Laudo requer salvamento de sítio arqueológico e pede que Camelódromo seja realocado

A 13ª Promotoria de Justiça de Santarém ajuizou nesta segunda-feira, 31/01, manifestação em Ação Civil Pública requerendo a manutenção da liminar que suspendeu as obras do shopping popular (“Camelódromo”) na praça Rodrigues dos Santos, no centro da cidade. No dia 4 de janeiro a prefeitura iniciou as obras e retirou as árvores do local, sem a realização de estudos de impacto, além da ausência de consulta do projeto com a população interessada. A praça é um dos patrimônios históricos e arquitetônicos mais relevantes do município, e de acordo com laudo da Universidade Federal do Pará (Ufopa), foram localizados vestígios de cerâmica indígena no local, e houve danos ao sítio arqueológico Aldeia, onde está assentada a praça.

A titular da 13ª Promotoria do Meio Ambiente e Patrimônio Cultural de Santarém, Lilian Braga, ingressou com a ACP no dia 6 e obteve a liminar no dia 10 de janeiro de 2022, sendo determinado pelo Juízo da 6ª Vara Cível que o MPPA apresentasse informações sobre a atual situação da praça. Para fundamentar a manifestação, foram realizadas reuniões com representantes do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós (IHGTap) e dos cursos de Antropologia, História, Arqueologia e Geografia da Ufopa.

Cinco especialistas da Ufopa emitiram Laudo do Estado de Conservação e Impactos sobre o Sítio Arqueológico Aldeia na área da Praça Rodrigues dos Santos, com análise técnica preliminar dos impactos ao patrimônio arqueológico e histórico-cultural de Santarém localizado na praça, que sofreu intervenções com maquinário pesado, além da derrubada de árvores. O sítio Aldeia foi registrado no Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos (CNSA) pela arqueóloga Denise Cavalcante Gomes (Museu Nacional da UFRJ), em 2008.

O laudo destaca que, devido à história registrada no local, não são incomuns relatos de moradores afirmando que na área e arredores, mesmo com alto índice de urbanização, continuam ocorrendo achados de vestígios cerâmicos e líticos em meio a profundos pacotes de solo de terra preta. De acordo com as pesquisas preliminares realizadas no local, verificou-se a existência de cerâmicas arqueológicas que, provavelmente, foram produzidas pelos indígenas Tapajó.

                         

Descrição da imagem. Foto colorida de pedaço de cerâmica com traços indígenas, encontrada no local no dia 13 de janeiro. 

Também foram retirados trechos do piso de asfalto, e do solo arqueológico do sítio, que foram  colocados em caminhões e descartados em local não sabido. No mesmo dia do início das obras foram identificados materiais arqueológicos em meio ao solo escuro e aos entulhos gerados pela demolição. No dia seguinte, foram fotografados dois fragmentos ósseos e cerâmicos, apontados com características de mamífero grande e com grande probabilidade de ser humano.

Além desses materiais, em vistoria realizada no dia 13 de janeiro, foram identificados outros objetos, cujos pontos foram marcados em mapa, um total de oito concentrações ao longo da praça.  Os vestígios de interesse estavam em meio aos escombros do muro e do calçamento, concreto, rochas para arrimo e materiais de construção, como telhas, tubos hidráulicos de cerâmica e tijolos. Foram identificados diferentes materiais de origem indígena pré-colonial e histórica, assim de materiais históricos de produção não-indígena associados ao período colonial e posteriores.

                           

Descrição da imagem: Fotografia de satélite da praça, com oito marcações identificadas como “concentração de cerâmica”

Nesta área de concentração arqueológica, os pesquisadores conseguiram identificar um pacote arqueológico de solo escuro exposto com 35 cm. Portanto, afirma o MPPA, “pode-se dizer que o sítio arqueológico Aldeia foi impactado em toda a extensão da ação das máquinas da prefeitura, pois em todos os lugares foram evidenciados materiais arqueológicos, sejam pré-coloniais ou históricos”.  O relatório traz uma observação sobre um marco histórico, que por enquanto foi preservado: o Marco do Brasil 500 anos, um tronco de madeira esculpido com dizeres e grafismo, erigido em abril de 2020 na praça, por pessoas do movimento indígena do Baixo Tapajós.

O relatório aponta que a atual avaliação dos danos é um estudo preliminar, pois não é mais possível averiguar o volume de sedimentos e quantidade de vestígios removidos pela obra. Na parte que foi exposta, o sítio sofreu danos em termos horizontais, que já vem ocorrendo historicamente, desde os anos 70, mas que foram visivelmente amplificados nesse episódio. “No geral, percebe-se que o sítio se encontra altamente degradado, considerando-se o impacto significativo das retroescavadeiras que perturbaram, revolveram e, eventualmente, removeram as camadas superiores de Terra Preta contendo vestígios”.

Por fim, os autores do laudo apresentaram algumas recomendações, incluindo o isolamento da área que tem material arqueológico exposto; o salvamento emergencial do trecho do sítio Aldeia, exposto pela obra, independente do prosseguimento ou não do processo de licenciamento ambiental; que a instalação do Shopping Popular seja feita em outra área da cidade, e caso a realocação do projeto não seja feita, o processo deve passar por procedimentos administrativos do licenciamento ambiental, sendo um deles o trâmite junto ao IPHAN, de acordo com a IN 01/2015, e que a prefeitura tenha em suas políticas culturais, ações específicas para preservação, pesquisa e divulgação do patrimônio arqueológico, considerando a exposição relevância dos sítios da cidade.

Por todos os motivos apresentados, a promotoria requereu ao Juízo a manutenção da liminar que determina a paralisação da obra.

RG 15 / O Impacto com informações do MPPA

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