Banco transfere R$ 131 milhões errado, cliente devolve e cobra recompensa na Justiça

No conto “A Carteira”, Machado de Assis narra o dilema moral de Honório, um advogado que, apesar de enfrentar sérias dificuldades financeiras, decide devolver uma carteira cheia de dinheiro ao dono, Gustavo, um amigo próximo. Contudo, seu gesto de honestidade é recebido com ingratidão e desconfiança.

Como a vida imita a arte – ou a arte imita a vida? – em 2023, um motorista autônomo de Palmas/TO viveu uma situação similar, mas com um desfecho diferente: após devolver imediatamente R$ 131 milhões que haviam sido transferidos por engano à sua conta, ele resolveu cobrar do banco uma “recompensa” pela devolução do montante.

Na ação judicial, o motorista pede uma recompensa de 10% sobre o valor devolvido, ou seja, a bagatela aproximada de R$ 13 milhões. Ele afirma que o banco sequer “agradeceu” pela devolução e que o gerente da instituição financeira chegou a ameaçá-lo, exigindo a devolução imediata do valor.

Ainda, alegou que devido à transferência, sua conta migrou para a categoria VIP, mesmo sem seu consentimento, e o valor de R$ 70, mensais, passou a ser cobrado.

Segundo o motorista, o erro teve grande impacto em sua vida, e o caso atraiu a imprensa para sua residência, gerando “desconforto e pressão psicológica”.

Além da recompensa, ele requer indenização por danos morais de R$ 150 mil, devido à exposição sofrida.

Processo: 0030429-44.2024.8.27.2729

Achado não é roubado

No Código Civil brasileiro, a “descoberta” é tratada especificamente no art. 1.233. A norma estabelece os direitos sobre algo que é encontrado por alguém, desde que a descoberta não tenha dono conhecido.

Segundo o dispositivo, se uma pessoa encontrar algo que não possui proprietário conhecido (como objetos perdidos ou abandonados), ela tem a obrigação de entregá-lo à autoridade competente para a tomada das providências legais.

Caso o objeto encontrado não seja reivindicado no prazo legal, o descobridor poderá ser reconhecido como proprietário, respeitando as normas aplicáveis.

O código diferencia a “descoberta”, do “achado de tesouro”:

Achado de tesouro (art. 1.264): refere-se a bens de valor escondidos ou enterrados, cujo dono é desconhecido, e estabelece que o descobridor divide o valor com o proprietário do imóvel onde foi encontrado.
Descoberta (art. 1.233): foca em bens sem proprietário conhecido, sem envolver tesouros ocultos ou enterrados.

Já o art. 1.234 do CC prevê que o descobridor tem direito a uma recompensa de, no mínimo, 5% do valor do bem encontrado, a ser paga pelo proprietário ou pela pessoa que reivindicar o objeto.

Na ação judicial movida pelo motorista, a defesa sustenta o direito à recompensa por meio de analogia com a tecnologia, argumentando que o valor recebido na conta foi, de certa forma, “encontrado”, porém em um ambiente virtual. Alega ainda que o CC, promulgado em 2002, não contemplava situações tecnológicas avançadas como a presente.

 

Fonte: Migalhas Jurídicas

Imagem: Reprodução

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