Reserva não escapa de ação de madeireiros

MadeiraNesta semana, a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira – possivelmente acompanhada da presidente Dilma Rousseff -, deverá pousar numa vila isolada do interior de Melgaço, no nordeste do Pará, para um encontro com representantes de comunidades agroextrativistas da Amazônia. Se prestar atenção no voo, poderá ver uma série de estradas e clareiras clandestinas que se embrenham pelas matas da região como uma metástase, usada para extração ilegal de madeira.

Nem as unidades de conservação estão imunes ao câncer, como o Estado pôde comprovar na Reserva Extrativista (Resex) de Gurupá-Melgaço, a poucos quilômetros de onde o encontro será realizado.

Para os moradores da reserva, a ação dos madeireiros não é nenhuma novidade. Eles já se acostumaram ao barulho das motosserras no interior da mata e ao trânsito dos caminhões carregados de toras pelos ramais de terra da unidade.

Há quem seja conivente com os madeireiros em troca de dinheiro – R$ 50 a R$ 100 por árvore. Entre as lideranças da reserva, porém, o sentimento é de revolta, com a ousadia dos madeireiros e a inoperância do poder público.

“A reserva está largada à própria sorte”, resume o presidente do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Agroextrativistas de Gurupá, Heraldo Pantoja. “As comunidades não têm luz, educação, saúde, transporte, assistência técnica, nada. Aí vem um madeireiro e oferece R$ 50 para derrubar uma árvore, o cara aceita.”

Quem se cala diante do problema assiste aos recursos naturais da floresta se exaurindo. Quem se atreve a denunciar não recebe ajuda e ainda corre o risco de ser jurado de morte. “Nossa luta é para manter a floresta em pé. Mas as famílias precisam melhorar de vida, senão, fica difícil”, afirma Pantoja.

“Nosso povo é muito vulnerável a qualquer um que chega oferecendo algum aumento de renda”, diz Manoel Pena, de 58 anos, uma das principais lideranças comunitárias da região.

Melgaço é o município com pior índice de desenvolvimento humano (IDH) do País, e Gurupá não fica muito atrás. Cerca de 800 famílias vivem na Resex, que abrange 1.450 km² (do tamanho da cidade de São Paulo), sobrevivendo quase que exclusivamente de produtos florestais, como o açaí, o palmito, o pescado e a produção de mandioca.

A presença dos madeireiros na reserva, segundo Pena, é apenas o sintoma de um problema maior e mais grave, que é a ausência do poder público. Com a criação da Resex, em 2006, a expectativa era de que os madeireiros seriam expulsos e que no lugar deles entraria o poder público, trazendo saúde, educação, transporte, energia e assistência técnica, para ampliar a produção e melhorar a qualidade de vida das comunidades.

Nada disso aconteceu. Passados sete anos, a reserva continua a existir apenas no papel.

“O que está em jogo não é só a madeira, é um modelo inteiro de conservação e desenvolvimento sustentável apoiado nas comunidades tradicionais”, avalia Danicley de Aguiar, ativista do Greenpeace que viveu vários anos em Gurupá. “O governo criou a Resex, mas não deu o passo seguinte, que é implementá-la. As políticas públicas não chegaram, e isso é muito frustrante para as comunidades.”

Soluções. O presidente do ICMBio, Roberto Vizentin, reconhece o problema, presente em outras Resex da Amazônia. “É verdade que existe uma enorme carência de políticas públicas nessas áreas”, afirma Vizentin. “Não há nenhum tipo de abstração em relação a isso.”

Um plano nacional de apoio ao agroextrativismo, segundo ele, está em fase final de elaboração, com a participação de vários ministérios. Os detalhes deverão ser apresentados às comunidades justamente no evento desta semana em Melgaço – o 2.º Chamado da Floresta, na quinta e sexta-feira.

Uma das estratégias centrais será a abertura de editais para a contratação de serviços de assistência técnica às comunidades, com o intuito de ampliar, agregar valor e garantir a sustentabilidade dos produtos florestais. Outras medidas envolverão a adequação de políticas públicas nacionais de saúde, educação, energia e moradia à realidade dessas comunidades, cujas necessidades socioeconômicas estão sendo mapeadas uma a uma.

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Fonte: Estadão

 

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