Abolitio Criminis & Anistia: uma análise jurídica – o que significa?
Por Carlos Augusto Mota Lima
Advogado Especialista em Segurança Pública
O Direito Penal constitui um dos instrumentos de controle social, tendo por finalidade a proteção de bens jurídicos relevantes. Por essa razão, é considerado, entre as normas jurídicas, como a última trincheira, o recurso extremo — o “soldado de reserva”. Essa é a essência da norma penal: deve ser aplicada como ultima ratio, conforme o princípio da intervenção mínima, justamente pelos profundos impactos que uma ação penal pode causar na vida de qualquer cidadão.
Nesse sentido, o Direito Penal, enquanto ferramenta estatal voltada à manutenção do equilíbrio social, deve operar sob a premissa de um sistema penal mínimo. Essa concepção minimalista, outrora adotada pela Suprema Corte, foi recentemente substituída por uma abordagem expansionista, que traz consigo um viés punitivista e a supressão de garantias individuais — movimento que se aproxima, perigosamente, de um Estado autoritário.
O artigo 2º do Código Penal estabelece que “ninguém pode ser punido por fato que uma lei posterior deixa de considerar crime”. Trata-se do princípio da abolitio criminis, que representa a extinção de uma infração penal. Isso ocorre quando uma nova legislação (novatio legis) descriminaliza uma conduta anteriormente tipificada como crime. Esse princípio é um dos pilares de proteção do cidadão frente ao Direito Penal, pois, independentemente da fase processual ou mesmo da existência de processo, a lei nova revoga todos os efeitos da norma anterior — incluindo o cumprimento da pena, a tramitação do processo, a ficha criminal e a possibilidade de reincidência.
Importante ressaltar que a abolitio criminis pode ocorrer antes ou após a sentença condenatória. Caso já exista condenação, compete ao juízo da execução declarar a extinção da punibilidade. Essa nova legislação é a única com força para desconstituir a coisa julgada, embora seus efeitos sejam limitados à esfera penal, não alcançando as consequências civis decorrentes do delito.
E qual a relação com a Anistia?
A Anistia é uma lei originária do Congresso Nacional, que deve ser aprovada por ambas as Casas Legislativas para atender a uma demanda específica — neste caso, os eventos ocorridos em 08 de janeiro. Diferentemente da abolitio criminis, que elimina a tipificação penal, a anistia “esquece” o fato ilícito praticado, embora a infração continue prevista no ordenamento jurídico. Enquanto a primeira extingue o crime, a segunda apenas perdoa o autor, sem alterar a norma penal incriminadora.
A narrativa sobre o 08 de janeiro não pode mais prosperar. A omissão de parlamentares — especialmente das lideranças do Congresso — não será esquecida pela sociedade. É de conhecimento geral os abusos cometidos pelo Supremo Tribunal Federal, sob a presidência do ministro Alexandre de Moraes e com a conivência dos demais ministros. Sabe-se que muitos dos crimes atribuídos aos réus não encontram respaldo jurídico e que o STF não detém competência para julgá-los. A manutenção dessa narrativa tem como único objetivo a prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro, numa tentativa de viabilizar a reeleição de um governo enfraquecido e sem respaldo popular.
É notório o contraste entre a resposta institucional aos atos de 08 de janeiro e os episódios protagonizados por movimentos de esquerda em manifestações anteriores, que também resultaram em depredações e crimes — mas que foram tratados como protestos legítimos. A disparidade de tratamento evidencia o uso seletivo do aparato estatal, gerando insegurança jurídica e afetando até mesmo a economia.
A omissão do presidente da Câmara dos Deputados é injustificável. Embora o projeto de anistia não seja a única pauta do Legislativo, certamente é a mais urgente, pois trata de vidas humanas, de pessoas presas injustamente, vítimas de abusos de autoridade e julgadas por um tribunal parcial, incompetente e inconstitucional. Cada deputado que se recusar a assinar ou votar esse projeto carregará para sempre a marca da covardia, da insensibilidade e da conivência com um sistema arbitrário.
Hoje, nada é mais urgente do que restaurar a ordem, a democracia e a segurança jurídica no Brasil. Em outras palavras: não há justificativa para a omissão. Quem defende a manutenção do atual estado de coisas não é patriota e não merece representar o povo brasileiro no Parlamento.
Nota sobre o Autor:
Carlos Augusto Mota Lima é advogado regularmente inscrito na OAB/PA sob o nº 4725. Professor de Direito Penal, é pós-graduado em Ciências Penais com extensão em Magistério Superior, Direito Constitucional, e MBA em Segurança Pública pela Faculdade Cândido Mendes – RJ. Também possui pós-graduação lato sensu em Segurança Pública pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS. Ex-delegado de Polícia Civil e ex-defensor público.
Santarém, 08 de abril de 2025
O cidadão ou cidadã que se sente injustiçado (a) ou lesado (a) em seus direitos, buscam incessantemente por JUSTIÇA. Mas os delinquentes buscam dia e noite por ANISTIA.