TRF1 suspende a investigação e a quebra de sigilo telefônico de jornalista pela divulgação de dados de relatório do Coaf
O Tribunal Regional Federal da 1ª Região deferiu medida liminar para suspender a realização de todas as investigações policiais que objetivem a descoberta da fonte de informações do jornalista Murilo de Queiroz Ramos na elaboração da matéria que utilizou dados fiscais protegidos pelo sigilo constitucional de diversas pessoas, e que constavam do relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf)/Ministério da Fazenda. O delito que teria ocorrido, em tese, era o previsto no art. 325 do Código Penal, praticado por servidor público que seria a fonte do jornalista.
A decisão foi proferida pelo desembargador federal Ney Bello, que cassou a decisão de quebra do sigilo das comunicações telefônicas, ordenou a manutenção do lacre de todos os registros telefônicos até o julgamento final do Habeas Corpus e determinou ao juiz coator que oficiasse a operadora de telefonia para que se abstenha de remeter àquele juízo quaisquer informações, em face da cassação da decisão.
O HC foi impetrado por José Perdiz de Jesus e pela Associação Nacional de Editores de Revista (Aner) em defesa do direito fundamental à liberdade de imprensa e do direito à preservação e sigilo da fonte.
Inicialmente, o desembargador Ney Bello questiona se é licito quebrar o sigilo das comunicações telefônicas de jornalista não investigado com o “claro intuito de descobrir qual agente público serviu-lhe de fonte, dando-lhe acesso à informação sigilosa que guardava ou à qual tinha acesso”.
O magistrado sustenta que há uma nítida diferença entre imunidade e direito ao sigilo da fonte, e que o jornalista – embora tenha direito ao sigilo acerca da origem da notícia – não é imune à prática de crimes no processo de descobrimento da notícia. Destaca que o profissional de imprensa possui direito constitucional ao sigilo da fonte e – por isso – não é juridicamente possível utilizar-se de “métodos investigativos sobre o detentor do direito ao sigilo para obter a identidade de quem lhe entregou a notícia”.
Ney Bello sustenta que não é sempre que o direito ao sigilo da fonte prevalece, e Indaga: “Deverá ser protegido o direito ao sigilo da fonte ou o direito à vida de diversas pessoas? Se acaso a fonte do jornalista venha a ser um homicida na iminência de um crime ou um terrorista na iminência de um ataque, que direito ou que dever ou qual interesse deverá prevalecer”?
No caso concreto, porém, diz o magistrado que nenhum valor possui “peso idêntico ou maior que o direito ao sigilo da fonte. O dever de investigar atos ilícitos praticados por terceiros não tem mais peso com nstitucional que o direito a uma imprensa livre. Se é certo que a sociedade precisa de segurança jurídica, também é certo que precisa de uma imprensa sem medo e sem amarras para que persiga o seu desiderato republicano e democrático”.
Segundo o desembargador, as hipóteses de ruptura constitucionalmente autorizadas da concretização do direito ao sigilo da fonte só devem se dar em casos “onde saltar aos olhos um interesse constitucional e social maior do que a proteção da fonte da notícia. Investigar atos ilícitos pretéritos decididamente não é uma dessas hipóteses”. Ney Bello pondera que o sigilo da fonte deve prevalecer – neste caso específico – sobre o dever de investigar a terceiro. Isto se dá por ser, no caso concreto, valor e direito de peso maior que o dever estatal de investigar o delito do art. 325 do Código Penal, praticado por servidor público desconhecido que deu à imprensa dados bancários sigilosos.
O magistrado também afirma que, “ainda que não se tratasse de jornalista, não haveria hipótese jurídica de quebra de sigilo das comunicações pela só razão de não ser o paciente investigado. Aquele que não é suspeito de crime não se submete às medidas impostas na Lei nº 9.296/96”.
Concluindo, o desembargador argumentou que “o jornalista pode cometer crime e pode ser investigado como todo e qualquer cidadão, mas não pode ser investigado exclusivamente para a obtenção da identidade da fonte quando não for suspeito de delitos”.
(Com informações do Tribunal Regional Federal da 1ª Região)