Professora denuncia racismo e assédio sexual em Santarém
Isabel Silva faz sérias e graves acusações contra aluno e ex-diretores da 5ª URE
Tem certas coisas que deveriam estar enterradas no passado. Mesmo nesta época que vivenciamos a era da informação e tecnologia em pleno século 21, algumas atrocidades e atos desumanos e humilhantes lamentavelmente ainda estão presentes no contexto da sociedade mundial, e Santarém, é claro, não poderia deixar de estar inserida nesse contexto tão nocivo e repulsivo. Trata-se do velho e indesejado racismo. Muitas pessoas em nossa cidade infelizmente são humilhadas, discriminadas, assediadas e em certos casos violentadas. Para dar testemunho dessa infeliz realidade, recebemos em nossa redação a professora Isabel Silva, que é negra, e ao longo dos anos tem sido vítima de racismo e assédio sexual. Ela concedeu entrevista exclusiva à nossa reportagem.
Jornal O Impacto: Professora, a senhora vem sofrendo o crime de racismo por parte de diversas pessoas há muitos anos. Queríamos que a senhora relatasse o episódio, que teve a infelicidade de vivenciar.
Profª. Isabel Silva: Aconteceu um repúdio. Pesquisei sobre esse repúdio e trata-se de racismo, que aconteceu na Vila de Alter do Chão. Sou professora de História 1, 2 e Normal, nas turmas de 1º, 2º e 3º ano. Na terça-feira (09/04), eu estava na sala de aula do 1º ano, quando eu recebi esse impacto de repúdio por parte de um aluno, que fazia gestos com as mãos como se estivesse estrangulando alguém e olhando para mim com expressão de nojo e raiva. Aquilo me gerou muito medo, o aluno estava no lado de fora da sala de aula, atrás de uma janela, que aparecia apenas a parte superior do corpo. Eu fiquei muito nervosa com toda aquela situação e aqueles gestos terríveis que vinham dele. Então, eu peguei um copo de água e joguei nele na tentativa de fazê-lo parar, e para que ele me deixasse em paz. Passaram-se três aulas batidas e ele continuava insistindo naquele ato de repúdio. Eu, de fato fiquei nervosa, minha pressão subiu, eu tomei água com açúcar, tomei um chá, remédio e mesmo assim, minha pressão foi mais longe. Na ocasião, o diretor não estava na escola, a orientadora também não estava; parece-me que ela só trabalha à noite; o diretor que trabalha pelo Município teve de sair, pois nesse dia ele tinha um trabalho externo a fazer e deixou só nós na sala de aula. Esse aluno teve a habilidade de sair lá do 2º ano, da sala onde estuda; ele é também meu aluno, mas quando são minhas aulas, ele não assiste. Quando eu entro na sala, ele se levanta imediatamente e sai. E infelizmente nesse último dia, ele não entrou na sala do 2º ano e foi para a janela da sala em que eu estava trabalhando e ficou fazendo aquele ato de repúdio que me deixou até agora muito assustada, aquele gesto de racismo. Inclusive, há muitos anos, venho sofrendo esse tipo de preconceito (racismo). Sofri um racismo perverso, especificamente de cor, na APAE, por parte de uma ex-diretora que inclusive faleceu, mas este caso estava na Delegacia, mas nunca foi concluído. Ficou só no “disse-me-disse”, “porque a Isabel é negra, ela pode sofrer”. O diretor da escola de Alter do Chão não fez o Boletim de Ocorrência, me poupando, porque eu já tinha ocorrências na escola Polo Dom Tiago que é de Santarém, e na Escola Aluízio Martins. Por que eu não fui trabalhar na escola Aluízio Martins? Quando eu trabalhava, eu entrei de licença e passei 24 meses parada, quando saí da licença não tive mais como retornar para a escola, pois a carga horária já estava cheia. E só quem estava naquele momento na carga horária eram as pessoas efetivas, eu também sou efetiva, mas não poderiam tirar essas pessoas para me colocar lá, e a carga horária que estava sobrando, justamente era essa em Alter do Chão. Isso em setembro de 2016. Trabalhei com os primeiros, segundo e terceiros anos; as turmas me aceitaram numa boa neste período de 2016 e 2017, mas agora em 2018 um aluno, que inclusive foi meu aluno em 2017 em história 1 e 2, agora em 2018 no 2º ano esse aluno está me repudiando. É um jovem com grandes possibilidades de crescer, mas ele prefere pegar seu telefone para ficar me filmando e tirando foto.
Jornal O Impacto: Professora esse aluno, lhe fez alguma ameaça?
Profª. Isabel Silva: Verbalmente não. Ele fazia o gesto com a boca dele, mas não saia som, era só o gesto de estrangulamento com as mãos e aquela cara de repúdio, de nojo e raiva. Eu sou negra e sou um ser humano. O diretor me falou que isso não iria acabar bem, porque ele conhecia esse aluno há mais de 10 anos, ele sabe que trata-se de uma pessoa boa e que esse aluno não é dessas coisas, ou seja, ele confia no aluno. Só que ele não vê o que aluno está fazendo pelas costas dele. Eu já pedi, desde o início desta situação: “Professor, converse com esse aluno, para você ver a situação que se encontra. O jovem não está querendo se engrenar aqui na sala de aula, não quer estudar, ele pode deixar a vez para outro que quer”.
