Ato do Ibama pode deixar prescrever 42 mil multas
O Instituto de Direito Coletivo (IDC) deu entrada em uma Ação Civil Pública (ACP), com pedido de liminar, requerendo a imediata suspensão dos efeitos de medida adotada pelo atual presidente do Ibama, Eduardo Fortunato Bim. De acordo com a ação, o ato da presidência do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, que ampliou as prescrições de multas aplicadas a infratores ambientais, “tem nefastos efeitos em relação ao enfraquecimento do poder coercitivo do Ibama”.
“A cada dia, mais e mais processos sancionadores serão atingidos, indevidamente, pela prescrição, com base em despacho francamente ilegal e constitucional”, diz a ação, assinada pela presidente do Instituto de Direito Coletivo, a advogada Tatiana Bastos e pelo advogado Bruno Campos.
Para o IDC, o ato assinado por Eduardo Bim tem o potencial de causar a prescrição de mais de 42 mil processos lavrados entre 2008 e 2019. São cerca de 60% do total de processos do órgão no período. A medida impossibilita a cobrança de bilhões de reais em multas por crimes como desmatamento, tráfico de animais, exploração ilegal de madeira e invasão de unidades de conservação.
A ação, impetrada na Justiça Federal do Amazonas, na noite de quinta-feira (15), foi distribuída para a 7ª Vara Federal Ambiental e Agrária da SJAM. Em março de 2022, o presidente do Ibama assinou um despacho que resultou na anulação de todas as intimações realizadas por edital para apresentação de alegações finais e alterou um entendimento da Procuradoria Federal Especializada, junto ao Ibama, sobre os atos capazes de interromper a prescrição intercorrente no âmbito de processos sancionadores ambientais.
O IDC pede que a Justiça conceda uma liminar para a suspensão imediata do despacho de Bim. E, no mérito, que o ato seja anulado, assim como todas as declarações de prescrição de multas baseadas na decisão tomada pelo presidente do Ibama. Se a Justiça entender que a medida não é necessária, o instituto pede que o despacho, de março de 2022, não tenha efeito retroativo.
As prescrições de multas ambientais, em razão de atos da atual presidência do Ibama, estão entre as preocupações do grupo de transição que trata do meio ambiente do governo de Luiz Inácio Lula da Silva. A recomendação é que essas prescrições sejam quantificadas e que os atos do ainda presidente do Ibama sejam revistos e derrubados.
Com as anulações, que têm efeito retroativo, Fortunato Bim possibilitou a prescrição intercorrente dos processos – por inércia do agente público – mesmo sem a paralisação de fato dessas apurações. O ato, segundo o IDC, contraria dispositivos legais e princípios da Constituição Federal e tem como graves consequências a concessão de salvo-conduto e incentivo a crimes, reduzindo drasticamente a capacidade punitiva, pedagógica e dissuasória do órgão ambiental brasileiro.
O texto da ACP destaca ainda o fato de ter sido monocrática a decisão de Fortunato, afastando a aplicação de um decreto presidencial (6.514/2008) e levando ao “inacreditável desperdício de todo o trabalho dos servidores do IBAMA ao longo de todos esses anos, de gigantesco impacto orçamentário e incalculável perda ambiental”.
A advogada Tatiana Bastos explica não haver dúvidas de que o despacho viola valores constitucionais de proteção ao meio ambiente e consiste em conduta ilegal por parte da autoridade máxima de uma autarquia que deveria zelar pela inegociável defesa ambiental ao estabelecer novo entendimento que enfraquece o sistema sancionador ambiental brasileiro. Autora da ação junto com Bruno Campos, advogado do IDC, Tatiana ressalta que o despacho do presidente do Ibama não foi precedido de qualquer estudo ou estimativa mínima dos impactos dessas anulações no orçamento público e nas políticas de proteção ambiental e de responsabilização de infratores.
“A medida do presidente do IBAMA aumentou a impunidade ambiental em todos os Estados do país, reduziu a proteção ao meio ambiente, deixou de arrecadar bilhões de reais em multas aplicadas, sobrecarregou a estrutura administrativa já combalida do Ibama na revisão de atos já realizados, aumentou as emissões de gases de efeito estufa do Brasil”, afirma a ACP, que visa garantir que nenhum dos efeitos do despacho de Fortunato Bim chegue a ser consolidado e que, se tiver sido, seja anulado por decisão judicial.
O Amazonas, onde a ação foi impetrada, é um dos principais cenários do desmatamento ilegal. “Conforme demonstra o Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD) do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), 36% do desmatamento ocorreram apenas na região conhecida pelo acrônimo ‘Amacro’, onde se concentram 32 municípios na divisa entre Amazonas, Acre e Rondônia, com maior patamar dos últimos 15 anos. O Estado, por exemplo, teve um crescimento de 50% em comparação com a derrubada detectada entre agosto de 2020 e julho de 2021”, citam os autores.
PARA ENTENDER
A ação
– A ação do IDC se baseou em reportagens publicadas pela Folha de S.Paulo e pela Agência Pública. O documento foi protocolado na 7ª Vara Federal Ambiental e Agrária em Manaus nesta quinta-feira (15).
– O instituto afirma que o despacho do presidente do Ibama, Eduardo Fortunato Bim, tem “nefastos efeitos em relação ao enfraquecimento do poder coercitivo do Ibama”.
“A cada dia, mais e mais processos sancionadores serão atingidos, indevidamente, pela prescrição, com base em despacho francamente ilegal e constitucional”, diz a ação.
– O IDC pede que a Justiça conceda uma liminar para suspensão imediata do despacho de Bim. E, no mérito, que o ato seja anulado, assim como todas as declarações de prescrição de multas baseadas na decisão tomada pelo presidente do Ibama. Se a Justiça entender que a medida não é necessária, o instituto pede que o despacho, de março de 2022, não tenha efeito retroativo.
Fonte: Dol