Sinval Ferreira: “A voz marcante do rádio santareno”
Sinval Ferreira é o mais antigo locutor em atividade e relembra momentos marcantes de sua carreira
Recebemos esta semana no estúdio da TV Impacto, o dono de uma das vozes mais conhecidas dos santarenos e dos municípios da região oeste do Pará; trata-se da lenda viva do rádio Sinval Ferreira, dando sequência à série de entrevistas sobre os profissionais mais conhecidos do rádio santareno, comandando por outra lenda do rádio Osvaldo de Andrade.
Hoje, podemos considerar Sinval Ferreira como o mais antigo locutor em atividade, no meio do rádio em Santarém. Começou na Rádio Clube e hoje está na Rádio Rural, onde há vários anos vem exercendo a sua função. “Osvaldo, o prazer é nosso em participar desse seu trabalho, que por sinal, tenho acompanhado. Inclusive quero lhe parabenizar por essa iniciativa, de trazer a todos nós profissionais da comunicação, seja do curto ou do longo espaço de tempo na comunicação que no caso, somo nós, e contar um pouco da nossa história”, declarou Sinval.
“Edinaldo Mota e Jorge Carlos já estiverem por aqui. Hoje fazemos esse convite exatamente porque você é um dos poucos, eu diria dos mais antigos talentos do rádio santareno, que permanece em atividade. Não teve muita participação no vídeo, através da televisão e tem aquela situação com o locutor, em que sempre o ouvinte forma uma imagem, muitas vezes pela voz, se cria um perfil, principalmente as pessoas que residem no interior”. Sinval disse: “Verdade Osvaldo, devido à voz que eu tenho, a maneira de fazer o programa, que é criticando e às vezes até indo a fundo na crítica, então, o pessoal pensa principalmente que não me conhece. Pensa assim: ‘Esse cara deve ser grande, deve ser forte’, e quando me conhecem, até lembrei daquela situação do Santino Soares: ‘É com este porcariazinho que gasto minha pilha’. E quando chegam na rádio e me conhecem: ‘O seu Sinval é o senhor?’. Eu digo, sou eu mesmo”.
Em certo momento da reportagem, Osvaldo de Andrade comentou: Sua voz é tão grossa e você é tão fino. Sinval: “Por falar em voz grossa, quando eu comecei no rádio em 1965, eu tinha um problema com o próprio administrador da rádio, o finado Vicente Malheiros. Ele fazia eu passar vergonha na Loja Malheiros, quando chegava lá para receber o meu trocado, ele não me chamava de Sinval e sim ‘Seu Chandovar! Seu Chandovar, procure outra profissão, o senhor nunca vai prestar para ser locutor’. Isso ele dizia na ‘lata’. Hoje, se ele fosse vivo, iria ver o que me tornei. Minha voz era grossa demais, sofri muito para tentar afiná-la e não consegui, e espero nunca conseguir”.
Osvaldo perguntou como tudo começou e Sinval Ferreira respondeu: “Foi interessante. Eu desde moleque pequeno me interessava pelo trabalho do locutor, não chamávamos nem de radialista, pois esse nome ninguém conhecia naquele tempo, então, eu me interessava muito pelo locutor, porque nós tínhamos uns estúdios e alto-falante em Santarém que ficavam na Lameira Bittencourt, no Centro, e quando minha mãe me levava para o centro eu parava, porque tinha um estúdio, que por sinal não lembro o nome, que dava para gente ver o locutor, tratava-se da “Voz da Liberdade”, era até a finada Ruth Santos e eu ficava olhando aquilo e ficava impressionado com aquela situação, da pessoa falar lá e a voz sair no alto-falante. Desde esse tempo já estava com o interesse de querer fazer aquilo, tanto que ao chegar em casa eu pegava o funil, quebrava a ponta que naquele tempo era de metal e saia gritando pelo quintal, fazendo uma locução parecendo um megafone, até o velho brigar comigo e tomar meu funil e jogar fora. Quando eu estava com meus 16 anos, precisando trabalhar, pois fui um rapaz de família pobre e tinha que ganhar o pão de cada dia, eu fiz o curso de técnico em eletrônica pelo Instituto Universal Brasileiro. Naquele tempo minha mãe me matriculou, era um curso por correspondência, vinha todo material via Correios, a gente estudava e tudo mais. Então, já começou daí, fiz o curso de radiotécnico e sempre demonstrava essa vontade, até que um dia, minha mãe passando em frente à Rádio Clube encontro o meu querido e saudoso João Veiga, sentado na frente, onde nós chamávamos de “Pau Bagaça”, na Travessas dos Mártires com Galdino Veloso. Ela falou com ele e perguntou se não tinha uma vaga para eu aprender e ele disse: “Mande ele aqui agora”. Mamãe chegou em casa e me falou, eu me aprontei e fui para lá, só que não fiz teste nem nada, fui logo adentrando no estúdio para fazer um programa esportivo. Me deram a matéria, me lembro muito bem, eram quatro notícias, pois estava se aproximando a Copa do Mundo, sendo que naquele tempo nós dividíamos o programa de esporte em nível internacional, nacional e local. Eu fiz a parte internacional e pronto, fiquei! Estou até hoje no rádio”.
