Investigações na Cerpasa podem revelar outros crimes, aponta delegado geral
O delegado geral Alberto Teixeira, da Polícia Civil do Estado do Pará, disse que a investigação na Cervejaria Paraense S.A. (Cerpasa) ainda não acabou. Com o cumprimento de mandados de busca e apreensão, na sede da empresa, nesta quarta-feira (19), será possível comprovar suspeitas de crimes de lavagem de dinheiro. Também há possibilidade de encontrar outros crimes e elos com investigações mais antigas.
As declarações do delegado geral foram feitas, na tarde desta quarta-feira, em entrevista coletiva. A operação foi uma demanda do Ministério Público do Estado do Pará (MPPA). A Secretaria de Estado de Fazenda (Sefa) aplicou três autos de infração à Cerpasa, entre os anos de 2016 e 2019. Os valores estão mantidos sob sigilo no inquérito policial. Alberto Teixeira apenas reiterou, várias vezes, que a empresa é uma das maiores devedoras de impostos do Pará.
São mais de R$ 2 bilhões em dívidas, inscritas na dívida ativa do Estado, reforçou Alberto Teixeira. Até 2018, a dívida à União era superior a R$ 1 bilhão. Essas dívidas já foram comprovadas em autos de infração anteriores, aplicados pela Sefa. O MPPA aponta que há mais de 50 crimes comprovados, em 18 autos de infração entre 2007 e 2018. O rombo fiscal só foi descoberto em 2007 e já vinha sendo acompanhado pelo MPPA desde então, com os chamados “Caso Cerpasa I” e “Caso Cerpasa II”.
A operação desta quarta-feira foi intitulada “Pilsen Premium” (em alusão aos tipos de cervejas produzidas pela empresa). Contou com 33 policiais civis, 9 peritos criminais do Centro de Perícias Científicas Renato Chaves, 3 representantes da Procuradoria Geral do Estado (PGE) e mais 4 técnicos do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro).
Teixeira explicou que a presença do Inmetro foi para analisar equipamentos fiscais. Isso porque já que operação fazia busca e apreensão, cabia analisar todas os atos ilícitos possíveis, incluindo fraude de envase e emissão de notas. Foram ao menos cinco meses de investigações até a operação ser deflagrada. O delegado geral não fez qualquer menção aos crimes antigos já acompanhados pelo MPPA, do “Caso Cerpasa I” e “Caso Cerpasa II”.
Para o delegado geral, as investigações são importantes porque poderão resultar na recuperação dos recursos, que são do Estado e deveriam ser transformados em benefícios e políticas públicas para a sociedade paraense.
Entenda os casos Cerpasa I e Cerpasa II
O promotor de Justiça Francisco Lauzid, da Promotoria de Crimes Contra a Ordem Tributária, em entrevista ao jornal O Liberal, explicou como ocorreram o “Caso Cerpasa I” e o “Caso Cerpasa II”. Os 18 autos de infração configuraram um crime continuado, que é quando um crime se repete, com os mesmos padrões, em até 30 dias. Foram 18 ações penais. Uma pelo crime de formação de quadrilha. Os outros 17 processos contra a Cerpasa, por mais de 50 crimes contra os cofres públicos paraenses, se tornaram quatro ações.
Lauzid explicou que, na década de 1990, a Cerpasa se tornou uma das principais colaboradoras financeiras do PSDB. Primeiro com Almir Gabriel. O ex-governador perdoou uma dívida de R$ 47 milhões da empresa em 2001. Em troca, R$ 4 milhões foram destinados à campanha de Simão Jatene, que vinha como sucessor.
Em 2002, foi aprovada a lei estadual nº 6.489 que dava ao Governo do Estado o poder de conceder remissão, anistia, transação moratória ou doação em pagamento de bem imóvel para quitação de débitos.
Em 2003, Simão Jatene assumiu o cargo de governador. No primeiro ano de gestão, emitiu um decreto, que dava um desconto de 95% no ICMS da cervejaria. A operação é chamada de crédito presumido. A dívida perdoada foi de quase R$ 83 milhões. Mais R$ 12,5 milhões foram dados em contrapartida pela Cerpasa ao Governo do Estado, que foram considerados propina e deram início às investigações, que configuram o “Caso Cerpasa I”.
A lei 6.489/2002 foi considerada inconstitucional pelo Superior Tribunal Federal (STF) em 2005. Mas o decreto do governador seguiu em vigor e a Cerpasa continuou pagando apenas 5% do que deveria das dívidas de ICMS. Lauzid reforça que esse tipo de operação é ilegal para ser feita a partir de um decreto do governador. Ainda que fosse por lei estadual, continuaria sendo irregular e inconstitucional.
Só em 2007, quando Ana Júlia Carepa foi eleita governadora, o rombo fiscal da Cerpasa foi descoberto. Ela revogou o decreto de Jatene. Foi aí que a Secretaria de Estado da Fazenda (Sefa) foi atrás para cobrar todos os impostos devidos. Em 2008, foram emitidos 18 autos de infração. A Cerpasa recorreu à justiça para reaver o benefício do crédito presumido e conseguiu. O Estado recorreu e aguarda resposta.
Além de não pagar nenhuma das multas, a cervejaria continuou usufruindo o crédito presumido. Só que a partir da decisão judicial, nem mais regularidade nos pagamentos existe. “A empresa até hoje, quando paga, se pagar, é só 5% do que deve em ICMS”, diz o promotor. Foi o início do Caso Cerpasa II.
Por muitos anos, o que a Cerpa declarava como faturamento nem dava para cobrir os juros da dívida. Foi necessária a aplicação de penhora aos rendimentos e patrimônios da empresa.
Fonte: O Liberal