Peninha: “Medida do governo é inconstitucional e vai acabar com garimpos da região”
Vereador fala sobre o leilão de áreas de garimpo, que vai causar um grande estrago na economia de Itaituba e região, com fechamento de lojas
A questão mineral no Tapajós vem sendo debatida há muitos anos, com várias leis, portarias, decretos e realização de muitas audiências e reuniões, mas os problemas continuam e agora parece se agravarem mais ainda com a nova medida que o Ministério de Minas e Energia, através do DNPM, está tomando. O alerta é do vereador Peninha, que na semana reuniu a imprensa em Itaituba para uma coletiva, quando falou sobre o leilão de áreas de garimpagem no Brasil, mas que atingirá principalmente a Província Aurífera do Tapajós. A reportagem do Jornal O IMPACTO entrevistou o vereador Peninha.
JORNAL O IMPACTO: Qual a atual situação da garimpagem na região do Tapajós?
PENINHA: Falta de estabilidade. Quem está trabalhando há dezenas de anos, a maioria, mesmo não tendo nenhum documento, não tem o mínimo conhecimento das novas medidas que o governo está adotando, assim como os que estão documentados, minoria, não sabem o que vai acontecer daqui pra frente. A verdade é que o Governo toma medidas sem ouvir os envolvidos na questão e depois, usando a força, faz o que bem entende. As medidas provocam a revolta da população da região, que já vive abandonada, sem assistência do poder público e quando está trabalhando ainda sofre represálias. É complicada esta situação.
JORNAL O IMPACTO: O senhor como um dos conhecedores da questão garimpeira, como analisa estas propostas de leilão das áreas minerais?
PENINHA: Vejo com tristeza, porque os garimpeiros tradicionais não vão ter a mínima condição de participar destes certames. O governo vai entregar estas áreas para os estrangeiros por preço de banana. Isso posso garantir, porque as áreas serão arrematadas pelas empresas que possuem dinheiro. Garimpeiro não sabe o que é leilão. Não tem noção de como e pra onde vai esta questão. Esta medida é para acabar com a figura do garimpeiro. As áreas já estudadas, ou seja, o “filé” da garimpagem do Tapajós serão dadas de mão beijada para os grupos internacionais. Hoje temos em torno de 615 PLGs – Permissão de Lavra Garimpeira, que representam 100.500 hectares. Tem mais 6.684 Requerimentos tramitando de PLGs, com uma área de 919.000 hectares. Juntas, as PLGs já expedidas e as requeridas somam mais de 1.019.500 hectares. Temos ainda 673 Alvarás de pesquisas, que somam uma área de 2.633.000 hectares e mais 621 requerimentos solicitando alvarás de pesquisa, que somam uma área de 3.200.000 hectares. Juntos os Alvarás de Pesquisa em vigor e os requerimentos de Alvarás de Pesquisa somam uma área de 5.833.000 hectares. Somadas as áreas de PLGs e de Alvarás de Pesquisa chegam a 6.852.500 hectares. Pelo que soubemos, a metade destas áreas vão a leilão.
JORNAL O IMPACTO: O que acontecerá na região se esta medida for tomada pelo Governo?
