“Querer afastar a responsabilidade da Educação na parte do governo federal é vergonhoso”
Em entrevista ao O Impacto, o renomado advogado e ex-Juiz Federal Edison Messias discorre sobre diversos temas relacionados à educação, ao judiciário e à política nacional. Acompanhe:
Jornal O Impacto – Como operador do direito com vasta experiência, qual sua análise sobre o problema de violência nas escolas?
Dr. Edison Messias – Nos últimos dias chamou-me atenção um discurso do presidente Lula, que fez um pronunciamento que me pareceu um tanto fora da curva. Porque esse problema das escolas, eu concordo, que é uma consequência decorrente dessa ação livre dentro da internet. Existe muita fake, patifaria e pornografias. Realmente é um espaço que tem que ter um olhar policial. Realmente tem que ter grupos de natureza governamental fiscalizando esses espaços, porque a liberdade de expressão não é abusiva, não pode ser abusiva.
A educação é todo o sistema normativo, regulatório e fiscalizatório, provido pelo poder público. Claro que os pais dividem com as escolas, com os professores, o trabalho disciplinar de educação dos filhos, claro é dividida a responsabilidade.
Mas ele querer se descartar de um problema, dizendo que querem transformar as escolas em prisão, aí não. A segurança é o primeiro direito fundamental dentro da Constituição Federal Brasileira, porque ninguém vive sem segurança e as escolas estão amargando problemas relacionados à segurança.
Como ficou claro no caso de Santa Catarina, onde crianças foram assassinadas. Como podemos aceitar que isso tenha acontecido, não é admissível isso. Não tem fiscalização, não tem porteiro. É um negócio ao léu, e como querem dizer que querem transformar a escola em prisão. As escolas têm que ser incrementadas com dispositivos de segurança. Tipo os que têm nos bancos, com ligação direta com a polícia. Eles têm um botão que quando apertado, aciona a polícia. Não sei se no Brasil tem, mas em vários países é assim.
Eu tenho uma ligação histórica com a educação. Fui professor de curso primário, curso secundário e de concurso. Hoje eu tenho ainda acompanhado que houve uma reforma do ensino médio recentemente que parece que não colou e que tão discutindo muito a respeito com o novo Ministro da Educação. Vem se batendo em cima disso porque houve uma reforma do ensino médio que é bastante profunda me parece até, com muitas inovações na área de psicologia e filosofia. Me parece interessante essa modificação, contudo, não pude me deter numa análise maior.
Você sabe que quando fui Juiz Federal em Santarém, aquela faculdade de direito, a Ulbra, ela estava vivendo um momento muito ruim do ponto de vista pedagógico, porque o Ministério da Educação, na época, queria cassar a licença da faculdade para continuar o curso de direito.
Aí eu fiz um trabalho. A própria Ulbra sugeriu que eu partisse da ideia de que eu sendo o estuário da Ulbra no tocante a mão de obra relacionada a estagiários, em geral a justiça federal os absorvia em maior quantidade e ninguém é melhor do que eu para dizer, do desempenho dessa galera aí eu fiz uma análise anatômica da questão universitária no Brasil e focando lógico particularmente o papel da Ulbra em Santarém. Afinal de contas Santarém naquela altura do campeonato era uma cidade isolada mesmo, hoje a gente tem a BR-163, a gente tem satélite, e naquele tempo não tinha nada disso.
Inclusive, no âmbito da Justiça Federal em Santarém, me lembro que mandavam várias vezes comissões de auditoria para verificar meus processos. Eles saiam de queixo duro, porque eu estava sempre 0 a 0, eu não tinha nenhum processo por decidir, tudo decidido, tudo encaminhado, tudo andando. Até o próprio corregedor foi lá e realmente se surpreendeu com a performance da Vara, que não era um trabalho apenas meu, que eu não posso me arrogar a essa condição, de ter sido eu o craque, não eu tinha uma equipe dedicada, composta por estagiários e diversos outros servidores cedidos por outros órgãos.
