Procuradores determinam regularização urgente do assentamento PAE Lago Grande

Treze Procuradores da República assinaram a recomendação emitida pelo Ministério Público Federal (MPF) que determinou que órgãos públicos adotem medidas urgentes para a regularização do Projeto de Assentamento Agroextrativista (PAE) Lago Grande, em Santarém.

Segundo o fiscal da lei, apesar de ter sido criado há quase 20 anos, o assentamento ainda não teve sua área regularizada, o que viola uma série de direitos das famílias assentadas e expõe as lideranças a constantes ataques de grupos criminosos.

O documento foi enviado pelo MPF ao ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), Paulo Teixeira, ao presidente do Instituto Nacional da Colonização e Reforma Agrária (Incra), César Aldrighi, e, para garantir a segurança das equipes de regularização e das defensoras e defensores de direitos humanos, também para o diretor-geral da Polícia Federal (PF), Andrei Rodrigues, e para o diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF), Antônio Oliveira.

Conforme o MPF, desde a criação do PAE, em 2005, as representações regionais do Incra no oeste do Pará informam que não têm orçamento, materiais e, principalmente, recursos humanos suficientes para finalizar a regularização fundiária. Para o parquet, há uma falência operacional do órgão para adotar essas medidas.

Violência e abandono

“Nas últimas duas décadas, defensoras e defensores de direitos humanos que atuam pela regularização do PAE Lago Grande vêm sofrendo ameaças, perseguições e até invasão de prédio e tentativa de emboscada”, disse o MPF.

Para procuradoras e procuradores da República autores da recomendação, a demora do Poder Público é a principal causa e o maior fator de agravamento da violência e dos conflitos.

“Entidades representativas das 35 mil pessoas integrantes das 155 comunidades de famílias extrativistas, ribeirinhas, pescadoras artesanais e indígenas que compõem o PAE também relatam a ocorrência de desmatamento, retirada ilegal de madeira, portos clandestinos – incluindo portos madeireiros –, poluição das águas, grilagem de terras, crimes contra a flora e fauna – como caça predatória e uso indevido de igarapés –, comércio e venda de drogas ilícitas e garimpo ilegal”.

Para o órgão ministerial, a demora na conclusão da regularização fundiária e titulação do PAE caracteriza o descumprimento das normas da reforma agrária, estimula o crescimento da desigualdade social e impossibilita que trabalhadoras e trabalhadores rurais tenham acesso a políticas públicas – incluindo políticas de concessão de créditos para investimentos na produção – e à gestão do território pela própria organização das famílias assentadas, alerta o MPF.

Medidas recomendadas     

 Aos titulares do MDA e do Incra, o MPF recomendou as seguintes medidas:

– No prazo máximo de 90 dias, alocar recursos orçamentários, financeiros e humanos, próprios e/ou por acordos (com outros órgãos, entidades públicas ou entidades da sociedade civil), com a criação de força tarefa ou grupo de trabalho, para viabilizar, em articulação com a Superintendência do Incra no Oeste do Pará, a conclusão do processo de georreferenciamento, regularização fundiária e titulação coletiva do PAE Lago Grande;

– No prazo máximo de 90 dias, elaborar e apresentar ao MPF, à Federação das Associações de Moradores e Comunidades do Assentamento da Gleba Lago Grande da Franca (Feagle), ao Sindicato de Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras Familiares de Santarém (STTR) e ao Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS) cronogramas detalhados, divididos por etapas com prazos razoáveis para cada uma delas, a fim de concluir:

– No prazo de um ano, o georreferenciamento, regularização fundiária e titulação coletiva do PAE Lago Grande, mediante Contrato de Concessão de Direito Real de Uso (CCDRU);

– No prazo de um ano, a supervisão ocupacional do PAE Lago Grande; e

– No prazo de um ano, a atualização da Relação de Beneficiários (RB) do PAE Lago Grande, com análise da possibilidade de ampliação da capacidade do referido assentamento;

– Elaborar e apresentar, no prazo de 90 dias, plano para viabilizar a destinação de créditos rurais para os assentados da RB do PAE Lago Grande que comprovem residir no assentamento, e implantar políticas públicas de suas atribuições para os povos e comunidades tradicionais do referido assentamento;

– Acionar os órgãos competentes para garantir a segurança coletiva dos servidores que trabalharão nos processos acima, das lideranças e defensores do PAE Lago Grande e de todos os membros das comunidades do assentamento;

– Renovar o Acordo de Cooperação Técnica entre a Superintendência do Incra no Oeste do Pará, Feagle, STTR, organização Terra de Direitos e Universidade Federal do Pará (UFPA), para apoio jurídico no levantamento da situação fundiária da Gleba Lago Grande da Franca e, consequentemente, para a definição dos limites e efetiva implantação do PAE Lago Grande;

– Segurar a participação das representações das comunidades tradicionais do PAE Lago Grande (Feagle, STTR, CNS, Guardiões do Bem Viver etc), em todas as etapas das medidas administrativas acima recomendadas.

Aos diretores-gerais da PF e da PRF, as procuradoras e os procuradores da República recomendaram a garantia de escolta e segurança às etapas em campo dos trabalhos do Incra no PAE Lago Grande, até a sua titulação, para assegurar a vida e a integridade física dos servidores e servidoras da autarquia e dos defensores e defensoras de direitos humanos do PAE.

 Lideranças denunciam novas ameaças

Lideranças do Projeto de Assentamento Agroextrativista (PAE) Lago Grande relataram novos episódios de ameaças decorrentes de suas atividades como defensores de direitos humanos.

De acordo com o registro no Ministério Público Federal (MPF), nos dias 17 e 21 de junho de 2024, o vice-presidente do Sindicato de Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras Familiares de Santarém (STTR) e membro do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), e o presidente da Federação das Associações de Moradores e Comunidades do Assentamento da Gleba Lago Grande da Franca (Feagle), compareceram para denunciar os incidentes.

Segundo os relatos, no dia 24 de maio de 2024, em duas ocasiões nas comunidades de Aracuri e Maranhão, um carro preto com quatro homens apareceu nas residências de familiares das lideranças, buscando informações sobre o paradeiro deles e de familiares.

Além disso, uma das denunciantes relatou ter sofrido uma tentativa de emboscada na madrugada de 4 de junho de 2024.

As lideranças acreditam que os novos episódios de ameaças podem estar relacionados a eventos de mobilização realizados entre os dias 13 e 18 de maio de 2024, quando atualizaram a relação de beneficiários (RB) do assentamento. Eles também mencionaram assembleias da Feagle nas comunidades Soledad e Morui, no dia 1º de junho de 2024, para tratar do mesmo tema.

O modus operandi relatado pelas duas lideranças se assemelha muito ao descrito pelo defensor de direitos humanos Darlon Neres, integrante da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) e membro do Guardiões do Bem Viver, que também sofreu ameaças em setembro de 2023 após solicitar o combate ao desmatamento ilegal no PAE Lago Grande.

O Ministério Público Federal informou que está acompanhando o caso e que medidas de proteção aos denunciantes serão avaliadas.

Sobre recomendações

Recomendações são instrumentos do Ministério Público que servem para alertar agentes públicos sobre a necessidade de providências para resolver uma situação irregular ou que possa levar a alguma irregularidade.  (com informações do MPF)

O Impacto

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