Empresa ré por garimpo ilegal tem contratos com governo em terras indígenas
A matéria de O Impacto, intitulada Auditoria aponta irregularidades em serviços da Piquiatuba Táxi Aéreo a distrito indígena, publicada com exclusividade no dia 11 de maio, repercutiu nacionalmente nesta terça-feira(23), com a publicação do portal Uol. Acompanhe:
Uma empresa acusada de operar mais de 200 voos a um garimpo ilegal, no norte do Pará, tem dois contratos ativos com o Ministério da Saúde para fazer transporte aéreo a terras indígenas da região.
O que aconteceu
Os dois contratos em vigor foram firmados pela gestão Temer em 2018 e estão previstos para durar até agosto. A empresa é a Piquiatuba Táxi Aéreo, de Santarém (PA), que fechou 24 contratos com o governo federal de 2010 a 2022.
A Piquiatuba é suspeita de garimpo pelo menos desde outubro de 2020, quando a PF apreendeu 45 kg de ouro na casa do dono. A empresa e seus dois sócios são réus por mineração ilegal na Justiça Federal do Pará.
Mesmo após a operação da PF, a Piquiatuba fechou quatro contratos no governo Bolsonaro. Todos já foram encerrados, porque o vínculo chegou ao fim.
Em novembro de 2021, o Ministério Público Federal acusou a Piquiatuba de mineração ilegal. Segundo o órgão, a empresa extraiu mais de 100 kg de ouro de um garimpo dentro da reserva biológica de Maicuru, em Almeirim (PA).
Em março deste ano, a CGU (Controladoria-Geral da União) apontou várias irregularidades em um contrato ainda em vigor. Em auditoria, a CGU afirma que a Piquiatuba prestou serviços fora dos termos da licitação e deu prejuízo de quase R$ 800 mil à União.
O Ministério da Saúde destacou que os contratos não são da atual gestão. A pasta do governo Lula afirmou que “suspenderá parcerias com empresas que venham a ser condenadas judicialmente por envolvimento com o garimpo” — a Piquiatuba é ré e ainda não houve julgamento.
O que diz a empresa?
Procurada pelo UOL, a Piquiatuba negou operar voos a garimpos. Em nota, a empresa diz que a maioria dos 232 voos apontados na denúncia do MPF foram para aldeias indígenas da região, a serviço do Ministério da Saúde.
A Piquiatuba Táxi Aéreo não opera voos para garimpos ilegais. Os voos operados pela empresa têm por destino aeródromos homologados pela ANAC e, eventualmente, para as aldeias atendidas pelos contratos de atenção à saúde indigenista firmados com o Poder Público.”
Empresa “esquentava” ouro ilegal, diz MPF
A denúncia afirma que a Piquiatuba vendeu 103,6 kg de ouro de forma clandestina, de 2015 a 2018. Segundo o MPF, o metal era extraído do garimpo do Limão, um local proibido, mas vendido como se viesse de garimpos legais de outras regiões.
A empresa foi alvo da operação “Ouro Frio”, da PF, devido ao suposto uso de notas frias para regularizar as vendas. Na casa de Armando Amâncio da Silva, então dono da Piquiatuba, os agentes encontraram 44,8 kg de ouro, avaliado em R$ 15 milhões.
Segundo o MPF, Silva operou pelo menos 232 voos ao garimpo ilegal, partindo de um hangar privado em uma fazenda dele.
O acusado morreu em outubro de 2020, semanas após a operação da PF. Dois filhos assumiram a empresa: Edson Barros da Silva e Patrick Paiva da Silva.
O MPF afirma que Silva explorava o garimpo do Limão desde 2009, mas o local estaria em atividade havia mais de 30 anos. Na operação de 2020, a PF encontrou lá cinco minas subterrâneas, que estariam ativas, além de dezenas de equipamentos de garimpo.
CGU viu favorecimentos à empresa em contrato
No dia 24 de março, a CGU apontou 10 irregularidades no contrato auditado. Ele foi firmado pelo Dsei (Distrito Sanitário Especial Indígena) Guamá-Tocantins para levar cargas e passageiros às aldeias atendidas pela unidade, na região nordeste do Pará.
O contrato foi fechado em agosto de 2018, com prazo de cinco anos, e tem sido renovado anualmente desde então. Desde a assinatura, ele já rendeu R$ 18,3 milhões à empresa, segundo o Portal da Transparência do governo federal.
Quatro dessas irregularidades, somadas, deram um prejuízo de R$ 791 mil à União, segundo a CGU. Entre outras falhas, o órgão afirma que a Piquiatuba usou aviões menores do que os prometidos em contrato e chegou a receber por voos que não aconteceram.
A Piquiatuba nega as irregularidades apontadas pela CGU. Em nota ao UOL, a empresa afirmou apenas que “que prestará os esclarecimentos e apresentará documentos oportunamente nos autos daquele procedimento de controle”.
No fim de abril, o senador Jorge Kajuru (PSB-GO) pediu à PGR que investigue os outros contratos da Piquiatuba. A CGU analisou apenas um, e também pode ter havido irregularidades em outros, segundo o parlamentar.
Há claros indícios de participação da empresa Piquiatuba Táxi Aéreo no garimpo ilegal. Isso lança suspeitas sobre a prestação dos serviços contratados pelos distritos sanitários especiais e pela Funai, que são responsáveis pelo acolhimento aos indígenas.
Esta não é a única empresa acusada de garimpo com contratos federais. No último dia 8, o UOL mostrou que uma empresa ré por mineração ilegal na Terra Indígena Yanomami prestou serviços ao Exército e ao Ministério da Saúde no próprio território.
Fonte: Uol