O que eu estou dizendo é uma realidade, porque eu não posso dissociar a responsabilidade estatal na educação, uma vez que ela é inerente ao próprio poder público. Por que a nossa educação está mal colocada no ranking mundial? Por que somos colocados numa posição tão inferior que nos envergonha? nos humilha? Enfim, querer de algum modo afastar a responsabilidade do âmbito da Educação na parte do governo federal é vergonhoso. Isso é um insulto à inteligência menos meridiana, porque na verdade o Lula não pode esquecer que ele é o titular do Poder Público Federal, que é o número, o primário responsável pela boa educação do país. Eu não posso considerar um sistema educacional bom, que está se arrebentando na parte de segurança.
Mas o Lula dizer que querem transformar as escolas em prisão, isso é uma aberração porque o Lula esquece que a educação basicamente é função estatal, é função do Poder Estatal, é obrigação do Poder Estatal ou ele tá esquecendo que a educação tem até um Ministério.
Segurança na escola, hoje, diante desses ataques terríveis, de agressões físicas letais como de Santa Catarina e que não para, tá havendo um movimento epidêmico nesse sentido de tentar fragilizar o sistema de segurança das escolas. Poxa, isso ao invés de despertar maior interesse por parte governamental, ele quer se descartar e vem com um bordão de dizer “querem transformar as escolas em prisão”. O que é isso?
Prisão é que não tem organização nenhuma. Prisão brasileira é uma pocilga, prisão brasileira é negação do penitenciarismo mundial. Aliás, as penitenciárias do Brasil são aquelas que na televisão são consideradas as piores do mundo. Você sabia que temos uma população carcerária já beirando a casa de 1 milhão de presos e a nossa estrutura ainda é do passado para 350 mil presos. Você sabe que mais do dobro daquilo que é a capacidade das penitenciárias brasileiras já não suporta mais ninguém, e o que tem de mandado de prisão na rua, não é brinquedo.
Porque na verdade, eu chamo, eu invoco a trilogia: o normativo, o regulatório e o fiscalizatório. Quer dizer que essa trilogia é básica, e essencial, por quê? Porque o normativo são as leis, quem faz as leis, tanto as leis formais, as leis do congresso, como as leis secundárias, portarias, decretos e etc. é o Governo Federal. Claro que é uma competência concorrente e os estados também legislam, em matéria de educação, e os municípios também, mas cada qual na sua própria célula, e o Federal não, incorpora ao organismo por inteiro todas as células. Então, eu só acho isso, que ele deveria corrigir esse pronunciamento dele.
Jornal O Impacto – Na sua visão, como esse tema deveria ser tratado no âmbito da gestão pública?
Dr. Edison Messias – Porque na verdade a gente sabe que a educação no Brasil é muito mal distribuída pelo Governo Federal, que nunca quer assumir responsabilidade, ele é centrípeta no tocante a manipulação, rateio e partilha de verbas, aí é com ele, porque ele vai fazer todo mundo com pires na mão ir mendigar em Brasília para receber verba de convênio.
Agora quando chega na hora de assumir responsabilidade, ele joga para as parcelas estatais municipais e estaduais, como é o caso, por exemplo, do ensino básico fundamental em dois níveis, que é para as prefeituras empobrecida do país tomarem conta da educação, em dois níveis de natureza Fundamental e Básico, que é quando o sujeito tem que desemburrar, quando a pessoa tem que aprender, ser alfabetizado, ter inicialidade no aprendizado, aí sob encargo dos municípios. O ensino médio fica com os Estados.
E o terceiro grau, que é o filé mignon, fica para eles, só que eles não ligam. As universidades federais são uma porcaria, todas com equipamento velho, sem as bases necessárias para trabalharem. Das particulares, o governo exige pelo poder normativo e regulatório. A União proibiu em 2018 a criação de qualquer curso de medicina no país e está terminando essa interrupção agora em 2023. Isso é para ter uma ideia do poder que eles têm. Ninguém pode abrir uma faculdade de medicina até que seja feita um tipo concorrência pública. Ninguém das universidades particulares pode chegar e pedir para abrir um curso, não pode tá proibido.