PENINHA: Meu amigo, esta gente em Brasília não tem ideia do que vão causar na região e os reflexos ao Estado do Pará e ao País. Primeiro, lembrar que hoje já temos mineradoras na região, e quero deixar bem claro que sou a favor das empresas, mas defendo os pequenos, que são a maioria e que derramam o suor dia e noite para a sobrevivência de suas famílias. As mineradoras pouco deixam na região, a começar pelo ouro, que não é vendido em Itaituba. É levado para outros estados. Segundo, o pequeno, ou seja, os garimpeiros tradicionais, moram aqui, vendem o pouco ouro que exploram aqui, gastam o dinheiro aqui. Para se ter uma ideia, a Província Aurífera do Tapajós que abrange os municípios de Jacareacanga, Itaituba, Novo Progresso e Trairão, conta com cerca de 4.000 pares de máquinas trabalhando na extração de ouro. Cada máquina desta conta com o trabalho de cerca de 5 pessoas diretamente. Estes motores, num cálculo feito, consomem anualmente em torno de 172 milhões e 800 millitros de óleo diesel. Temos outros equipamentos trabalhando na garimpagem, as conhecidas escavadeiras-PCs. Calculamos que existem trabalhando nesta região cerca de 1.000 escavadeiras. Cada escavadeira funciona com 2 profissionais. Anualmente essas 1.000 PCs consomem em torno de 6 milhões e 800 mil litros de diesel. Veja, o estrago que vai acontecer na economia da região. Os milhares de garimpeiros vão viver de quê? Vão fechar compras de ouro, vão fechar distribuidoras de combustível, vão fechar postos de combustível. Mecânicos destes equipamentos vão ficar desempregados, com isso vão demitir esta gente; vão fechar lojas de equipamentos de garimpos. As revendedoras de máquinas pesadas, PCs vão fechar e quem vai pagar esses equipamentos que foram comprados a prazo? O que é ainda mais preocupante, é que esses milhares de trabalhadores de garimpo, além de ficarem sem seus trabalhos, sem seu pão de cada dia, não vão ter alternativa de migrar para outros garimpos de outras regiões, pois as medidas são horizontais para todo o Brasil. Só vai sobreviver por enquanto, quem tem áreas legalizadas com PLG’S e que não sabemos até quando conseguirão renovar essas PLG’s, porque o governo pode dificultar para indeferir e Leiloar. Essas respostas o Governo não nós dá. Além destes, ainda podemos citar o prejuízo na arrecadação, que tanto os municípios, como o Estado vão ter, seja de ICMS sobre o combustível, seja do ISO, CFEM do ouro extraído na região. Em 2015, Itaituba recebeu só da CFEM – Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais R$ 2.734.542,81. Já em 2016, este valor aumentou para R$ 4.872.216,40. Em 2015, só Itaituba produziu 5 toneladas e 450 quilos de ouro. Já em 2016, produziu 13 toneladas e 508 quilos de ouro. Isto somente do ouro controlado, ou seja, legal, segundo dados do DNPM. O que posso garantir, que nossa região vive do OURO e esta medida vai acabar com a região. Podem tomar nota do que estou dizendo.
JORNAL O IMPACTO: O que pode ser feito para evitar esta medida do Governo Federal?
PENINHA: A questão Mineral do Tapajós temos discutido permanentemente, mas entre nós da região. Não somos consultados pelos órgãos em Brasília. Quando aqui vem um representante destes órgãos, ouvem nossas propostas, porém, não levam a sério. Aqui até o Marco Regulatório da Mineração já foi discutido com a presença dos membros da Comissão na Câmara Federal, mas até agora nossas propostas ainda não saíram do papel. O que mais nos revolta, é ver nossos representantes, deputados federais e senadores e até o Governo do Estado assistir estas medidas sem se manifestar. Pelo que estou vendo, só eu estou levantando esta questão. Nossa sugestão é garantir aos garimpeiros o trabalho dentro da área da Reserva Garimpeira, que tem em torno de 18 milhões de hectares. Esta área foi destinada, através de portaria em 1981 para este fim, mas já tiraram tanto pedaço dela para criação de Unidades de Conservação que hoje não sei mais qual é seu tamanho. Se o governo assegurar esta área para a livre garimpagem já está de bom tamanho, porém, parece que as áreas que vão para leilão estão exatamente dentro desta Reserva Garimpeira. Outra questão que temos que garantir, é os garimpeiros que possuem Permissão de Lavra Garimpeira e Alvará de Pesquisa. Até agora o Governo não disse como vai proceder com esta gente. Temos que esgotar todas as formas de negociação com o governo, que espero que nos deem essa chance, no mínimo se tiver mesmo que leiloar áreas dentro da Reserva Garimpeira do Tapajós, que sejam para PLG’S e para trabalhadores reconhecidamente da região.
JORNAL O IMPACTO: Por que você acha que o Governo está tomando esta medida com relação à mineração no Brasil?
