Armando Carvalho: “Repórter, jornalista e locutor têm de ter mais autonomia”
Segundo o comunicador, o público conhece o radialista pela voz; já o repórter de televisão é pela imagem e aquilo que apresenta Radialista, em entrevista, fala de sua trajetória nos meios de comunicação
Um dos mais destacados profissionais do rádio em Santarém, Armando Carvalho, esteve no estúdio da TV Impacto e na redação do Jornal O Impacto, onde concedeu entrevista exclusiva, falando de sua carreira.
Jornal O Impacto: Conte para nós como tudo começou.
Armando Carvalho: Quando eu era adolescente ouvia muito a Rádio Rural, que tinha Osvaldo de Andrade, Edinaldo Mota e Natalino Souza. Ouvia muito esse pessoal, principalmente do esporte, porque eu comecei como narrador esportivo e escutava muito a Rádio Rural, Rádio Clube do Pará, Rádio Rio Mar de Manaus e Alvorada de Parintins, onde eu comecei. Eu sempre digo que eu sou um repórter e locutor, radialista autodidata. Eu aprendi desde pequeno ouvindo rádio, depois na rua trabalhando como repórter. Agora, narrador esportivo foi meu primeiro trabalho, as narrações eram feitas na beira do campo. Eu pegava lata de leite ninho e ia para a beira do campo, no jogo de pelada e narrava o jogo. Eu ficava treinando ali na beira do campo. Um certo dia um padre italiano (já tinha experiência de rádio na Itália) viu aquilo, pois o campo de futebol era da Paróquia, disse: “Armando, vamos melhorar esse teu serviço de alto-falante”. Ele comprou um gravador de rolo com microfone e a gente gravava. Ele era meu comentarista, eu narrava o jogo e ele comentava. Depois a gente ia ouvir aquele trabalho, sendo que algumas coisas ele corrigia, pois tinha conhecimento. Eu era garoto ainda e o padre tinha conhecimento da língua portuguesa como também de transmissão de jogos. Foi um negócio interessante, porque depois esse mesmo padre me convidou para ser locutor da Paróquia, animar o arraial. Naquele tempo, arraial tinha show de calouros, tinha bingo, tinha desfile de meninas; era muito animado. Fui ser locutor da Paróquia da comunidade, narrando não só os eventos da Paróquia como também futebol, porque esse padre incentivava muito o futebol de campo e futebol de salão, vôlei. Era um negócio muito legal realmente e passei o ano de 1976, fazendo esse trabalho para igreja e em 77 ele me levou para a Rádio Alvorada, já como narrador oficial, transmitindo jogos diretamente do estádio do Tupy Cantanhedes. Narrei jogos do ano de 77 a 79, depois fui para Manaus convidado para ir para a Rádio Baré, que naquela época tinha muita potência. Naquele tempo tinha o Jaime Barreto, que era o principal narrador da Rádio e Luiz Rougles, que era o segundo narrador. Eu passei a ser o 3º narrador da Rádio, era o cara que viajava, conheci todo o Amazonas, conheci uma parte do Brasil, como Mato Grosso do Sul, Cuiabá e fui até Brasília narrar jogo pela Rádio Baré. Naquele tempo tinha o Campeonato Brasileiro de Júnior, e Manaus todo ano participava com seu time. A nível regional também tinha o Campeonato Amazonense, que emglobava várias cidades próximas de Manaus. Narrei muitos jogos em Porto Velho e nas cidades vizinhas, como Itacoatiara. Viajei muito, foi uma época muito boa para o meu trabalho e meu desenvolvimento, como locutor esportivo. Nessa época na Rádio Baré, para melhorar meu orçamento, já transmitia jogos e fazia jornalismo, ou seja, pela manhã ficava na Rádio fazendo os noticiários de hora em hora, pois naquele tempo não tinha internet. Eu recebia pelo telex as notícias. Fui aprendendo a fazer notícia naquele tempo, que já saía para fazer algumas entrevistas locais. Era muito difícil também a gente entrevistar alguém naquela época, eu não tinha gravador. Eu lembro que o primeiro gravador que me deram era muito grande. Uma vez eu cheguei lá no