Artigo – Regulamentação da Falência Individual: saída da crise econômica
Por Oswaldo Vasconcelos Bezerra*
Já somos quase 65 milhões de brasileiros endividados, segundo o SPC. Brasileiros que não conseguem pagar nem conta de água, luz e cartão de crédito. Um em cada 3 idosos, com mais de 65 anos, faliu. Somos 13 milhões de desempregados e, mais alguns milhões de desalentados. Bancos retornaram 70 mil imóveis de cidadãos que não pagaram suas prestações.
O governo federal criou algumas ações para recuperação econômica e, o Brasil fugir da crise, mas sem grande efeito até agora. A economia está travada. Sem compradores, o comércio vai quebrar. Sem comércio, as indústrias fecham. Sem as indústrias e comércios os empregos escasseiam e, a média salarial diminui. As pessoas passam a comprar menos no comércio. É um efeito dominó que se retroalimenta.
Alguns países estancam o efeito dominó de várias formas. Uma delas é através da Legislação da Falência Individual. Esta Legislação é bem definida em países como os Estados Unidos, Canadá e Israel. O conceito no Canadá é que um indivíduo entrega tudo o que possui a um administrador em falência, em troca da eliminação de suas dívidas não seguras. Contudo, tem permissão para isentar algumas propriedades. Em Israel a falência pessoal é regida pela Portaria de Falências de 1980. Os devedores e seus credores podem solicitar ao tribunal a falência. Desde 1996, a lei de falência pessoal israelense mudou para um regime relativamente favorável aos devedores, bem parecida ao modelo americano.
A mais avançada Legislação de Falência Individual é a dos Estados Unidos. Ela é feita para dar suporte ao chamado “sonho americano”, onde todos tem a chance de progredir economicamente, quebrar e, começar de novo. Lá os mesmos capítulos do Código de Falências são aplicados para falências pessoais e corporativas. A maioria das pessoas que declaram falência, principalmente, o faz sob os Capítulos 13, 7 e 11 deste Código, que correspondem a reorganização financeira ou liquidação definitiva de dívidas.
O cidadão pode considerar a declaração de falência quando ele ou ela é incapaz de pagar toda a sua dívida, ou uma ação civil foi movida contra ele, ou seus salários estão sendo bloqueados. O não pagamento da dívida do cartão de crédito ou, uma ação pendente, afetará muito o histórico de crédito de uma pessoa. O processo de falência pode ser a única defesa que uma pessoa tem, em um processo por dívidas não pagas e, vai proporcionar um novo começo financeiro.
Os indivíduos, através de um advogado, recorrem a Lei de Falência quando receberem muitos telefonemas de credores, ou recebem uma intimação e uma queixa civil por falta de pagamento de uma dívida, seu carro é retomado ou, seus salários entrem em processo de bloqueio por ordem judicial. A apresentação de uma petição de falência no capítulo 7 pode impedir que isso aconteça. Até pessoas ilegais nos EUA podem pedir falência.
A menos que haja litígios envolvendo objeções à quitação, o devedor geralmente receberá, automaticamente, total quitação. O Regulamento Federal de Procedimento de Falência estipula que o escrivão, do tribunal de falências, envie uma cópia da ordem de quitação a todos os credores, ao administrador dos EUA, ao mandatário do caso e ao advogado do mandatário, se houver. O devedor e o advogado do devedor também recebem cópias da ordem de quitação.
A notificação é uma cópia da ordem final de quitação. A notificação informa aos credores, em geral, que as dívidas que lhes foram devidas foram quitadas. Não devem estes tentar qualquer cobrança adicional. Eles são alertados no aviso de que esforços contínuos de coleta podem sujeitá-los a punição penal. Qualquer falha inadvertida, por parte do funcionário, de enviar ao devedor ou, a qualquer credor uma cópia da ordem de quitação, prontamente, dentro do tempo exigido pelas regras, não afeta a validade da ordem de concessão da quitação.
O devedor não tem direito absoluto de quitação. Uma objeção à quitação do devedor pode ser feita por um credor, pelo administrador do caso, ou pelo administrador federal. Os credores recebem uma notificação logo após o registro do caso, que apresenta informações, incluindo o prazo para contestar a quitação. Para se opor à quitação do devedor, um credor deve apresentar uma queixa no tribunal de falências, antes do prazo estabelecido no aviso. Após seis anos todo histórico da dívida é apagado do sistema financeiro.
