Justiça Federal revoga decisão e indígenas mantém ocupação na Seduc em Belém

A pedido do Ministério Público Federal (MPF), a Justiça Federal revogou, nesta terça-feira (4), a decisão que determinava a desocupação parcial da sede da Secretaria de Estado de Educação do Pará (Seduc), em Belém. Desde 14 de janeiro, o prédio está parcialmente ocupado por povos e comunidades tradicionais em manifestação pela revogação de lei estadual que extinguiu normas que garantiam o ensino médio nos territórios em modalidade presencial.

A decisão foi tomada após a realização, na sexta-feira (31), de audiência e inspeção judiciais com diálogo interétnico e intercultural. A audiência, convocada pela Justiça Federal a pedido do MPF, ocorreu na sede da Seduc, com manifestações orais das lideranças e escuta ativa pela Justiça. O MPF avaliou a oitiva como um marco histórico no respeito aos direitos dos povos tradicionais.

“É inconteste a natureza pacífica da manifestação. As únicas alegações de violência entre as partes são direcionadas ao Estado do Pará, que teria, segundo as lideranças do movimento, imposto bloqueio policial à ocupação nos primeiros dias do movimento, utilizando-se de força ostensiva com a finalidade de intimidar e desmobilizar os ocupantes. Não há indício de qualquer dano intencional ao patrimônio público”, registra a decisão da juíza federal Maria Carolina Valente do Carmo.

Servidores não impedidos – A decisão também pontuou que a ocupação se limita a uma pequena parte das dependências da Seduc, sem impedir o trânsito de servidores ou comprometer significativamente as atividades.

A administração estadual possui meios de compatibilizar o movimento indígena com o funcionamento do órgão, como o retorno dos servidores que trabalham em espaços não ocupados – que são a maior parte do prédio –, a realocação de outros para espaços subutilizados e eventual concessão de trabalho remoto, registra a decisão.

“De outro lado, as lideranças indígenas afirmaram, de forma reiterada, que não há oposição ao retorno do trabalho presencial, tanto que os servidores lotados na Coordenadoria de Educação Escolar Indígena (Ceind) continuaram a desempenhar suas atividades em sala que se encontra ocupada pelo movimento. Portanto, o prejuízo às funções administrativas da Seduc é reduzido e decorre especialmente da ausência de iniciativa do Estado do Pará”, aponta a juíza federal.

Importância do diálogo – A juíza federal ressaltou a importância do diálogo intercultural e da busca por soluções que respeitem os direitos das comunidades tradicionais, mencionando inclusive a fala de um dos representantes do MPF durante a audiência, o procurador da República Felipe de Moura Palha.

“Existe uma fala que me incomodou bastante hoje – eu não vou dar nomes para não criar animosidades — mas veio de um representante do Estado, de que servidores da Seduc estariam incomodados com a presença das comunidades aqui dentro. Essa fala demonstra o quanto nós estamos longe de onde nós queremos chegar. Excelência, manter os povos indígenas e quilombolas aqui dentro é uma forma do Estado obrigar as pessoas a serem melhores, a conviver com a pluralidade de ideias, de visão de mundo, é uma forma de demonstrar que nós precisamos melhorar enquanto cidadãos. Os servidores públicos que estão ou que se sentiram incomodados com a presença da ocupação pacífica aqui dentro precisam melhorar enquanto cidadãos. E nós estamos em um órgão que é responsável pela educação e a educação se exerce em todos os momentos e em todos os lugares e não apenas na sala da escola”, registra trecho da argumentação do procurador da República Felipe de Moura Palha citada na decisão.

Advertência e queda de sigilo – Na decisão, a Justiça Federal também aplicou pena de advertência ao Estado do Pará, em decorrência da utilização de expressões irônicas e desrespeitosas contra o MPF em manifestação no processo judicial. Também foram retirados os sigilos de documentos apresentados pelo Estado do Pará no processo. São relatórios da Secretaria Adjunta de Inteligência e Análise Criminal (Siac) da Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social (Segup) sobre a ocupação.

A Justiça Federal determinou a intimação das partes, incluindo a coletividade indígena, sobre a decisão, com especial atenção à comunicação clara e acessível aos indígenas sobre a revogação da ordem de desocupação parcial.

Fonte: MPF

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