Governo é derrotado na PEC da Bengala; PMDB diz que não vota mais ajuste fiscal
Numa articulação reservada patrocinada pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o plenário da Casa aprovou ontem (5) uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que eleva de 70 para 75 a idade para a aposentadoria de ministros de tribunais superiores e do Tribunal de Contas União (TCU), a chamada PEC da Bengala. A proposta, apresentada pelo ex-senador Pedro Simon (PMDB-RS) há 10 anos, será promulgada.
Com isso, o país ganha mais cinco anos da experiência de ministros importantes para a história da justiça brasileira, como Celso de Mello, Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski e Teori Zavascki. Essa mudança vinha sendo discutida há muitos anos. A demora mandou para casa mais cedo julgadores ainda cheios de energia que, infelizmente, o Judiciário perdeu por causa da regra anacrônica.
O PT havia proposto um destaque para acrescentar ao texto da PEC um trecho prevendo a necessidade de lei complementar tratar da compulsória em outros cargos públicos. Se o destaque fosse aprovado, a PEC teria de voltar ao Senado. Como não foi, o texto da PEC é aprovado diretamente.
A liderança do PT era contra a aprovação da PT. Acusava os deputados que ficaram a favor do texto de casuísmo por só defenderem a mudança para tirar da presidente Dilma Rousseff o poder de indicar outros ministros para o Supremo.
Na prática, a proposta é uma derrota ao Palácio do Planalto e retira o direito de a presidente Dilma Rousseff de indicar até cinco ministros do Supremo Tribunal Federal até o final do seu mandato, em 2018. No período, a presidente poderia indicar substitutos para os ministros Celso de Mello, Marco Aurélio Mello, Ricardo Lewandowski, Teori Zavascki e Rosa Weber.
Outro efeito colateral da PEC é postergar a aposentadoria dos atuais integrantes da Corte. O ministro Dias Toffoli, por exemplo, foi indicado para o STF em 2009 aos 41 anos. Antes da proposta, ele poderia ficar no Supremo até 2037, ou seja, por 29 anos no tribunal. Com a emenda, ele poderá ficar até 2042, isto é, 34 anos de Supremo.
A decisão de se votar a PEC da Bengala ocorreu no momento em que a Câmara estava prestes a iniciar o processo de votação da Medida Provisória 665, a primeira das duas MPs que fazem parte do ajuste fiscal. Eduardo Cunha encerrou a sessão de análise da MP, que alteram regras de concessão de benefícios previdenciários e trabalhistas, para, em seguida, abrir uma sessão extraordinária em que colocou como primeiro item da pauta a PEC. Ele fez uma rápida reunião com líderes para anunciar a votação da proposta.
A justificativa pública de aliados de Cunha para colocar, de última hora, a votação da PEC da Bengala é o de que havia um quórum elevado no plenário da Câmara para votar a proposta. As PECs dependem de apoio em plenário de 308 deputados, conforme previsto nas regras da Casa. A proposta passou com 333 votos a favor, 144 contra e 10 abstenções. Os deputados rejeitaram um destaque ao texto que forçaria uma eventual extensão do aumento da aposentadoria compulsória para todo o serviço público. A PEC da Bengala havia sido aprovada pela Câmara em primeiro turno no início de março.
Contudo, aliados do presidente da Câmara afirmaram reservadamente ao Estado que Eduardo Cunha queria, com a aprovação da emenda constitucional, dar um troco em desafetos. Uma das queixas de Cunha seria o fato de ele ter se tornado alvo da Operação Lava Jato sem que o governo tenha atuado para impedir. Com a medida, o presidente da Câmara também quer, segundo aliados, se tornar mais ainda um fiador da votação da MP 665. “O ajuste só vai passar se ele quiser”, afirmou um peemedebista do grupo de Cunha.
O maior receio dos peemedebistas é apoiar as medidas do ajuste fiscal, que na prática dificultam o acesso a benefícios trabalhistas, e ver o PT votar contra, mantendo assim o discurso de que está ao lado do trabalhador.
O programa de TV do PT que foi ao ar à noite Ajudou a complicar a situação do governo. Segundo os peemedebistas, o partido de Dilma não mostrou que está disposto a bancar o ajuste.
“Na tela da televisão aparece de uma forma e aqui nos solicita outra. Ou se de fato o País atravessa um momento difícil e para superá-lo e voltar a se desenvolver é preciso um remédio amargo. Não votaremos a MP 665 amanhã, não mais. Até que o PT nos explique o quer e, se for o caso que feche questão para votação das matérias do ajuste fiscal. Se não for assim, não conte conosco”, disse Leonardo Picciani (RJ), líder do PMDB.
Fonte: Estadão