Tavares: “Pais têm que fiscalizar os filhos para evitar as drogas”
Policial federal Uilsses Tavares faz o alerta às famílias
Nossa equipe de reportagem recebeu a visita do policial federal aposentado Uilsses Tavares, que nos concedeu entrevista exclusiva, onde aborda vários assuntos, entre os quais, as grandes apreensões de drogas que estão acontecendo em Santarém e demais municípios do Pará. Veja a entrevista:
Jornal O Impacto: Hoje nós vamos falar sobre um assunto que, infelizmente, é considerado um dos grandes males do século e que vai tomando uma proporção maior a cada dia que passa. Lamentavelmente aqui no Oeste do Pará, infelizmente nós temos essa triste realidade que está embutida no contexto da nossa sociedade e como todos sabem, Santarém hoje é rota de tráfico de drogas, que está presente no nosso cotidiano, principalmente na vida dos nossos jovens. Na sua visão, por que hoje estamos enfrentando essa realidade e quais são os desafios no caso para conter esse avanço?
Uilsses Tavares: Para lhe dar essa resposta a gente precisa voltar um pouco no tempo. As drogas já existem há milênios e o nome droga hoje está sendo usado de forma pejorativa, uma droga é uma coisa ruim, só que droga são remédios. Antigamente o nome droga era usado como remédios, que eram feitos de plantas, drogas eram feitas de casca de árvore, tanto que a palavra droga vem do holandês antigo chamado brooke, que significava folhas secas, ou seja, as drogas eram remédios feitos de folhas secas, de cascas de árvores. Como nós fazemos hoje em dia aqui em Santarém alguns chás, para passar dor de barriga, para passar isso ou aquilo, a maconha era usada para fazer chá. Por que a maconha, das folhas eram feito chá? Porque a maconha é broncodilatadora, é bom para asma. Então, essas drogas eram usadas como remédio. Hoje, com a tecnologia, com a evolução da química, foram colocando outros ingredientes nesses materiais e nessas plantas, que acabaram virando drogas. No sentido ruim da palavra, vamos dizer que fazem mal para a saúde. A evolução vem crescendo, como você entendeu, método dos primórdios, vem desde o início do século. A cocaína também é usada como remédio. A cocaína “coca” era usada até em refrigerante (que não vou dizer o nome), depois logicamente as leis mudaram e a Legislação tirou a coca desse refrigerante; mas eles colocaram outras coisinhas tipo cafeína que também é a droga que vem do café. Então, a evolução realmente cresceu, ela continuou. Eu direi até que hoje, a própria tecnologia, a própria revolução da química e dos conhecimentos químicos pioraram, fizeram com que as drogas evoluíssem de uma forma grave para fazer mal à saúde. Agora, o combate existe, o Estado vai combater a entrada dessas drogas maléficas, mas a evolução daqueles que produzem também acontece. Então, além do combate a essas drogas, nós temos também que ter a informação. Não sei se é isso que é necessário e que é preciso, mas nós temos que informar, a própria escola, o próprio Governo, o próprio Estado tem que informar, tem que orientar e dizer: “Olha, a partir de agora isso aqui já virou uma droga, uma coisa que faz mal para saúde, é uma coisa ilegal, a Legislação não permite, é uma coisa ilícita. Nós temos que combater isso, você não pode usar”. Então, isso nós temos que informar e orientar nossos jovens.
Jornal O Impacto: De certa forma, desde a infância, desde o início, a família tem que orientar?
Uilsses Tavares: Nós temos que ter espelho dentro de casa. Hoje quais são os melhores espelhos que temos dentro de casa? O pai e mãe, aqueles que têm suas atitudes corretas, ou seja, se o pai e a mãe não bebem e nem fumam, o filho com certeza não vai beber e nem fumar. 99% de chance de não fazer isso. Só que alguns pais, apesar de tudo isso, dar bons exemplos (alguns não dão, claro), mas alguns pais não conseguem saber o que é que o filho faz quando dobra aquela esquina, quando sai de casa, quando já tem liberdade para ir para a casa de um amigo, para ir para à escola sozinho, para ter contatos com vizinhos, o que ele faz lá no clube e lá no futebol, porque lá também nós temos as crianças e adolescentes, também têm amigos que já estão indo por outros caminhos. Então, é uma luta constante, porque você tem que estar todo tempo apoiando, orientado, ensinando, servindo de espelho para que eles não tenham contato e não venham experimentar um tipo de droga ilícita ou lícita, mesmo que não vá fazer mal para sua saúde.
