Patrimônio Cultural do Município está virando ficção
O patrimônio cultural arquitetônico obidense, em breve, se tornará peça de ficção. Não, não é nenhum filme que estará sendo rodado em Óbidos e que tenha por tema a cultura local. O patrimônio a que eu me refiro, e que aos poucos deixa de existir e torna-se apenas ficção, é o grande número de prédios de estilo colonial que desapareceram (e desaparecem) do centro histórico. São esses prédios que diferenciam a cidade de Óbidos de outras cidades do norte de Brasil.
Estes prédios sofrem com a descaracterização (reformas) ou desabamento por falta de cuidados, ou de dinheiro para mantê-los de pé. Dessa forma, muitos já desapareceram e outra grande quantidade vive apenas de fachada, pois são as únicas coisas que ainda resistem bravamente ao descaso. Os órgãos competentes em nada se manifestam, tanto para sensibilizar os proprietários como para criar uma lei municipal que regulamente novas construções ou reformas na área do centro de Óbidos. Construções novas agridem o estilo personalíssimo e inconfundível do casario colonial.
A população assiste inerte a esse filme, antigo, mudo, da ruína do que resta da história da presença portuguesa na Amazônia. Cada dia de displicência representa muitos séculos de história que vão abaixo.
Ficção e realidade – A cidade de Óbidos tem em Inglês de Sousa um de seus filhos mais ilustres. Em suas obras é imortalizada a cidade de origem do escritor. No romance “O Coronel Sangrado” encontramos descrições maravilhosas de situações, personagem e lugares, tudo construído no campo ficcional, porém com inspiração estruturada no realismo.
No capítulo IV do referido livro (Coronel Sangrado, UFPA, 1968) temos a descrição da casa do Coronel Sangrado “A habitação do tenente-coronel Severino de Paiva vulgo Coronel Sangrado, era uma grande casa, sita à rua de São Francisco ou do Bacurí(…) Duas grandes salas de frente, separadas por um corredor largo, as espaçosas alcovas e a imensa varanda ou casa de jantar, aberta para o quintal e assoalhada por um luxo pouco comum; o puxado, em que ficavam a despensa e a cozinha, o quintal inculto e desprezado, prolongando-se até grande distância” p.27. Logo a seguir a obra nos revela que “As portas constantemente abertas deixavam ver todo o interior da casa (…) p. 27. Guardadas as devidas proporções que à ficção convém, ao ler essas páginas de grande valor sociológico, temos a impressão de já termos visto e admirado a referida residência, assim, a ficção se mistura com a realidade. Não custa acreditar que este casarão e muitos outros serviram de inspiração para a obra do imortal escritor.
O patrimônio cultural da cidade, aos poucos, silenciosamente, rui. E se nada for feito, em breve este e outros prédios sobreviverão apenas nas páginas literárias.
Fonte: Blog Amamos Óbidos / Fotos M. Lino