aeroporto de Parintins para entrevistar o governador do Estado e o dono da Rádio onde eu trabalhava era Deputado, ele me viu com aquele gravador grande e ficou com vergonha, pois o Governador perguntou se aquela Rádio era dele, quer dizer, questionou o equipamento que o repórter da sua Rádio estava usando. Desde então, providenciaram um gravador menor, em São Paulo e Rio de Janeiro. Eu sou do tempo antigo, onde para fazer um comercial pegava aquela fita de rolo para gravar, depois pegava essa fita e cortava com uma gilete. A edição era no corte com gilete e editava com uma fita durex, depois emendava a fita para editar. Uma história interessante da minha carreira foi que em 1981 eu trabalhei em uma Rádio FM em Manaus chamada Rádio Tropical FM, hoje ela é Rádio Cidade e nessa época já tinha computador. O slogan era assim: ´Rádio Tropical FM, a primeira emissora computadorizada da América Latina`. Agora pense no tamanho do computador, era uma sala e eles colocavam os cartuchos dentro daquele computador, quando a fita passava acionava lá o dispositivo e entrava no ar a tua voz. Locutor antigamente tinha que ter a voz boa, tinha que puxar o R. Eu estou dando um curso agora na Rádio Guarany, onde estou ensinando a falar com R, porque os locutores modernos não sabem falar com R, aí a primeira aula é o ´rato roeu a rede de Rita`.
Jornal O Impacto: Você está há quanto tempo atuando em Santarém?
Armando Carvalho: Quase 30 anos. A rádio que eu trabalhava era do Prefeito e ele perdeu a reeleição. Interessante, há mais de 30 anos aconteceu isso e ainda acontece nos dias atuais, rádios de políticos, que geralmente caem muito de produção e financeiramente quando o político perde mandato. Nessa época, quando o Prefeito perdeu a reeleição, ele comunicou para todos os funcionários: ´Olha, perdemos a eleição, eu não vou poder mais pagar vocês pela Prefeitura. Cada um vai ter de fazer o seu salário. Quem tem comercial, deverá dividir metade para a Rádio. Vamos diminui o quadro e, Armando, tu vai ficar`. Eu disse: ´Olha, vou dar uma volta lá em Santarém, se der certo eu fico por lá`. Minha filha mais velha já estudava aqui, eu vim trazer um presente de Natal para ela e fui lá na Rádio Rural, onde eu queria trabalhar, pois eu era fã do Osvaldo de Andrade, Sinval Ferreira e Edinaldo Mota e eu queria trabalhar lá. Só que a Rádio Rural nessa época funcionava no Seminário São Pio X. Me disseram que a Rádio estava passando por dificuldades. Aí fui com o Nivaldo Pereira, da Rádio Ponta Negra, que estava no auge, tinha muito dinheiro investido, tanto é que a Ponta Negra tinha vários carros de reportagem e os melhores locutores naquela época. Eu fui trabalhar na Ponta Negra, mas não demorei muito, pois a Rádio Rural se mexeu através do padre Valdir Serra, contratou um gerente novo, o saudoso João, que era formado em administração de empresas, e ele me chamou para trabalhar lá como narrador esportivo junto com o Ivaldo Fonseca, que eu tinha conhecido na década de 80 quando vim em Santarém participar de um curso de rádios católicas, em 1984, quando estava começando a carreira do Ivaldo, onde narramos até um jogo juntos no estádio Elinaldo Barbosa, naquele poleiro onde ficavam as cabines, que balançavam quando as torcida brigavam e a gente ficava retido lá para cima, não podíamos descer, pois só tinha uma escada. Mas era um estádio bom, que recebia o público no sábado à tarde, quando fechava o comércio e o pessoal ia assistir aos jogos. Foi uma época muito boa e áurea do futebol Santareno. Depois aconteceu a inauguração do estádio Colosso do Tapajós, narrando jogos pela Rádio Rural. Você sabe que um narrador que chega à Rádio Rural é porque tem realmente uma certa capacidade.
Jornal O Impacto: Por quanto tempo você se afastou do ar? Por que você tomou essa decisão?
