Licenciamento deficiente faz Justiça Federal determinar readequação de portos e hidrovias em Santarém
Foi decretada em caráter de urgência pela Justiça Federal a decisão de que qualquer procedimento de licenciamento ambiental de obras em portos e hidrovias de Santarém passem por readequação socioambiental e climática.
A decisão atende a preocupação de comunidades tradicionais da região (indígenas, quilombolas, pescadores artesanais, ribeirinhos, extrativistas, etc) em relação aos impactos cumulativos que empreendimentos dessa natureza e porte trazem ao seu modo de vida e ao meio ambiente.
De acordo com o novo plano gestor do município de Santarém, o lago do Maicá, principal via hídrica e pesqueira do município, se tornou área portuária. Essa mudança contraria a vontade manifestada por comunidades tradicionais em audiência pública feita sobre o assunto. Seguidas ações civis públicas ajuizadas por essas comunidades junto ao Ministério Público demonstraram o constante descumprimento das exigências de estudo prévio de impacto ambiental (EIA/RIMA) e consulta prévia a esses povos e comunidades tradicionais.
Por Santarém ter sido incorporada ao Corredor Logístico Tapajós-Xingu para permitir a expansão do agronegócio, o número de portos no Tapajós dobrou em 10 anos e ao menos metade dos 27 portos em operação cometeu alguma irregularidade no processo de licenciamento ambiental, com impactos severos aos povos e comunidades tradicionais da região. Os dados são do estudo feito pela organização Terra de Direitos.
O estudo também mostra que os entes estaduais e municipais, não atuam com o rigor que o procedimento de licenciamento ambiental pede e isso incentiva a instalação de obras portuárias frouxas nas exigências ambientais e sociais.
Esse histórico de irregularidades levou o MPF, através do procurador da República Vítor Vieira Alves, impor ao estado do Pará e ao município de Santarém a adequação de seus procedimentos de licenciamento ambiental às exigências do direito socioambiental.
Obrigações
A Justiça Federal, na figura do juiz federal Felipe Gontijo Lopes, reconheceu que a inadequação dos licenciamentos gera o perigo de danos ambientais deferindo o pedido de tutela feito pelo MPF e determinando ao estado do Pará e ao município de Santarém a urgente adequação dos seus procedimentos de licenciamento ambiental de obras portuárias e hidrovias em Santarém, sob pena de aplicação de multa diária.
O estado e município são obrigados a realizar, antes da autorização ou renovação de licenças para portos, estudos de prévio impacto ambiental (EIA/RIMA) para todas as obras relacionadas a portos e hidrovias. Esses estudos devem ser abrangentes e incluir análise dos componentes quilombolas e indígenas, toda a vez que um território dessas comunidades tradicionais estiver localizado a até 10 km de distância do empreendimento e a consulta à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para que informem sobre outros territórios potencialmente impactados, também deverá estar inclusa.
Os estudos também devem conter a análise de impacto climático, levando em conta os impactos cumulativos e sinergéticos (associados) das obras, além de apresentar propostas de medidas de adaptação, mitigação e criação de sumidouros de carbono. A exigência de estudo de impacto climático também é pautada pelo princípio da prevenção e tem como objetivo impedir ou diminuir a ocorrência da degradação ambiental, através da imposição de medidas que já são previstas pela Constituição Federal e pela legislação ambiental.
A Justiça também obriga ao estado do Pará e ao município de Santarém, a realização de consulta livre, prévia, informada e de boa-fé aos povos e comunidades tradicionais potencialmente impactados. Essas consultas devem ser conduzidas pelo órgão licenciador e não pela empresa interessada e devem ser realizadas antes de qualquer licença, seja ela prévia, de instalação, de operação ou renovação. Não podem ser substituídas por audiências públicas, as consultas públicas ou deliberações em conselhos gestores consultivas, deliberativas e precisam seguir os protocolos existentes e, na sua ausência, deve ser elaborado plano de consulta em conjunto à comunidade tradicional.
As consultas também devem abranger todos os povos e comunidades tradicionais potencialmente impactados – para além dos indígenas e quilombolas – com especial destaque para a presença de pescadores e pescadoras artesanais de Santarém. O direito de consulta independe da demarcação oficial das terras indígenas, quilombolas ou tradicionais.
Por Rodrigo Neves com informações do MPF
Imagem: Reprodução/MPF
O Impacto