Sinval Ferreira fala de alguns colegas com quem trabalhou naquela época. “Naquele tempo, quando eu entrei na Rádio Clube, temos hoje ainda, aqui em Santarém, o Dr. Júlio César de Castro Imbiriba, que era um bom locutor e ator também. Tínhamos um programa de enquete, que tinha teatro e ele participava. Então, era o Júlio César; João Paiva de Castro, que já faleceu; Ferreira Pires, que ainda está por aqui com a gente; finado João Sílvio Gonçalves, que pra mim até hoje foi a mais bela voz do rádio santareno; Eduardo Ferreira, não sei o que aconteceu com ele hoje. O que me lembro são esses aí. Na mesa de som agora há pouco, consegui manter contato com ele pelo facebook, o Evadir Cardoso, que inclusive está vindo agora em novembro para Santarém, a passeio, pois mora atualmente no Tocantins. Depois ingressaram no rádio Eriberto Santos, Ana Maria Patrícia e tantos e tantos outros. Na antiga Rádio Clube de Santarém, onde eu passei dez anos, naquele tempo, o sonho de quem trabalhava na Rádio Clube era vir para a Rádio Rural um dia, claro porque era a melhor daquele tempo, só tinham duas, a Rádio Clube em segundo plano e a Rural em primeiro plano, onde a estrutura era muito melhor, tanto que antes de ingressar na Rádio Rural, eu fiz dois testes de locução e em nenhum dos dois eu passei. Me lembro muito bem que um desses testes que eu fiz, passou Edinaldo Mota, Edmar Rosas e o outro não lembro e quando foi em 1976, eu fui convidado pelo finado Haroldo Sena a ir para a Rádio Rural, pois o Eriberto Santos saiu do jornalismo da Rádio Rural e eu ingressei em seu lugar, posteriormente fui para a parte de locução. Devido a um acidente gravíssimo que ocorreu em Santarém e ceifou a vida do Antônio Walter que era atleta do São Raimundo e da Ciretran; ceifou a vida de Haroldo Sena que era o gerente. Outro que foi gravemente atingido nesse acidente, que por sinal ainda está conosco, graças a Deus, Cláudio Serique. Com isso, houve um descontrole lá na formação do quadro de locutores, tiveram que mexer com urgência com a saída do Cláudio Serique que teve que ir para Belém. Então, Manoel Dutra assumiu logo depois do Haroldo Sena falecer e me jogou para eu fazer uma locução à noite, antes do Jornal da Noite. Eu fazia essa programa à noite e também o Jornal da Noite. Depois eu comecei a fazer o Sinval Ferreira Atende, que hoje eu faço há 32 anos na Rádio Rural, após esse acidente em novembro de 1976”, lembra Sinval Ferreira.
Osvaldo de Andrade disse, na entrevista, que os profissionais de rádio, sempre cometem aquele mico aqui, outro ali, que fica na lembrança, não só da gente como dos colegas. Qual seria o maior mico que você já passou? Sinval: “Eu devo ter cometido vários, mas eu não me lembro. Mas eu me recordo de um fato que me colocou numa situação bem difícil: eu estava fazendo esse programa à noite, e eu atendia telefonemas e cartas, só para oferecer música e o cidadão me ligou e eu falei: ‘Alô! boa noite, como é que está você? Como é o seu nome?’, e ele perguntou: ‘Quem é que está falando?’. Eu disse: ‘É aqui do Sinval Ferreira Atende’ e ele respondeu: ‘Grandes merdas!’, risos. Aí pronto, ele aniquilou essa noite completamente. Deixei passar um pouquinho para esfriar a raiva, e depois levei na esportiva, comecei a rir e continuei o programa”, recorda.
Ao ser questionado se hoje ainda continua em atividade, Sinval respondeu: “Exatamente! Estamos em atividade no rádio há 51 anos, sendo que na Rádio Rural estou há 41 anos. Já estou aposentado também, graças a Deus, antes que o governo corte a aposentadoria”, informou.
