A liberação de mercadorias no Canal Cinza e IN 1169
Se não bastassem todos os problemas econômicos enfrentados pelos importadores atualmente, inúmeras ilegalidades são cometidas pela RFB, apreendendo mercadorias e não procedendo a liberação mediante caução até o final do procedimento que atualmente pode durar mais de 180 dias.
Com efeito, há previsão legal para acolhimento de tal tese, conforme se infere da MP 2158-35/2001:
Art. 68. Quando houver indícios de infração punível com a pena de perdimento, a mercadoria importada será retida pela Secretaria da Receita Federal, até que seja concluído o correspondente procedimento de fiscalização.
Parágrafo único. O disposto neste artigo aplicar-se-á na forma a ser disciplinada pela Secretaria da Receita Federal, que disporá sobre o prazo máximo de retenção, bem assim as situações em que as mercadorias poderão ser entregues ao importador, antes da conclusão do procedimento de fiscalização, mediante a adoção das necessárias medidas de cautela fiscal.
80. A Secretaria da Receita Federal poderá:
(…)
II – exigir prestação de garantia como condição para a entrega de mercadorias, quando o valor das importações for incompatível com o capital social ou o patrimônio líquido do importador ou do adquirente.
Apesar de o art. 68, parágrafo único, acima referido, delegar à disciplina da Receita Federal o estabelecimento das hipóteses de liberação da mercadoria antes da conclusão do procedimento de fiscalização, resta evidente que não pode o órgão fiscal simplesmente deixar de prever tal hipótese nos atos normativos que lhe compete expedir, anulando, dessa forma, a previsão legal.
Todavia, esta é a realidade da IN SRF 1169/2011, que não previu qualquer hipótese de liberação de mercadorias antes da conclusão do procedimento de fiscalização, mesmo mediante prestação de garantia, contrariando, inclusive, a norma por ela revogada, qual seja o art. 69, parágrafo único, da IN SRF 206/2002, o qual estipulava que Afastada a hipótese de fraude e havendo dúvidas quanto à exatidão do valor aduaneiro declarado, a mercadoria poderá ser desembaraçada e entregue mediante a prestação de garantia, determinada pelo titular da unidade da SRF ou por servidor por ele designado, nos termos da norma específica.
Aliás, o art. 5º da IN SRF 1169/2011 previu expressamente que A mercadoria submetida ao procedimento especial de controle de que trata esta Instrução Normativa ficará retida até a conclusão do correspondente procedimento de fiscalização.
Por óbvio, o ato infralegal também contrariou a legislação sobre o tema (arts. 68, parágrafo único e 80, II da MP 2158-35/2001), já que procurou retirar a eficácia prevista para liberação de mercadorias antes da conclusão do procedimento de fiscalização, o que não se pode admitir.
Destarte, resta evidente a possibilidade de liberação das mercadorias submetidas ao procedimento especial da IN SRF 1169/2011 antes da sua conclusão, mediante prestação de garantia, conforme autoriza a mais jurisprudência:
TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. LIBERAÇÃO DE MERCADORIAS. PRESTAÇÃO DE CAUÇÃO. POSSIBILIDADE.
1. A retenção das mercadorias foi pautada no procedimento especial de controle aduaneiro instaurado com base na Instrução Normativa RFB n° 1.169/2011.
2. Muito embora a autoridade impetrada entenda que as Instruções Normativas n° 228/2002 e 1.169/2011 tratam de situações distintas, impende atentar que a suspeita de interposição fraudulenta de terceiros, amolda-se tanto na previsão da IN/SRF n° 228/02 como na IN/SRF n° 1.169/2011.
3. Conclui-se, portanto, que tanto o antecedente da norma (fato que deu causa ao procedimento especial de controle) como o consequente (pena de perdimento) são os mesmos para a hipótese dos autos nos dois atos normativos. Logo, inexiste qualquer razão para deixar de aplicar à hipótese a previsão de liberação das mercadorias mediante caução com base no art. 7º da IN/SRF n° 228/02. (TRF4, APELREEX 5009956-22.2014.404.7208, Segunda Seção, Relator p/ Acórdão Jorge Antonio Maurique, juntado aos autos em 06/03/2015)
Ante o exposto, de rigor que nos casos de retenção de mercadorias no canal cinza e IN 1169 os Importadores busquem a devida tutela jurisdicional para o regular prosseguimento do despacho aduaneiro mediante prestação de garantia na forma do art. 7º da IN SRF 228/02, com base nos arts. 68, parágrafo único e 80, II da MP 2158-35/2001.
AUGUSTO FAUVEL DE MORAES – Advogado, sócio do escritório Fauvel e Moraes Sociedade de Advogados, PRESIDENTE DA COMISSÃO DE DIREITO ADUANEIRO DA OAB/SP.
Fonte: Fauvel e Moraes Sociedade de Advogados