Compensação tributária: a inconstitucionalidade da multa isolada
Um ano após o voto do ministro relator Edson Fachin no RE 796.939, em abril do ano passado, os contribuintes continuam aguardando uma definição do Supremo Tribunal Federal sobre a inconstitucionalidade da multa prevista no artigo 74, §§15 e 17, da Lei 9.430/96 para casos de indeferimento dos pedidos de ressarcimento e de não homologação das declarações de compensação (DComp) de créditos perante a Receita Federal (RFB). A cobrança da multa isolada de 50% sobre o valor do débito objeto da DComp é analisada no julgamento do referido RE, com repercussão geral reconhecida, em conjunto com a ADI 4905.
A compensação tributária está prevista nos artigos 156, II, 170 e 170-A do Código Tributário Nacional (CTN) e é um instituto destinado à extinção do crédito, sob condição resolutória da ulterior homologação do procedimento. A compensação consiste no encontro de contas entre os recíprocos débito e crédito da Fazenda e do contribuinte.
Após habilitado o crédito conforme a IN RFB 1717/17, a compensação tributária é realizada pelo próprio contribuinte junto à autoridade administrativa competente. O prazo da homologação é de cinco anos a partir da DComp ou, caso ocorra retificação, a partir da retificadora.
O contribuinte imbuído de boa-fé compensa o seu crédito conforme artigo 74, §1º, da Lei 9.430/96, que determina que a compensação será efetuada mediante a entrega, pelo sujeito passivo, de declaração na qual constarão informações relativas aos créditos utilizados e aos respectivos débitos compensados.
Ocorre que a Receita, ao analisar a DComp, pode não homologar utilizando critérios subjetivos. Quando a RFB não homologa a compensação, automaticamente é aplicada uma multa isolada de 50% sobre o débito, conforme estabelecido no §17 do artigo 74 da Lei 9.430/96.
Até então, em casos de não homologação, o contribuinte apenas recebia despacho decisório indeferindo a compensação com a cobrança adicional de juros e multa moratória limitada a 20%. Com o advento do mencionado §17 do artigo 74 da Lei 9.430/96 (com redação dada pela Lei nº 13.097 de 2015), a multa isolada de 50% pune duplamente o contribuinte, afrontando claramente os princípios do não confisco, da razoabilidade e da proporcionalidade.
A controvérsia será julgada no RE 796.939/RS, de relatoria do ministro Edson Fachin, que conta com parecer da Procuradoria-Geral da República opinando pela inconstitucionalidade da norma por afronta ao artigo 5º, XXXIV, alínea “a”, da Constituição, que assegura o direito de petição.
Ora, o contribuinte de boa-fé não pode ser lesado por apenas exercer o seu direito de petição. O questionado parágrafo 17 contém normas punitivas contra o contribuinte que age de boa-fé. Trata-se de “multa pela simples conduta lícita do contribuinte, dentro dos limites do regular exercício do seu direito, quando o seu pedido de ressarcimento ou de compensação vier a ser indeferido administrativamente” [1], conforme argumento da Confederação Nacional das Indústrias (CNI) em sua contestação na ADI 4965, de relatoria do ministro Gilmar Mendes. A imposição da multa violaria o direito fundamental de petição aos poderes públicos (artigo 5º, inciso XXXIV, letra a, da Constituição Federal-CF); o direito ao contraditório e à ampla defesa (artigo 5º, inciso LV da CF); a vedação da utilização de tributos com efeito de confisco (artigo 150, inciso IV, da CF); e os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
No julgamento do RE 796.939, em abril passado, o ministro Edson Fachin (relator) que negou provimento ao recurso e fixou a tese (Tema 736 da repercussão geral): “É inconstitucional a multa isolada prevista em lei para incidir diante da mera negativa de homologação de compensação tributária por não consistir em ato ilícito com aptidão para propiciar automática penalidade pecuniária”. Em seguida, o ministro Gilmar Mendes pediu vista. Houve inclusão em pauta para julgamento no dia 10 de dezembro passado, porém, foi retirado de pauta e por ora não há previsão de nova data para julgamento.
A jurisprudência consolidada no âmbito dos Tribunais Regionais Federais da 3ª e da 4ª Região — neste último, respaldada inclusive por pronunciamento de sua Corte Especial — aponta para a inconstitucionalidade da multa em apreço, desde que ausente dolo ou fraude.
Espera-se que o julgamento do STF siga o mesmo caminho, quando retomado. Afinal, busca-se garantir a prevalência da norma constitucional e seus princípios basilares, não podendo uma norma infraconstitucional se opor de forma tão evidente em prejuízo dos contribuintes.
Fonte: Revista Consultor Jurídico