E sobre sua vida particular. Constituiu família? “Com minha ida para Rádio Rural, logo em 1976 para 1977 eu constitui família. Foi algo interessante, pois eu não tinha qualquer intenção de me casar. Um dia, eu estava no jornalismo, Dom Tiago chega, muito amigo da minha família e me disse assim: ‘Meu filho, quando você vai casar?’, sendo que ele já sabia que eu tinha uma namorada e, eu respondi: ‘Dom Tiago, eu não sei’. Ele disse: ‘Com quantos anos você está?’, e eu disse: ‘28 anos’. Ele falou: ‘Então, case logo, senão você não vai ter tempo de criar seus filhos’. Logo depois aconteceu. Graças a Deus a família está bem, já vieram quatro netos, três com a filha do matrimônio e uma neta com a filha fora do matrimônio, de antes do casamento e tocamos a vida para frente, tentando hoje passar essa crise que está nos afetando, e patrocinador não quer mais patrocinar, quer pagar só a metade e assim vai dando para viver”, recorda o radialista.
Mas Sinval Ferreira tem uma história ligada a um grande evento da nossa cultura, que é o Sairé em Alter do Chão, inclusive adquiriu por lá casa e participa há muito tempo. Há quantos anos você é o puxador do Sairé?, perguntou Osvaldo de Andrade. “É interessante, Osvaldo. Eu não sei informar quantos anos, o Sairé ressurgiu em 1973 e eu acho que por volta de 1976, levado pelo nosso grande amigo Edson Serique, que por sinal frequentava muito Alter do Chão, conheci o Sairé e coincidiu que 1976 nós irmos para lá e estava acontecendo o Sairé. Sem ter ninguém para apresentar e o Edson ligado ao povo muito mais do que eu naquele tempo, disse: “Sinval, quebra o galho, apresenta aí, é só anunciar”. Então, subi no palco e comecei a apresentar. Resultado, entrou no sangue, pegou. Não sei se ainda vão me convidar, pois agora mudou muita coisa. Gostei tanto que nos anos depois, já ia com antecedência pra lá para ajudar o pessoal a construir o palco das apresentações que era de madeira. Hoje também eu continuo sendo o locutor que apresenta o resultado do concurso. Logo depois veio o tempo em que surgiu os botos Cor de Rosa e Tucuxi e começou a disputa, então, eu fico lá de quinta-feira na abertura, até segunda-feira, quando tem a contagem dos pontos”, informou.
Ao ser questionado sobre um fato marcante nessa sua longa carreira em termos de notícias, que foi de grande importância para a sociedade ou aquilo que até não noticiou, Sinval respondeu: “Sempre me lembro o que aconteceu na minha vida no rádio e que sempre eu estou contando, porque é o que eu mais lembro. Não que eu seja ruim de memória, a gente fica anotando para não esquecer. Então, o que me lembro muito foi quando houve aquela revolução aqui em Santarém para tomada da Prefeitura pelo finado Elias Pinto e o militar Haroldo Veloso. Nessa ocasião, eles invadiram a Rádio Clube e nesse momento eu não quis entregar o microfone por tolice minha de “molecão”, levei uma gravata e uma revólver na costa para entregar o microfone. Esse fato é o que mais lembro. Agora, outro fato que me lembro são os muitos momento desse programa que eu faço que eu consegui ajudar aquelas pessoas necessitadas e continuo com o mesmo trabalho. O programa está com 32 anos, com a mesma estrutura, só diminuiu o horário, pois ele já chegou ao ponto de ter até quatro horas de duração e agora tem só duas. Então, esse é o momento de eu ajudar as pessoas necessitadas. O pior, é que tem gente que confunde, pensa que eu é quem estou dando, chegam lá na rádio e dizem: ‘Seu Sinval, o senhor poderia me dar tanto, que eu estou precisando para isso’. E eu respondo: ‘Gente, eu não tenho para isso, o que eu faço é pedir para os ouvintes colaborarem’. Isso me marca muito e, sinceramente, me sinto feliz por fazer isso”, comentou.
O radialista Sinval Ferreira ao longo desses anos prestou diversos serviços à coletividade. Ao ser questionado se é reconhecido por isso, Sinval respondeu: “Osvaldo, o pouco que eu tenho a falar é uma coisa que sempre estou colocando por aí em conversa, é a preocupação com o avanço da tecnologia no meio de comunicação. A tecnologia avançou, facilitou a execução do trabalho da comunicação, mas por outro lado está colocando muitos companheiros nossos rumo ao desemprego. A tecnologia avança e faz com que às vezes não seja nem preciso se humano para que a rádio esteja no ar, e imagina só a quantidade de companheiros nossos que são demitidos porque o empresário ou proprietário do meio de comunicação não precisa mais daquela pessoa. Isso me preocupa muito e sempre paro para pensar sobre isso. Para mim é uma das questões em que a tecnologia chegou, melhorou como já citei, mas prejudicou consideravelmente muitos companheiros nossos”, finalizou Sinval Ferreira.
Por: Jefferson Miranda
Fonte: RG 15/O Impacto
Resido do Rio de Janeiro há 25 anos, mas nasci e cresci em Santarém ouvindo as vozes desses dois brilhantes radialistas e não os esqueço. Parabéns pelas relevantes trajetórias Sinval Ferreira e Osvaldo de Andrade! Santarém agradece.