Processos contra o INSS que precisam de perícia estão parando por falta de dinheiro
Os processos judiciais da área previdenciária começaram a parar no dia 23 de setembro por falta de recursos para pagar as perícias médicas. O alerta é do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP). O Supremo Tribunal Federal (STF), por 6 votos a 4, derrubou a cobrança de honorário médico pericial de trabalhador com acesso à Justiça gratuita, pois entendem que trecho da reforma trabalhista viola a Constituição.
Para a presidente do IBDP, Adriane Bramante, essa decisão impacta diretamente o projeto de lei que dispõe sobre recursos para o pagamento das perícias médicas em processos em que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) seja parte, pois declara inconstitucional a regra que está sendo proposta pelo governo.
Quando as perícias médicas do INSS, responsáveis por mais de 50% da judicialização contra o órgão, são indeferidas na via administrativa, na maioria dos casos vão parar na esfera judicial para que possa ser reavaliada a existência ou não da incapacidade para o trabalho. Para isso o juiz determina que nova perícia realizada por perito de confiança do juízo.
A maior parte das ações reconhecem o direito e ordenam ao INSS a concessão do benefício. A lei que garante o pagamento para os médicos peritos federais venceu em setembro de 2021, e não há recursos para manter o pagamento pelo Poder Judiciário.
Limbo jurídico
Segundo o IBDP, entre as consequências da demora na realização das perícias estão os casos de limbo jurídico previdenciário/trabalhista, que é o período em que o segurado fica sem receber do INSS, pois entende que não há incapacidade para o trabalho; e do empregador, que, diante de um relatório médico que atesta pela continuidade da incapacidade, não permite que o empregado retorne ao trabalho, sob pena de responder judicialmente em caso de acidente ou danos ao trabalhador no interior da empresa.
A ação judicial, segundo o IBDP, tem como objetivo discutir se há ou não condições do retorno deste segurado ao trabalho. Quanto mais demorar a perícia, mas aflito fica o segurado, pois neste momento, está sem qualquer renda ou benefício.
De acordo com dados do INSS, recebidos pelo IBDP, há 597 mil pessoas que aguardam perícia médica no Brasil. Desse total, boa parte ingressará com ações na Justiça, avalia o instituto.
Adriane comenta ainda que hoje as perícias médicas federais judiciais tem sido a única saída, quando os segurados não conseguem o atendimento ou o deferimento do benefício pela via administrativa.
— O ideal seria uma ação conjunta para que pudéssemos chegar a alguma solução que seja adequada e equilibrada nesse momento já tão fragilizado — explica.
PL 3.914
O Projeto de Lei 3.914/2020, de autoria do deputado Hiran Gonçalves, que inicialmente apenas retirava o prazo de 2 anos da Lei 13.876/2019 da obrigação de o Poder Executivo arcar com a despesa de perícia médica judicial, já foi aprovado na Câmara. Emendado, a pedido do Ministério da Economia, pelo deputado Darci de Matos para que fosse imputado à parte autora do processo judicial, o pagamento da perícia, nos casos em que a renda familiar estiver acima de 3 salários mínimos ou renda per capta de até meio salário-mínimo, como forma de reduzir a judicialização contra o INSS.
Essa mesma proposta foi apresentada pela Câmara no Projeto de Lei de Conversão da Medida Provisória n° 1045/2021, rejeitada dia 01.09.2021, na íntegra pelo Senado. Naquela casa, o relator da MP, senador Confúcio Moura, atendendo a vários requerimentos de Senadores, já havia excluído a obrigação de a parte no processo judicial de pagar com as custas, mesmo quando protegida pela Justiça gratuita.
O texto do PL 3.914/2020 está para ser votado no Senado, mas ainda sem data definida. O relator, senador Carlos Heinze, abriu mão da relatoria no dia 20. Enquanto isso não há orçamento para pagamento das perícias federais.
Em nota, o IBDP diz entender que “a judicialização deve ser reduzida com medidas inteligentes, justas e equilibradas, não por meio de medidas que evitem que o cidadão ingresse com uma ação judicial”.
Segundo o instituto, uma melhor formação do processo administrativo e da via recursal de benefícios por incapacidade, aliado à proteção jurídica dos peritos médicos federais, são critérios que podem colaborar para a redução de indeferimentos equivocados e, em especial, da judicialização desnecessária.
De acordo com Adriane, “para uma pessoa que não recebe nada mensalmente e ainda considerando o cenário de grave crise econômica atual, com elevadas taxas de desemprego e crescente aumento do preço da cesta básica, estes valores praticamente impedirão a pessoa de ingressar com ação”.
— Não é cobrando do autor a perícia que se reduzirá a judicialização, mas com políticas que valorizem a cidadania, a educação previdenciária, e, em especial, que garantam efetividade e segurança jurídica ao processo administrativo — finaliza Adriane.