PENINHA: Veja bem, o governo até hoje não conseguiu definir a questão da mineração no Brasil. Mas, uma coisa tem que ficar clara, a mineração praticada na região do Tapajós não pode ser igual à praticada em Minas Gerais. Nossa atividade mineral tem de ser tratada diferenciadamente. Este tem sido o grande problema. O governo só dificulta a legalização da atividade mineral no Tapajós. Só tivemos um avanço nesta atividade na região, quando, justiça seja feita, o ex-secretario estadual de Meio Ambiente, José Colares, se mudou para Itaituba e região e veio discutir esta questão com a gente. Houve muitos avanços e esta questão temos que continuar discutindo. O que estamos vendo hoje é só fiscalização, repreensão e o pior com a destruição de equipamentos caros, que na sua maioria seus donos ainda estão pagando. Sobre sua pergunta, o que posso responder é que um grupo de gente que está dentro do DNPM está querendo leiloar nossas áreas de garimpo para empresas estrangeiras e volto a dizer só as áreas consideradas “filés”. Estas empresas vão comprar estas áreas por valores por hectare menores do que hoje custa uma grama de ouro na região. Outra coisa, o DNPM, segundo informações, vai leiloar primeiramente 1.000 áreas de um total de 20.000. Nestas áreas que vão a leilão com certeza tem gente trabalhando, mesmo ilegalmente, mas há anos está ali. Isto não vai criar um conflito entre quem arrematou a área com quem nela está trabalhando? Vão retirar esta gente na marra, na força, destruindo os equipamentos. Precisamos de resposta e o DNPM não fala nada sobre esta questão. O órgão, antes de lançar o leilão, tem que apresentar um relatório mostrando onde estão estas áreas.
JORNAL O IMPACTO: O que você sugere para o DNPM fazer de imediato através do seu Escritório de Itaituba?
PENINHA: Que o DNPM desloque urgentemente equipes para estudar processos de PLGs pendentes de análises, mas visando publicação de títulos de PLGs, ou seja, produzir títulos para os garimpeiros trabalharem em paz, pois o que se sabe é que o número de títulos de PLGs aqui na região é menos de 10 por cento do que número de processos pendentes de análises aqui no Escritório do Órgão.
JORNAL O IMPACTO: Com todas essas dificuldades, você acha que melhorou a garimpagem no Tapajós?
PENINHA: Com certeza. Anos atrás o garimpeiro trabalhava na extração de ouro com pá, bateia e picareta. Hoje ele já tem mais opções de equipamentos, como a PCs, conhecida como escavadeira. Ela hoje facilita muito a abertura para que o garimpeiro possa produzir mais. Também temos hoje a perfuração de poços em rochas. Nos últimos anos novos equipamentos são utilizados na exploração de ouro, o que vem aumentando a nossa produção. Basta comparar a produção de 2015 com a produção de ouro de 2016. O aumento foi mais de 70%.
JORNAL O IMPACTO: E o futuro da região, como o senhor vê?
PENINHA: A Deus pertence, mas vejo com nuvens escuras. Uma região que vive há mais de 50 anos do ouro, não pode do dia para a noite mudar sua economia, até porque já vimos que outros empreendimentos chegaram a Itaituba, mas o ouro ainda é o que dá sobrevivência, não apenas para Itaituba, mas à região toda. Os portos, pouco têm contribuído com Itaituba. A madeira, hoje não é mais aquele coqueluche que se vendia a preço de ouro. Veja, vários terminais de combustível estão se implantando em Miritituba. Se não me falha a memoria, 3 grandes bases estão se instalando em Itaituba, mas não é para atender os empurradores das balsas. A maior quantidade de petróleo que é vendida hoje é para a região garimpeira. Diariamente dezenas de carros tanques, carretas atravessam a balsa de Itaituba-Miritituba levando óleo diesel para a região garimpeira. Ali que é o forte do consumo, como já falei anteriormente. São milhares de litros de óleo diesel consumidos diariamente no serviço de extração de ouro. O ouro é a nossa economia. Vivemos do ouro em Itaituba e região. Se acabar com a figura do garimpeiro, teremos crise, colapso, problemas sociais é esperar para ver. Quem está falando é que conhece de ponta a ponta a região. Fui eu que em 1988 comecei a trabalhar pela divisão territorial de Itaituba, pela criação dos municípios de Jacareacanga, Trairão, Novo Progresso e Crepuri. Infelizmente o Crepuri não conseguimos criar. Por isso posso afirmar, esta medida, além de ser INCONSTITUCIONAL, porque fere o Código da Mineração, vai acabar com os garimpos do Tapajós.
Fonte: RG 15/O Impacto