Jornal O Impacto: Então, a situação crítica que está acontecendo com a professora Isabel, já começa no momento em que ela entra na sala, o aluno se levanta e se dirige para fora; e no momento em que o mesmo deveria estar assistindo a aula dos outros professores, ele se dirige para a janela lateral da sala para fazer gestos. A senhora procurou o apoio da segurança pública e dos órgãos competentes?
Profª. Isabel Silva: Fui até o Ministério Público pedir ajuda. Inclusive, nessa ocasião, minha pressão estava lá em cima em cerca de 14 x 8. Eles me disseram que iriam pegar minha causa, passar para a Promotora encarregada, e a mesma iria até a 5ª URE e com o diretor do polo de Alter do Chão e, posteriormente se for o caso, se o menino for de menor, irão procurar o Conselho Tutelar. De acordo com os trâmites, ainda tenho de trabalhar lá, eu ainda vou ter segurança na sala, ou seja, me ajudarem na segurança. Eu pedi, pois estou com medo. Eu já estudei os casos dos índios, eu sei quem são os índios, ainda não tive contato físico, eu tenho medo de acontecer uma tragédia. Eu vivo na cidade sozinha, se for para eu não trabalhar lá, eu abro mão e mesmo assim já está chegando o dia e a hora de me aposentar, eu estou com mais de 30 anos de trabalho e estou nessa situação, pedindo ajuda. Eu não sou pessoa de ficar adulando diretor de escola, não sou pessoa de ficar adulando pessoas da 5ª URE, porque eu sou funcionária de um sistema desde 1986, eu já era professora desse módulo que estou hoje; estou com as crianças iniciais que sempre trabalhei de 1º e 2º ano, já entrei no trabalho com 200 horas. Hoje eles querem me tirar essas horas e eu não aceito. Aí vêm as consequências dos diretores de escolas. Em 2004 eu passei por uma situação muito crítica na 5ª URE, o diretor da época, o professor Edivaldo Bernardes, até meu salário de dezembro, janeiro, fevereiro, março, abril e maio ele segurou. Eu só pude receber porque eu recorri ao Ministério Público. O promotor Raimundo Brasil fez ele me devolver meu salário, mas sem nenhum aumento, apenas o salário; meus filhos estavam passando necessidade.
Jornal O Impacto: Qual foi o motivo do diretor da época, Edivaldo Bernardes, bloquear seu salário?
Profª. Isabel Silva: Assédio por parte do diretor, como ele me queria e eu não o quis, ele segurou meu dinheiro. Aí eu passei necessidade, eu e minha família. Eu sozinha para trabalhar com minha família, então, foi aí que eu procurei o Dr. Raimundo Brasil, e ele me disse assim: “É, professora, é porque todos os patrões têm direito de ficar e namorar com as secretárias”, Eu retruquei: “Dr. Raimundo Brasil, em primeiro lugar eu não sou secretária do professor Edivaldo Bernardes, nós somos colegas de trabalho, quem nos paga é um sistema que se chama Estado, de onde sai o salário dele sai o meu. Ele não pode pegar meu salário, encurtar, enquanto eu posso adoecer e não ter recursos para me cuidar”. Nessa época eu adoeci de um dente e meu rosto ficou inchado, quem me liberou desse trabalho para eu mandar ajeitar e arrumar foi um ginecologista, Dr. Domingos, hoje ele é analista da Delegacia; ele que foi lá e disse que a Isabel não pode trabalhar porque a mesma estava com o olho fechado e outro aberto, então, ele me tirou lá da sala em que eu estava trabalhando, enfrentou o professor e me levou para a Clínica Esperança. Foi aí que o médico tirou Raio-X do meu rosto. Ele viu a situação e me deu um atestado para que eu pudesse voltar só quando eu estivesse boa. Desde 2004 eu venho sofrendo. Eu trabalhei de 2006 a 2008 na escola Pedro Álvares Cabral, foi quando o diretor do Cabral da época, Dirceu Amoedo, me devolveu para a 5ª URE. Aí a Bernadete perguntou: “O que a professora fez?”, “a professora fez isso? Fez aquilo?”, e todas as respostas eram não. “E por que que a professora está aqui?” A resposta era: “Não sei”. Isso é coisa de levar alguém para uma direção de uma 5ª URE? Em 2016, esse homem (Dirceu Amoedo) me assediou na frente das colegas; na ocasião, estavam presentes a professora Graça e Joice, que era professora da lotação, e presenciaram tudo. Ele me assediou tanto que sua parte genital subiu. Eu vi essa situação da parte do Dirceu Amoedo da 5ª URE. Será que eu posso passar por esse assédio? Só porque eu não quero o seu fulano ou ir para cama com o seu fulano, ele me joga lá para Alter do Chão, e eu estou pagando para trabalhar lá, pois moro em Santarém e me desloco para Alter do Chão, pagando passagem de R$ 3,60, ida e volta. Tudo isso por que eu não quis ficar com o Sr. Dirceu Amoedo, por que não fiquei com Edvaldo Bernardes? Aí fica nesse impasse, nesse assédio infernal que eu estou passando na minha vida, e de quebra enfrentando esse racismo. Ninguém olha, eu estou gritando, eu quero me aposentar porque eu não aguento mais. Só eu e Deus sabemos o que estou passando. Aí vem esse rapaz, lá de Alter do Chão, me amedrontar fazendo gestos, indicando que ele vai me estrangular. Eu tenho medo sim, lá eles são muitos e eu sou sozinha (finaliza emocionada a professora Isabel Silva, em seu desabafo).
Por: Allan Patrick
Fonte: RG 15/O Impacto