Há restrições de quitação para a dívida estudantil, pagamento de pensão alimentícia e, impostos. O tribunal pode revogar a quitação em determinadas circunstâncias, no caso do capítulo 7 (falência individual), com base em alegações de que o devedor obteve a quitação de forma fraudulenta
O tribunal também negará a quitação, em um processo apresentado, dentro de oito anos antes da segunda petição ser apresentada. O tribunal também negará a quitação ao capítulo 7 se o devedor tiver recebido quitação, anteriormente, em um caso do capítulo 12 ou capítulo 13, apresentado dentro de seis anos antes da data do arquivamento do segundo caso. Um devedor é inelegível para a quitação sob o capítulo 13 se ele ou ela recebeu uma dispensa prévia em um caso de capítulos 7, 11 ou 12, apresentado quatro anos antes do presente caso ou, em um caso do capítulo 13, apresentados dois anos antes do presente caso.
Um devedor que recebeu uma quitação pode reembolsar voluntariamente qualquer dívida desta quitação. Um devedor pode pagar, uma dívida de quitação, mesmo que ela não possa mais ser legalmente aplicada.
A quitação constitui uma medida legal permanente que proíbe os credores de tomar qualquer medida, incluindo a de uma ação judicial, destinada a cobrar uma dívida exonerada. Um credor pode ser sancionado pelo tribunal por violação legal se assim o fizer. A sanção normal por violação é punível com multa. Para o governo americano, crédito é um risco que as instituições assumem quando emprestam.
A Lei prevê proibições expressas contra o tratamento discriminatório de devedores por ambas as unidades governamentais e privadas. A lei proíbe as seguintes formas de discriminação governamental: rescindir um empregado; discriminar com relação à contratação; ou negar, revogar, suspender ou recusar renovar uma licença, franquia ou privilégio semelhante. Um empregador privado não pode discriminar, em relação ao emprego, se a discriminação é baseada exclusivamente no pedido de falência.
Por outro lado os EUA também possuem várias empresas estatais ligadas ao sistema financeiro para equilibrar sua Economia. São exemplos a Fannie Mae e a Freddie Mac, no setor de hipotecas. A Farm Credit System que é um sistema de crédito que injeta 191 bilhões no setor agrícola por ano. A Export-Import Bank of United States que é uma agência que subsidia exportações. Na verdade, todos integrantes do G8, nações mais ricas do mundo, se tornaram adeptas do novo capitalismo de Estado. Em 2008, Barack Obama injetou capital estatal na ordem de US$ 2 trilhões no sistema financeiro americano. Na Europa, o socorro público colocou centenas de bilhões de euros na economia.
Voltando a realidade do Brasil, o cidadão aqui é desamparado em termos de Legislação de Falência Individual. Após tentativas fracassadas de acordos amigáveis com credores, para parcelar ou, mesmo diminuírem cobranças exorbitantes de juros, a pessoa física só tem a opção legal de pedir a declaração da insolvência civil, que é a falência da pessoa física. Não existe ainda, para o indivíduo comum, um instrumento jurídico tal como a recuperação judicial criada para as empresas.
O processo judicial de insolvência civil pode durar até dez anos, ou mais. Os bens do devedor, tanto os presentes como os adquiridos durante o processo, têm de ser vendidos e os recursos alcançados com a venda tem que ser repassados aos credores. Após esta etapa, o cidadão é declarado insolvente. Após cinco anos da declaração de insolvência, o saldo remanescente do débito em aberto é considerado extinto e o devedor poderá voltar à ativa. Não é um processo simplificado. E é muito demorado. É uma medida radical que o devedor utiliza para recomeçar a sua vida financeira.
Uma medida prevista no Projeto de Lei 1.922/11, do deputado Fábio Faria, arquivada na Câmara em 2019, era uma proposta de Lei de Falência Individual, complexa, só serviria para os mais ricos. Os indivíduos de baixa renda, muito endividados, não teriam condições de arcar com os custos envolvidos no processo de recuperação judicial, por este Projeto de Lei.
O cidadão que pede a insolvência civil, se torna um peso morto para o país e para a economia. Não gera empregos, não incrementa a arrecadação, não produz riquezas e nem ajuda a comunidade onde vive. No Brasil, o cidadão comum não tem uma segunda chance como os quase 1,5 milhões de cidadãos americanos que todo ano, por exemplo, conseguiram aproveitar com sucesso o recomeço financeiro. Desse modo o cidadão pode reerguer sua autoestima e bem-estar, assim taxas de suicídios por dívidas despencam. Patrimônios de cidadãos que, foram obtidos com muito suor, deixam de ser perdidos. Por fim, pode nos tirar desta terrível crise econômica.
* É Geólogo pela UFPA e Mestre em “Administração e Política” pela UNICAMP.
RG 15 / O Impacto