Governo impôs sistema que inviabiliza a fiscalização do desmatamento, diz MP

Fiscais ambientais são impedidos de fazer hora extra e MPF vai à Justiça para proibir sistema de controle de ponto

 Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública contra o novo sistema de controle de frequência imposto aos fiscais do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) que, na prática, inviabiliza a fiscalização ambiental. Sistema criado pelo Ministério do Planejamento em 2018 foi adotado no Ibama em dezembro de 2019 e, para o MPF, é incompatível com a natureza das funções da autarquia ambiental.

“O atendimento de ocorrências de ilícitos ambientais não necessariamente ocorre durante o horário regular de trabalho e, em casos complexos, o cumprimento de diligências demanda horas contínuas muito superiores aos limites estabelecidos pela nova norma”, diz o MPF na ação iniciada na Justiça Federal em Belém, que pede a suspensão do novo sistema novo, batizado de Sisref (Sistema de Registro de Frequência) e o retorno ao sistema anterior de controle do ponto dos fiscais, que respeitava as peculiaridades do trabalho de fiscalização ambiental.

O MPF narra na ação casos concretos documentados de atividades de fiscalização prejudicadas pela adoção do novo sistema. Em maio passado, por exemplo, servidores do Ibama que participavam de operação de combate ao desmatamento em conjunto com as Forças Armadas, na rodovia Transamazônica, entre os municípios de Brasil Novo e Uruará, foram proibidos de acompanhar formação de uma barreira rodoviária que funcionaria durante a madrugada, período em que se intensifica o trânsito de caminhões carregados de árvores derrubadas ilegalmente.

A fiscalização ocorreria entre as 20h do dia 21 de maio de 2020 e se estenderia até às 5h do dia 22, mas a coordenação de fiscalização impediu a participação dos fiscais do Ibama, porque de acordo com o novo sistema de controle de frequência, eles são proibidos de fazer mais do que duas horas diárias fora do horário regular de trabalho. O MPF destaca que, sem a participação dos fiscais civis, a atuação das forças armadas se torna ineficaz, porque os militares não tem atribuição legal para autuar e multar criminosos ambientais.

“O emprego das Forças Armadas, com amparo em decreto de Garantia da Lei e da Ordem, é insuficiente no combate a infrações ambientais, uma vez que militares não detêm atribuição para a lavratura de autos de infração. Em conjunto com outros fatores, a imposição do novo sistema de controle eletrônico de frequência no âmbito do Ibama cria um quadro de proteção insuficiente do direito fundamental ao meio ambiente”, diz a ação judicial.

O próprio Ibama reconhece o prejuízo provocado pelo novo sistema de controle de frequência. Em 15 de janeiro de 2020, o presidente do Instituto enviou ofício ao secretário de gestão e desempenho de pessoal do Ministério da Economia, apresentando estudo que mostrava a dificuldade de compatibilizar o Sisref com as atividades de fiscalização ambiental, mas também para trabalhos ligados ao licenciamento ambiental, que muitas vezes exigem viagens de campo. Não se tem notícia de resposta do ministério.

O próprio MPF já havia recomendado ao Ibama a suspensão do sistema de controle de ponto, após a suspensão de uma fiscalização contra pesca ilegal no Rio Grande do Sul. Não houve resposta. Agora, a Justiça pode obrigar o restabelecimento da sistemática anterior de cômputo e compensação de horas extras trabalhadas, que tem amparo legal e assegura a continuidade do combate aos crimes ambientais.

JUSTIÇA ORDENA QUE PEDIDOS DE MINERAÇÃO EM TERRAS INDÍGENAS NO OESTE DO PARÁ SEJAM REJEITADOS

A Justiça Federal obrigou a Agência Nacional de Mineração (ANM) a negar atendimento aos pedidos de abertura de processos de pesquisa ou exploração minerária em terras indígenas da região de Santarém, no oeste do Pará.

Proferida nesta terça-feira (11) pelo juiz federal Felipe Gontijo Lopes, a decisão liminar (urgente) acata pedidos do Ministério Público Federal (MPF).

A decisão estabeleceu prazo de 30 dias para a análise e o indeferimento imediato de todos os requerimentos minerários existentes que sejam totalmente incidentes em terras indígenas homologadas ou delimitadas e identificadas. Em relação aos requerimentos de pesquisa ou exploração de áreas que incidam apenas parcialmente em terras indígenas, esses processos também têm que ser analisados no prazo de 30 dias corridos.

Nesses casos, na análise deve ser delimitada a área incidente sobre o território indígena, e o requerente deve ser comunicado para que, em até 60 dias corridos, faça a retificação da área. Apresentada a retificação, a ANM tem 30 dias corridos para fazer nova análise do pedido, que deve ser indeferido se ainda houver parcelas sobrepostas às terras indígenas.

Também foi determinado que a ANM deve adotar esses mesmos critérios na análise de todos os futuros requerimentos minerários que incidam total ou parcialmente sobre terras indígenas homologadas ou delimitadas e identificadas da região de Santarém.

Necessidade de cumprimento da lei – Na ação o MPF registrou que a Constituição e as leis estabelecem que qualquer medida administrativa que possa levar à autorização da atividade minerária em terras indígenas só pode ser tomada depois que houver oitiva constitucional das comunidades sobre o decreto legislativo autorizador, autorização do Congresso Nacional, consulta prévia, livre e informada às comunidades relativa à autorização administrativa, e regulamentação legal.

De acordo com manifestação da ANM ao MPF, a agência considera que a falta de lei regulamentadora não impede que os processos minerários sejam sobrestados, ou seja, abertos e colocados em espera.

Para o MPF, no entanto, o simples registro, cadastramento e sobrestamento desses processos – ainda que não deferidos ou mesmo apreciados – contraria a Constituição Federal e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que é lei no Brasil e garante o direito à consulta prévia, livre e informada.

Sobre esse tema, o juiz federal Felipe Gontijo Lopes registrou na decisão o seguinte: “Obviamente, como a realidade mostra, sendo inclusive objeto de ação penal em curso neste juízo (Ação Penal n. 274-34.2017.4.01.3902 [trata de garimpo ilegal situado no entorno da Terra Indígena Zo’é, em zona intangível de proteção integral], estes requerimentos de pesquisa minerária e permissão de lavra, mesmo não deferidos, trazem evidente turbação e intranquilidade aos indígenas, já que são usados como instrumento para a ‘aparente’ legalidade da exploração”. (Com informações do MPF).

RG 15 / O Impacto

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