Com Márcio Miranda, Alepa gasta R$ 455 milhões em um ano e é a 2ª mais improdutiva
Em 18 de março de 2015, o presidente da Assembleia Legislativa do Pará (Alepa), deputado estadual Márcio Miranda (DEM), anunciou que a nova sede da Alepa sairia, em breve, do papel. Uma comissão de parlamentares estivera em Brasília, para a assinatura de um documento no qual a União cedeu um terreno na avenida Júlio César, em Belém, para abrigar o novo prédio.
“Era um sonho nosso esta área e uma necessidade. Para se ter uma ideia, na última maré alta que teve na região do Ver-o-Peso, o plenário alagou. Temos deputados em gabinetes com dificuldades, não cumprimos a lei de acessibilidade nem externa e nem interna”, disse, à época.
Hoje, no entanto, passados 3 anos e 6 meses da promessa de Miranda, não há sinal da nova sede da Alepa, cujas obras nem sequer começaram. E o prédio atual onde funciona a “casa do povo”, no bairro da Cidade Velha, é o retrato do abandono: há paredes com infiltrações, cheias de mofo e com o reboco estourado; tetos sem forro, escadas quebradas, fiação elétrica exposta, corredores sem iluminação – e por aí vai.
A situação é tão dramática que, em fevereiro deste ano, o Corpo de Bombeiros teve de ser chamado devido ao desabamento de parte do teto da sala da Procuradoria. Dias antes, também desabara parte do teto do gabinete do deputado Miro Sanova (PDT). Por sorte, nas duas ocasiões ninguém se machucou. Mas os incidentes deixaram claro que a Alepa vive uma situação caótica.
E o problema, ao que tudo indica, não é de falta de dinheiro: no ano passado, os gastos da Alepa atingiram quase R$ 455 milhões. Mas desse total, apenas R$ 1 milhão (ou 0,22%) foi destinado a investimentos. A maior parte desses R$ 455 milhões (ou quase 74%) foi torrada com o pagamento de pessoal.
O pique dessa gastança, com o pagamento de cerca de três mil servidores para 41 deputados, ocorreu em 2013, no primeiro ano da administração de Miranda. Naquele ano, as despesas ficaram em R$ 320 milhões e os gastos com pessoal consumiram mais de 75% desse dinheiro. Já os investimentos ficaram em apenas 0,07% desse total.
SUCATEAMENTO
É essa opção pela gastança com um batalhão de funcionários (que inclui uma profusão de assessores) que explica o sucateamento da atual sede da Alepa e a falta de investimentos no novo prédio. E basta cruzar os números de dois documentos oficiais do Governo – o Orçamento Geral do Estado (OGE) e o Balanço Geral do Estado (BGE) – para se chegar a essa conclusão.
Em 2013, o OGE previa que a Alepa gastasse R$ 298 milhões. Desse total, quase R$ 19 milhões seriam destinados a investimentos; R$ 176 milhões ao pagamento de pessoal; e R$ 103 milhões a Outras Despesas Correntes (ODC), que são os gastos do dia a dia para o funcionamento da Casa, como é o caso de combustíveis, copos descartáveis e até diárias de viagem.
Mas, diz o BGE, a Alepa acabou gastando R$ 320 milhões e, desse total, menos de R$ 226 mil foram para investimentos (dos R$ 19 milhões previstos). Os gastos com ODC também ficaram abaixo do orçado: fecharam em menos de R$ 80 milhões. Em compensação, as despesas com pessoal atingiram quase R$ 241 milhões (ou cerca de R$ 65 milhões a mais do que o orçado).
O quadro se repetiu em todos os anos da gestão de Miranda, que permanece como presidente da Casa e é candidato ao Governo do Estado, com o apoio do governador Simão Jatene, cuja administração foi marcada pelos mais baixos níveis de investimento que o Pará já viu. Em 2014, Miranda deveria investir quase R$ 19 milhões, mas investiu menos de R$ 360 mil, enquanto os gastos de pessoal, que deveriam ficar em R$ 222 milhões alcançaram quase R$ 256 milhões.
Em 2015, o orçamento previa que ele investisse quase R$ 14 milhões, mas ele investiu menos de R$ 1,5 milhão, enquanto as despesas com pessoal, que estavam orçadas em R$ 243 milhões, ficaram em quase R$ 268 milhões. Em 2016, a previsão era de R$ 17 milhões em investimentos, mas ele investiu menos de R$ 5,5 milhões (pouco mais de 1% dos R$ 455 milhões que gastou).
As despesas com pessoal, que deveriam ficar em menos de R$ 260 milhões, acabaram ficando em quase R$ 336 milhões (cerca de R$ 75 milhões a mais do que o previsto, o que significou um aumento de 25%, em relação ao ano anterior). Já no ano passado, a previsão de investimento foi bem mais modesta: apenas R$ 2,1 milhões. Mas nem assim Miranda chegou lá: ele investiu apenas R$ 1 milhão. E as despesas com pessoal fecharam em quase R$ 335 milhões, contra os R$ 303 milhões orçados.