Jornal O Impacto: Como eu citei antes, você é um policial federal aposentado, então, você deve ter passado por diversas situações, principalmente quando se trata dessa área. Você deve ter visto de tudo, você acabou de dizer que existe uma evolução que vem acontecendo através dos milênios, através dos séculos, mas assim no nosso contexto, você acha que desde a época que você começou sua trajetória como policial até hoje, mudou alguma coisa?
Uilsses Tavares: Para ser sincero, eu não vejo uma mudança. Hoje está tudo muito mais controlado. Há 33 anos, quando eu entrei na Polícia Federal, o combate era o mesmo que é feito hoje. As evoluções tanto da parte dos narcotraficantes como na parte da Polícia são constantes, ou seja, a Polícia melhora e os narcotraficantes também. Um tem que estar sobrepondo ao outro, porque o combate é assim, eu preciso combater, mas o narcotraficante precisa sobreviver, porque ele sobrevive da venda da droga ilícita. Então, não vi muita mudança, mas eu vi que o controle está sendo bem feito pelas polícias, existe uma coisa chamada integração. Antigamente não havia muita integração entre as polícias e Forças Armadas, cada um fazia o seu trabalho. Hoje já tem o trabalho de inteligência, que é feito coordenado com as polícias, até mesmo com as Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica). Então, esse trabalho de inteligência contribuiu muito para que você fizesse grandes apreensões. As Polícias Militar e Civil fazem um trabalho incansável. Elas estouram uma boca de fumo aqui, mas se abre outra boca de fumo do outro lado. As Polícias prendem o traficante e surgem dois parentes dele vendendo no outro lado. É uma luta constante, mas essa luta tem que ser feita, porque nós estaríamos cercados de vendedores de drogas. Agora, o trabalho de inteligência tem que ser feito, porque ele pega e consegue apreender grandes quantidades de drogas, é um trabalho mais específico para aquele que está comercializando lá em cima, é uma pirâmide, ou seja, existe um grande traficante e tem aqueles pequenos embaixo, que é a maioria. Recentemente nós conseguimos pegar um grande traficante e uma grande quantidade de droga, em Belém, quando foi apreendida uma tonelada e meia de cocaína. Serviço de Inteligência integrado às Secretarias antidrogas de outros países. No caso, foi uma tonelada e meia de cocaína pura, ia ser comercializada na Europa, não ia nem ficar aqui no Brasil, ia para lá. Um trabalho desse, pra se tirar uma grande quantidade de drogas, tem que ser integrado. Se não for assim, não tem jeito.
Jornal O Impacto: Inclusive, nós tivemos a honra de receber em outra oportunidade aqui no nosso estúdio o Comandante do CPR-1, Coronel Tomaso, que deu notícias boas com relação aos índices de criminalidade no primeiro semestre deste ano, que diminuiu. Mas, sabemos que a base é o tráfico de drogas. Ele também atribuiu esse trabalho em conjunto, que na minha opinião, é uma das soluções no combate.
Uilsses Tavares: Se você não integrar, se você não trocar informações, para quem interessa, a quem interessa, o trabalho integrado das policias, ou seja, eu passar informação para eles, eles passarão para mim? Interessa para a sociedade, interessa para a comunidade, para população. Então, nós temos que fazer esse trabalho, porque nós somos servidores públicos, nós estamos trabalhando para aqueles que pagam os nossos impostos, que pagam nossos salários. Temos que fazer um trabalho integrado, um trabalho de inteligência, que surta efeito, como acontece aqui em Santarém, um trabalho excepcional que é feito pelo Coronel Tomaso e por toda sua equipe de policiais militares, a Polícia Civil também, enfim, nós temos que trabalhar para a sociedade. Nós temos que aprimorar muito mesmo essa questão, essa parte da Inteligência nos monitoramento. É claro, autorizados pela Justiça. A Polícia Civil e a Polícia Militar estão cansadas de saber que não adianta fazer nada ilegal, que não vai funcionar, pois lá em cima ela cai. Temos que fazer tudo direitinho judicialmente e trabalhar em prol da sociedade. Esse trabalho integrado dá muitos frutos, e frutos grandes. Em janeiro deste ano um morador foi baleado na favela do Rio de Janeiro, estavam carregando esse morador para ser atendido e quando o viram na televisão, era um traficante procurado há muitos anos pelas Polícias Civil e Federal. Ele foi preso na cama do hospital. Então, é esse o trabalho, foi imediato, apareceu e correram no hospital e o prenderam. É trabalho de inteligência, é trabalho de fotografia, trabalho de arquivo, tudo isso está no computador, a informática facilita.
