Depois de bônus, arrecadação com multas fiscais mais que dobra, mostra Receita
O “bônus de eficiência” pago a auditores fiscais conforme as multas aplicadas a contribuintes já tem surtido efeitos. O bônus foi criado em dezembro de 2016 e passou a ser pago em janeiro. A origem do dinheiro são as multas aplicadas junto com as autuações fiscais. E no primeiro semestre deste ano, o número de multas aplicadas a pessoas jurídicas quase dobrou em relação aos primeiros seis meses de 2016. O valor das multas cresceu 116,9%.
Ao mesmo tempo, a quantidade de autuações subiu 11,4%, o que resultou num aumento de 16,8% na arrecadação. Os dados estão no Balanço da Fiscalização do primeiro semestre deste ano, divulgado nesta terça-feira (18/7) pela Receita Federal.
Fonte: Secretaria da Receita Federal
De acordo com o documento, o Fisco havia arrecadado R$ 85,5 milhões com multas aplicadas a pessoas jurídicas no primeiro semestre de 2016. No mesmo período deste ano, foram R$ 185 milhões. Ao todo, as empresas foram responsáveis por 95% da arrecadação federal de janeiro a junho de 2017, de R$ 75,6 bilhões — em relação ao mesmo período de 2016, a arrecadação aumentou 12,6%.
Para o tributarista Igor Mauler Santiago, sócio do Sacha Calmon Misabel Derzi Advogados, a explicação para crescimentos tão discrepantes está na criação do “bônus de eficiência”. “Em relação ao ano passado, é a única novidade expressiva. Este é o primeiro resultado que temos depois da criação do bônus e, embora nada se explique por apenas um fator, é impossível desconsiderar sua influência na balança”, diz.
O bônus foi criado em dezembro de 2016 pela Medida Provisória 765. A MP mexeu na configuração do Fundaf, um fundo que recebe dinheiro de diversas fontes e deve ser usado para a melhoria da estrutura da Receita Federal e para o funcionamento do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Uma das fontes do Fundaf são as multas fiscais. Mas a MP passou a dizer que 100% do dinheiro das multas seria destinado ao pagamento do “bônus de eficiência”.
A intenção do bônus foi aumentar a remuneração dos auditores fiscais, mas sem dar aumento de salário, o que dependeria de aprovação de lei e criaria despesa obrigatória permanente. Mas, segundo tributaristas como Igor Santiago, foi criada uma forma de estimular os auditores a multar os contribuintes, ou, pior, qualificar as multas sempre que for possível. O resultado disso pode ser visto no balanço divulgado nesta terça, na opinião do advogado.
Resultado do estímulo
“Como os dados não foram abertos, é difícil dizer com precisão o que contribuiu para um aumento tão exagerado das multas”, analisa o tributarista Flávio Carvalho, sócio do Schneider, Pugliese, Sztokfisz, Figueiredo e Carvalho Advogados. “Mas só faz sentido ver o crescimento da multa separado do crescimento da cobrança se as multas forem sempre agravadas. E me parece que isso já vem dessa decisão interna da Receita de aumentar a fiscalização por sonegação e fraude, qualificando as multas.”
Para a Receita Federal, o desempenho se explica por dois motivos: os auditores trabalharam mais e o país voltou a ter “um semestre de normalidade”. Com isso, o Fisco quer dizer que a atividade econômica vem sendo retomada, ainda que de maneira lenta — embora de outubro a dezembro de 2016, os auditores fiscais tenham entrado em greve e parado de autuar e fiscalizar.
Em resposta aos questionamentos da ConJur, a Receita disse que a quantidade de procedimentos fiscais concluídos aumentou 14,8%. “Não diria que as fraudes aumentaram, mas que a capacidade de tratar um volume de informações que apontam para a sonegação e a especialização dos auditores que são responsáveis por dizer quem será fiscalizado são os principais responsáveis por esse aumento”, explica a Assessoria de Imprensa da Receita Federal.
Outro fator para a melhor nos resultados, afirma o Fisco, foi “o aumento da fiscalização de fraudes previdenciárias”. De acordo com o balanço, essas autuações aumentaram 54,5% do primeiro semestre de 2016 para o primeiro semestre deste ano, resultando em arrecadação de R$ 6,4 bilhões.
Por: Pedro Canário, editor da revista Consultor Jurídico.
Fonte: Revista Consultor Jurídico