Alepa está entre as menos eficientes do País
No ano passado, uma pesquisa colocou a Alepa entre as mais caras e menos eficientes assembleias legislativas do Brasil. Ela foi realizada pelo cientista de dados Leonardo Sales, mestre em Economia pela Universidade de Brasília (UNB), com base em informações, de 2016, das 26 assembleias estaduais e da Câmara Legislativa do Distrito Federal.
A Alepa ficou em penúltimo lugar, superando apenas a assembleia legislativa de Roraima, no Índice Geral de Eficiência (IGE). Numa escala de 0 a 8, a Alepa obteve apenas 3.49 pontos, contra 3.14 da última colocada, e 6.25 da primeira – a assembleia legislativa de Goiás. O índice foi criado por Leonardo a partir de 8 indicadores de produtividade, entre eles os custos da assembleia por habitante e por lei criada, gasto com pessoal ativo por deputado e percentual de dias úteis com sessões ordinárias (aquelas nas quais são aprovadas as leis).
O levantamento mostrou, por exemplo, que a Alepa realizou sessões ordinárias em apenas 20% dos dias úteis de 2016, contra a média de 47% das demais assembleias pesquisadas (não há informações da Paraíba, Tocantins, Rio Grande do Norte, Acre e Roraima). Ela foi, aliás, a última colocada nesse quesito: teve apenas 52 sessões plenárias, contra 191 de São Paulo e 176 do Ceará,
as melhores do ranking.
GASTO
Além disso, a Alepa foi a que apresentou o terceiro maior gasto por lei criada (R$ 3,883 milhões por lei), atrás apenas do Rio Grande do Sul (R$ 4,176 milhões) e de São Paulo (pouco mais de R$ 4 milhões), entre as 25 onde foi possível colher esse dado (não há informações do Rio de Janeiro e Maranhão). A melhor desse ranking foi Goiás, com R$ 850 mil por lei, ou quatro vezes menos que o Pará, apesar de possuir o mesmo número de deputados (41).
A Alepa foi, ainda, a que apresentou o oitavo maior custo de pessoal ativo por deputado (R$ 6,819 milhões), atrás apenas do Distrito Federal, Rio de Janeiro, Mato Grosso, Minas Gerais, Rio Grande do Norte, São Paulo e Santa Catarina, todos estados que possuem Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) muito superior ao do Pará. Para esta reportagem, o DIÁRIO tentou contato com a assessoria de Miranda. Mas, até o fechamento desta edição, não obteve resposta.
Alepa descumpre LRF e coloca em risco empréstimo
O problema é tão grave que, pelo menos desde 2016, a Alepa não cumpre os limites de gastos com pessoal da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), o que coloca em risco até a possibilidade de o Governo do Estado obter empréstimos externos, para obras em favor da população do Pará.
Exemplo disso é o que aconteceu em junho último, quando o Governo quase perdeu um empréstimo de 35 milhões de dólares junto ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), para a execução do projeto de modernização da gestão fiscal do Pará, o Profisco II. Ao examinarem a documentação do financiamento (que precisa do aval do Governo Federal, já que se trata de um empréstimo externo) técnicos da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) constataram que a Alepa havia descumprido a LRF no primeiro quadrimestre deste ano.
A Alepa poderia gastar até 1,56%, mas gastou 1,73%. O rolo piorou quando os técnicos examinaram novos documentos encaminhados pelo Governo: ficou claro que o descumprimento da LRF, pela Alepa vem ocorrendo desde pelo menos o 2º quadrimestre de 2016.
LIMINAR
Com isso, a STN disse que não poderia continuar analisando a transação. E o Pará só não ficou sem a possibilidade de obter esse dinheiro porque o Governo conseguiu uma liminar do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Detalhe: a Alepa vinha conseguindo driblar o limite legal graças a uma Resolução do Tribunal de Contas do Estado (TCE), datada de 2003, no primeiro governo de Jatene.
A Resolução permitiu excluir das despesas com pessoal, para cálculo dos limites da LRF, o Imposto de Renda que fica retido na fonte, quando do pagamento do funcionalismo. Só que o Tesouro Nacional não aceita esse tipo de manobra.
No primeiro quadrimestre deste ano (considerado um período de 12 meses) as despesas com pessoal da Alepa (apenas as que contam para calcular os limites da LRF), atingiram mais de R$ 315 milhões, apesar de o seu batalhão de servidores estar concentrado em um único prédio, na capital.
Já as despesas de pessoal do Ministério Público Estadual (MPPA), que possui instalações em 112 municípios, ficaram, no mesmo período, em R$ 341 milhões – ou apenas R$ 26 milhões a mais. Na Alepa, a relação é de 73 funcionários por deputado. No MPPA, onde há 1.005 servidores para 348 procuradores e promotores, a relação é de 3 para 1, apesar dos milhares de processos e investigações que passam por lá.
Também é desfavorável para a Alepa quando co parada com o Tribunal de Contas dos Municípios (TCM). No Tribunal, há 509 funcionários para 11 conselheiros (incluindo os substitutos), o que dá 46 servidores por conselheiro. Mas lá são examinadas as prestações de contas das prefeituras e das câmaras municipais dos 144 municípios do Estado, além de apuradas eventuais denúncias de cidadãos e entidades.
Fonte: Dol