Jornal O Impacto: Sabemos, como você mencionou no começo dessa matéria, que há muitos anos já existia a droga. Antes eram remédios, do lado bom da palavra, sempre foi utilizado no contexto da sociedade mundial, mas aconteceu uma evolução e hoje nós podemos presenciar principalmente em vários bares e festas a presença de drogas sintéticas, drogas feitas em laboratórios. Nós sabemos que para acontecer o tráfico de drogas e para criminalidade aumentar por conta disso, é pelo fato da necessidade de seus usuários cometerem crimes, participarem de situações de roubos, e outras coisas ruins, pelo fato de ser um pouco caro a droga.
Uilsses Tavares: Os traficantes estão, na verdade, procurando até um outro público, um público um pouco mais acessível. Antigamente, a cocaína (o cloridrato que é o pó), que o pessoal chama de farinha, era uma droga caríssima, só quem usava era o pessoal da elite, o pessoal da alta sociedade. Como a alta sociedade, vamos dizer assim, era uma pirâmide e os mais pobres precisavam atingir a base da pirâmide, então, começaram a comercializar e fazer drogas, produzir drogas mais baratas, as anfetaminas que estão sendo feitas de forma sintética. Nós podemos citar o êxtase, que é feito de forma sintética, baseado em uma anfetamina, que vem de um estimulante. Antigamente as anfetaminas (estimulantes) eram aqui chamadas de bolinha “rebite” que os caminhoneiros usam para ficarem acordados. Aí, eles potencializaram aquilo e estão vendendo nas festas, para os meninos se drogarem mesmo, para ficarem mais ligados e acabam excedendo e usando demais, o que chamamos de abuso das drogas, que leva à dependência, ao vício. Então, essas drogas começaram pequenas, estão crescendo e ficando mais potencializadas, para que a mente do usuário goste e ele acabe usando cada vez mais em pouco espaço de tempo. O crack e a cocaína; só que naquela pasta base de cocaína que primeiro tem as folhas, depois vem a pasta base e depois se faz o cloridrato, se faz o crack, se faz a merla e se faz outros subprodutos. A pasta base se torna acessível a qualquer pessoa infelizmente, a qualquer morador de rua ou a qualquer criança. Agora mesmo nós vimos na televisão uma droga lá no Reino Unido chamada “pó de macaco”, sendo dez vezes mais potente do que o êxtase, droga dos zumbis, porque tira a dor e o cérebro é afetado; existe uma confusão cerebral dopamina, serotonina, esses hormônios entram em ebulição que você perde o controle, eles ficam excitadíssimos e acontece que não sentem dor, a pessoa se atira de cima dos prédios, se joga na frente dos carros, é uma droga sem controle, baratíssima. O “crocodilo” também é uma droga parecida com a do “pó do macaco”, só que esses zumbis do “crocodilo” têm a pele modificada, onde eles injetam começa a necrosar, a carne começa a apodrecer e aparecem os ossos. A substância colocada na pele não cicatriza. Uma droga potencializada de laboratório, para que as pessoas continuem usando, que é barata e de fácil aquisição, mas fortíssima. Quando alguém só usa camisa de mangas compridas, é porque está querendo esconder alguma coisa. Nas minhas palestras costumo dizer que motoqueiro que furta celular, é para trocar por drogas.
Jornal O Impacto: Qual a mensagem que você pode deixar para aqueles pais que talvez nem sonhem que seus filhos utilizam esse tipo de substância.
Uilsses Tavares: Eu sempre digo nas minhas palestras, que o pai e a mãe são os esteios da casa. Os pais devem orientar e conversar, mas têm que fiscalizar, mudar a rotina, ao dar um abraço no filho, cheirar seu cabelo para vê se tem alguma diferença. Içami Tiba diz: “Quem ama cuida”. Quando a criança ou adolescente está faltando à aula e o braço apresenta algumas perfurações de seringa, pode estar usando cocaína injetável ou usando qualquer outro tipo de droga. A melhor opção é não deixar o filho experimentar, porque depois que a pessoa experimenta, pode gostar e você perde o controle. Então, os pais têm que orientar, as escolas têm que fazer palestra, uma matéria específica sobre drogas. Tomara que outros governos se preocupem um pouquinho sobre esse tipo de orientação, desde o início até a idade adulta. Recebo muito material sobre prevenção às drogas, eu confesso que vou continuar postando esse tema quando me convidarem para fazer palestras, porque eu gosto muito. Tenho 4 filhos e sempre fiz esse trabalho. Desde 2005, quando fiz curso de prevenção às drogas em Brasília. Enfim, eu digo uma coisa: “O narcotráfico evolui, mas a Polícia também evolui”. Os pais também têm que se orientar para que possam evoluir no conhecimento e passar para seus filhos. O trabalho não é só do Estado, o trabalho também é da família e a família trabalhando bem, orientado bem seus filhos, com certeza vai fazer com que andem pelos caminhos da vitória.
Por: Jefferson Miranda
Fonte: RG 15/O Impacto