Jornal O Impacto – Qual a sua avaliação sobre os primeiros meses do governo Lula?
Dr. Edison Messias – Nesse momento, entendo que o presidente Lula está começando a dar razão aos bolsonaristas, porque ele começa a fazer uma série de estripulia, como por exemplo, levando aquele João Pedro Stedile para China, a expensas do erário, um bandido que estava inclusive preso, agora solto, vai passear na China.
Aliás, ele faz uma viagem em torno do mundo, vai lá na China, no Oriente Médio e quando volta, ele volta igual a um cara que nunca leu um livro, aí ler o livro, e no dia seguinte quer implantar o livro que ele leu na vida dele. Não é assim, ele foi lá no Oriente Médio, ajudou a prender um camarada suspeito de estuprador.
Esteve na China, mas aí, ele mandou tirar uma tributação de importados via internet, que está caindo em cima das empresas chinesas. Quer dizer, reclamaram para ele lá, que colocaram uma barreira alfandegária e ele retirou a barreira. Chamou o Haddad e disse, Haddad acaba com isso, não tributa os chineses se não nos ferramos nas nossas exportações.
Enfim, ele viaja ao mundo e quando chega e bota todo o figurino da moda chinesa asiática oriente médio pra cá, porque esse cara que foi recambiado preso pra cá, vai cobrar outros tantos árabes que estão aqui sacaneando que vão ter que ir para lá também.
Esse país não é sério, você viu que o Bolsonaro levou à saúde ao zero. Querer salvar a cabeça do Bolsonaro na saúde é vergonhoso também. Porque o Bolsonaro abandonou a saúde. Tanto abandonou que botou um general, bolorento, um general de pijama, um general burocrata dentro do Ministério da Saúde, no momento traumático em que o país perdeu mais de meio milhão de vidas, sinceramente a gente está saturado desses presidentes plantonistas do governo federal, porque cada um que vem é só nos decepcionando e frustrando as expectativas. A gente tá vendo que o Movimento de Sem Terra tá de novo se intensificando e gerando ameaças e violências no campo. E o governo não tá nem aí, ao contrário, prestigia esse tipo de violência. A gente condenava a violência do braço armado de Bolsonaro, mas o braço desarmado, agora, do jeito que tá, só arma o lado dos invasores. Isso não é correto.
Jornal O Impacto – Qual a sua análise sobre o combate às fake news na internet?
Dr. Edison Messias – Acredito que precisa sim de atenção e iniciativas visando o combate. Agora fazer como Alexandre de Moraes sugere praticamente uma intervenção nesse espaço, seria complicado, pois não sabemos as limitações que seriam impostas.
Querer limitar o espaço de liberdade de expressão de quem não está a fim de fazer fake, muito menos de pregar atos de terrorismo. Na verdade, ele quer limitar, porque venha cá, os abusos que estão sendo cometidos na internet, não podem ser objeto de repressão? Claro, todo ato abusivo, pode ser objeto de repressão, caso a caso, claro que sim.
Então não precisa estar mexendo numa estrutura de informação, para efeito de querer regular o uso desse espaço ao modo do Estado, ao modo Getúlio Vargas, ao modo dos militares, que no fundo me parece ser isso que querem, tirar a liberdade de expressão de imprensa, a famosa liberdade de imprensa que caiu naquela melhor composição do Supremo Tribunal Federal.
Hoje, essa composição sofreu abalos, do ponto de vista intelectual e de jurismo, porque sinceramente, há ministros que ingressaram recentemente no Supremo Tribunal Federal, que deixam a desejar naquilo que é chamado de Notável Saber Jurídico.
“Eu não posso admitir que os dois últimos ministros que entraram têm um Notável Saber Jurídico, eu entendo que Gilmar Mendes tem, eu entendo que a Carmem Lúcia tem. Posso entender que mais algum outro tenha, mas há controvérsias quanto a tantos outros, não é verdade?”
O Impacto