Armando Carvalho: Eu entrei para a Rádio e TV Tapajós, eu nunca tinha feito televisão profissionalmente. Eu fui para a TV Tapajós e aí me deram um laboratório de uns 10 dias, e disseram: ´Olha, tu vai fazer reportagem, primeiro aquela coisa improvisada, tu vai tirar férias do fulano`. Aí eu fui tirar férias de um repórter e vi que a televisão dá muita imagem para a pessoa, é uma um veículo que expõe muito. Então, eu ficava por ali fazendo aquela reportagem, todo mundo me vendo. Você como radialista não tem muita visão do público, que conhece você mais você pela voz, já o repórter de televisão é pela imagem e aquilo que apresenta. Sempre dizem que repórter de televisão tem de ser bonito, mas nós quebramos o paradigma, não foi preciso ser bonito, foi preciso apenas ser competente. Aparecendo muito na televisão e ficando conhecido, não ficava bem para mim estar nos bares bebendo nos finais de semana. A Dona Vânia tinha sempre um cuidado com sua equipe e tem até hoje de manter aquele cuidado, do repórter se vestir bem, cabelo bem cortadinho e não dar vexame na cidade. É muito ruim, pois você como repórter representa aquela empresa. Aí resolvi parar de beber, é já fez 24 anos no mês passado.
Jornal O Impacto: Você hoje está aposentado, mas continua trabalhando na Rádio Guarany. Não dá para ficar parado, Armando?
Armando Carvalho: Não dá. Eu fiquei parado o ano de 2016 e vi que o povo dizia que sentia nossa falta. Eu até falava: ´Olha, quando eu me aposentar não vou mais passar nem perto das rádios, vou passar longe, fazer minha pescaria e tal`. Mas não aconteceu. Dá aquela saudade, aquela vontade, então, eu fiz um acordo com minha família (minha esposa e meus filhos): ´Quando vocês terminarem a faculdade eu vou me aposentar`. Eu fiz um acordo com minha mulher, que quando eu me aposentasse ela iria assumir a família, e eu ficaria com minha aposentadoria só para pescar. Deu certo, graças a Deus, e minha mulher hoje é enfermeira, meus filhos estão todos formados, então, eles comandam as despesas e eu pego minha aposentadoria para me divertir, para pescar. Mas eu não poderia fazer nada disso se não tivesse também feito um planejamento de vida, adquirido minhas coisas para me manter, um planejamento muito bem feito com a minha família. Deu tudo certo.
Jornal O Impacto: Só para terminar, como é que você vê essa nova geração no Rádio? Está muito diferente do seu tempo, onde não tinha tecnologia de ponta e nem redes sociais?
Armando Carvalho: Hoje está mais fácil de trabalhar do que naquele tempo. Eu acabei de falar que carreguei aquele gravador grande, onde você tinha de gravar muitas vezes ao vivo um comercial dentro do estúdio, não tinha transporte e você tinha muitas vezes de pegar ônibus, telefone para dar informação era no orelhão. A gente brigava muitas vezes repórter com repórter para dar o resultado do vestibular porque só tinha um orelhão. Hoje em dia o listão do vestibular você pega pela internet. Mas tem uma coisa muito interessante e muito boa, o povo hoje está interagindo mais com as equipes de reportagem, com os radialistas, locutores e comunicadores. Você fala uma coisa e o ouvinte responde logo. Se não estiver certo, ele diz e se estiver correto ele fala também, dá sua opinião. Agora tem uma coisa que eu acho que o jovem jornalista e radialista dos dias atuais deve ter mais autonomia. Eu sinto que os nossos formandos das faculdades não têm essa autonomia. A gente hoje leva um formando para um estúdio de rádio, ele não tem muita autonomia para falar, ele reza muito pela cartilha da faculdade. Nós não tivemos isso no nosso tempo. Eu defendo, para encerrar, que os repórteres, jornalistas e locutores tenham mais autonomia para falar, dispor do seu pensamento e não apenas ficar acompanhando pensamento dos outros.
Por: Jefferson Miranda
Fonte: RG 15/O Impacto