Senadores querem royalties sobre energia para elevar arrecadação no Norte; conta pode sobrar para o consumidor

Uma recém-lançada Frente Parlamentar dos Senadores dos Estados do Norte e Nordeste colocou entre seus objetivos iniciais a busca pela cobrança de royalties sobre a produção de energia elétrica como forma de aumentar a arrecadação nessas regiões, as menos desenvolvidas do Brasil.

A iniciativa mira principalmente o enorme potencial para a geração hidrelétrica no Norte, onde foram instaladas grande usinas como Belo Monte e Turucuí, e a capacidade de produção de energia eólica e solar no Nordeste, onde está a maior parte dos empreendimentos dessas fontes renováveis no país, disseram senadores à Reuters.

Mas o estabelecimento de uma taxa sobre a produção de energia deve enfrentar forte oposição de investidores, que poderiam até ir à Justiça para forçar o repasse aos consumidores de custos extras gerados com a cobrança, disseram advogados do setor.

A medida também poderia ir na contramão de promessas do governo e das expectativas dos próprios políticos, ao encarecer a energia de novos projetos e reduzir a competitividade de usinas no Norte e Nordeste frente a outras regiões nos leilões federais para contratação de novos empreendimentos, nos quais as regras priorizam a geração de menor custo por megawatt-hora.

Segundo dados da estatal Empresa de Pesquisa Energética (EPE), o Sudeste liderava a capacidade de geração no Brasil ao final de 2017, com 45 gigawatts, seguido pelo Nordeste, com 32,5 gigawatts e pelo Norte, com 28,3 gigawatts. As duas regiões corresponderam assim a quase 40% dos 157 gigawatts em potência instalada do país naquele ano.

“Norte e Nordeste hoje são exportadores de energia elétrica, e toda a tributação se dá no consumo, não na fonte, onde se produz, ao contrário dos outros produtos. Então a gente precisa ter alguma vantagem, já que somos geradores dessa riqueza. Isso foi consenso entre todos membros”, disse à Reuters o senador Rogério Carvalho (PT-SE), que propôs a criação da frente.

Questionado sobre impactos da medida sobre custos, ele disse que esse ponto está em avaliação, mas minimizou preocupações.

“Estamos atentos a isso, mas o custo de produção dessas fontes de energia é muito baixo, e tem margem. Os investimentos são importantes, vamos atrair muitos investimentos. Mas é preciso entender que as pessoas precisam comer, vestir, trabalhar, viver. E o que está acontecendo é que nessas regiões as pessoas estão só sobrevivendo”, afirmou.

O senador Weverton Rocha (PDT-MA), relator do projeto que criou a frente, disse que a intenção é estabelecer os royalties sobre “energia com um todo”, incluindo tanto as chamadas novas renováveis, como eólicas e solares, como a geração hídrica.

“Pegamos vários temas estruturantes do Nordeste, que unem todos, independente da questão partidária. Somos a maioria na Casa, com 48 senadores, então temos condições políticas de começar a defender os interesses dessas regiões”.

O projeto que consolida a criação da frente parlamentar foi publicado na semana passada no Diário Oficial da União, com assinatura do presidente da Casa, senador Davi Alcolumbre.

O texto afirma que a frente atuará por meio de medidas como “apoio a propostas legislativas”, incluindo entre suas prioridades a apresentação de projeto “que defina o pagamento, aos Estados produtores, de royalties incidentes sobre as fontes de energia”.

O texto não citou possíveis alíquotas para os royalties. Os políticos também não detalharam as intenções e disseram que o tema é agora alvo de negociações e estudos.

MEDIDA POLÊMICA

Para o especialista em energia do Demarest Advogados, Pedro Dante, os royalties iriam contra um esforço do Ministério de Minas e Energia e da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para reduzir o custo da energia, que passa pela análise de possíveis cortes em encargos e tributos nas tarifas.

“A criação de um royalty específico por geração não parece fazer muito sentido porque ao atrair projetos de energia o Estado já é beneficiado com o aquecimento da economia da região, empregos, renda. Isso iria contra esse movimento de desoneração, contra a busca da tão sonhada modicidade tarifária”, afirmou.

Para Rafael Janiques, da área de energia do ASBZ Advogados, empresas poderiam inclusive questionar na Justiça custos gerados pelos royalties, uma vez que não havia essa previsão quando investiram em suas usinas.

Ele lembrou que a Aneel já autorizou em outras ocasiões o repasse à tarifa de custos gerados pela criação ou elevação de taxas pelo governo.

“No final do dia, a Aneel reconhece isso. Essa situação é o ‘fato do príncipe’. Quando a administração pública impõe um tributo ou encargo que não estava previsto no custo dos contratos administrativos, o contrato é passível de reajuste. Então, se ao final os royalties desequilibrarem os contratos, o consumidor paga”, afirmou.

O centro de análises Instituto Acende Brasil estimou em estudo realizado com a PwC que a carga tributária e encargos sobre a energia representaram cerca de 47,7% da receita operacional bruta do setor elétrico no país em 2017.

Esses tributos já incluem a chamada Compensação Financeira pela Utilização de Recursos Hídricos (CFURH), cobrada junto a geradores hidrelétricos, que em 2018 arrecadou 1,5 bilhão de reais, segundo a Aneel. Foram arrecadados no ano passado, ainda, 946 milhões de reais em royalties sobre a produção da usina binacional de Itaipu.

Entre os Estados que poderiam ser mais impactados com os royalties estão Pará e Bahia, que lideram a capacidade instalada no Norte e Nordeste –o primeiro por conta de grandes hidrelétricas e o segundo também pela geração solar e eólica.

Fonte: O Liberal

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