líderes partidários, o Plenário acatou urgência para a proposta, já aprovada pelas comissões de Trabalho, de Administração e Serviço Público; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.
Encaminhado pelo Executivo ao Congresso em 2007 com a intenção de conferir mais eficiência à gestão pública, o projeto chegou a ser pautado por diversas vezes em 2009. No entanto, após pressão de diversas entidades contrárias – inclusive do Conselho Nacional de Saúde-, o texto não foi votado.
A alegação do setor era de que a medida abria portas para a privatização da saúde, com implicações negativas sobre o controle social da área, a qualidade do serviço prestado à população e a valorização dos profissionais. À época, o então ministro da Saúde, José Gomes Temporão, chegou a desistir da matéria. O assunto, no entanto, voltou ao debate, depois de defendido pelo atual titular da Saúde, Alexandre Padilha.
O relator do projeto na Comissão de Trabalho, deputado Pedro Henry (PP-MT), concorda que o modelo de fundações públicas pode otimizar a gestão de setores como a saúde. “Eu acredito que esse instrumento possa ajudar consideravelmente na modernização e a dar uma resposta mais rápida às diversas instituições que precisam responder à sociedade; já que, com o modelo tradicional de administração, não estão conseguindo.”
Receita própria
Pelo texto aprovado nas comissões, a fundação pública terá patrimônio e receita próprios, com recursos vindos do Orçamento anual, de auxílios do poder público ou da iniciativa privada, inclusive de entidades internacionais.
Sem fins lucrativos, a fundação estará sujeita à legislação federal sobre licitações (Lei de Licitações – 8.666/93). Além disso, o quadro permanente de funcionários da instituição será formado a partir de concurso público.
Autora de um voto em separado na Comissão de Trabalho, a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA) considera, no entanto, que as fundações, apesar do público no nome, têm natureza privada e, portanto, não poderiam receber recurso público. “A Constituição Federal de 1988 definiu que recursos públicos devem ser direcionados exclusivamente para atividades públicas. As fundações são, na verdade, estruturas privadas, terceiras, muitas vezes remetem a alguma empresa privada no campo da saúde.”
A deputada defende a liberação da educação e da saúde da rigidez da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101/2000), “o que impede no momento boa parte das prefeituras e estados de realizarem concurso para profissionais de saúde e educação, do que remeter a uma estrutura exótica, que são essas fundações”, assinalou.
Pelo texto, a fundação pública de direito privado que atuar no âmbito do Sistema Único de Saúde terá de observar os princípios do SUS, como regionalização, descentralização, comando único em cada esfera de governo e participação da comunidade.
Se aprovado em Plenário, o projeto seguirá para o Senado.