Adeus ao mestre Carlos Platilha
Artigo do advogado socioambiental Ismael Moraes
Aprendi a advogar com o meu irmão Talisman Moraes e com Carlos Platilha, como estagiário, antes de serem sócios, e como advogado, após estabelecerem banca, em 1993.
Não me surpreendi certa vez em que o então presidente do Tribunal de Justiça, o altivo desembargador Nelson Amorim, após um importante julgamento de feito patrocinado pelo Dr. Platilha, ofereceu-se para nos deixar no escritório no veículo da presidência. Durante todo o trajeto presenciei o magistrado continuar a apresentar os argumentos, como a justificar o porquê de ter votado contra a tese patrocinada pelo advogado, vencedor da causa ao canalizar os argumentos escritos por meio de uma sustentação oral sedutora.
Não me surpreendi porque esse era o efeito normal que a cultura jurídica e universal e a autoridade moral do Dr. Platilha causava no Tribunal, brilhantismo que criava ou alterava jurisprudência.
A sua sabedoria não era normal, porque seu estofo intelectual fora amealhado no jornalismo, na militância política e advocatícia intensas, sempre aprofundada pelo constante estudo.
Salvo o clã de Paulo Maranhão, dono do jornal Folha do Norte, Platilha havia sido durante anos quase que a única oposição ao governador Magalhães Barata, cuja truculência acovardava a todos os demais.
A herança política da atuação recebida do pai, destacado membro do Partido Comumista do Brasil, que o fez um dos mais célebres perseguidos políticos da História do Pará, formou convicções libertárias fizeram do Dr. Carlos Platilha um dos mais atuantes, corajosos e competentes advogados de presos políticos durante o Regime Militar.
O Dr. Platilha era ateu convicto, mas conheci na minha vida poucos cristãos tão humanitários e com princípios arraigados no respeito ao próximo quanto ele.
Ao começar a advogar para o setor rural, há mais de 40 anos era um dos mais destacados defensores, o Dr. Platilha deparou a grande quantidade de fraudes fundiárias. Desbaratou várias por meio de ações judiciais, sendo a mais célebre a do “fantasma Carlos Medeiros”, que se sobrepunha a mais de um milhão de hectares de terras públicas e particulares em todo o Estado do Pará.
Também defendeu com maestria os produtores rurais contra a sanha usurária dos bancos, tendo impedido que muitas propriedades tivessem sigo engolfadas por execuções extorsionárias das grandes casas financeiras e das políticas perversas do governo federal através do BASA.
Leitor profundo de H. G. Wells, Victor Hugo, Cervantes e Voltaire, na última conversa que tivemos há uns 6 meses, baqueado com a perda da esposa, declarou-se cansado da vida, citando aquele último: “Aproximo-me suavemente do momento em que os filósofos e os imbecis tem o mesmo destino”.
A Advocacia, a Justiça e a sociedade paraense tiveram e tem a oportunidade de aproveitar o exemplo do Doutor Carlos Platilha, cuja morte não causou a perda do seu legado.
Adeus, meu amigo!
Fonte: RG 15/O Impacto