Advogado é preso acusado de “vender” ministros do STJ e do Supremo
Há um esquema antigo que assombra os tribunais brasileiros: golpistas que vendem decisões de juízes, sem sequer combinar com eles. Oferecem a facilidade para um alguém com uma demanda judicial e embolsam o que dizem que serviria como propina. Ao fim, o malfeitor fica rico, e o magistrado é visto como corrupto, mesmo sem estar envolvido com o caso.
Uma nova encenação desse clássico é alvo de uma investigação apelidada, sugestivamente, de mercador de fumaça. No bojo da operação, foi preso, nesta sexta-feira (10/11), um advogado que “vendia” decisões do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal.
Ele teria cobrado R$ 2 milhões de um prefeito afastado do cargo, dizendo que parte do valor seria usada para pagar assessores de ministros e viabilizar uma decisão que devolveria o cargo ao político. Porém, não há qualquer indício de participação de servidores públicos nos fatos investigados.
A medida foi autorizada pela 10ª Vara Federal de Brasília. O Ministério Público Federal pediu a preventiva com o argumento de preservar a ordem pública, pois ele já responde a outros inquéritos pelo mesmo crime, inclusive tendo confessado o esquema de manipulação de decisões judiciais do Tribunal Superior Eleitoral.
Além do mandado de prisão preventiva, a Polícia Federal cumpriu ainda dois mandados de busca e apreensão expedidos pela Justiça Federal.
O investigado será indiciado pelo crime de exploração de prestígio, que prevê pena de reclusão de 1 a 5 anos.
Mercado-fantasma paralelo
Há cinco anos o Ministério Público Federal investiga um mercado de venda de sentenças em Brasília. No mês de setembro o assunto voltou à pauta, com reportagem da revista Veja com mensagens trocadas entre uma advogada e o diretor jurídico da JBS.
Segundo a reportagem, as mensagens do celular de Renata Gerusa Prado de Araújo revelam um “mercado paralelo de tribunais” no qual a advogada aumentava os próprios honorários para dividir o dinheiro com ministros do Superior Tribunal de Justiça. Mas desde 2012 a Polícia Federal e o MPF suspeitam que Renata se especializou em vender fumaça a peso de ouro.
Caiu de gaiato
Em 2012, essa conversa transformou um ministro do STJ em investigado. Cinco anos depois, o inquérito continua aberto, mas em março de 2016 a própria Procuradoria-Geral da República concluiu que não havia indícios da participação do ministro no esquema. Sobrou a suspeita de que a mesma Renata Araújo vendeu uma influência que não tinha — e achou quem comprasse.
Blefe como serviço
A “venda de fumaça”, de tempos em tempos, leva um juiz ao banco dos réus sem que ele tenha feito qualquer coisa além de sua função: julgar. Para aplicá-lo, basta ao malfeitor conhecer alguém com um processo na Justiça e pesquisar, minimamente, como o juiz do caso costuma decidir. Com os dados em mãos, liga-se para o envolvido na ação e o blefe está pronto: “Por uma alta quantia, eu faço o juiz do seu caso julgar a seu favor”. O magistrado de nada sabe e nada ganhará, mas sua decisão acaba de ser vendida.
Se o pagamento for combinado “no êxito”, ou seja, só é efetuado se a decisão realmente for favorável, vira um negócio quase perfeito, pois o “cliente” satisfeito pagará de bom grado e aquele que não teve a demanda atendida não terá do que reclamar, pois nada terá desembolsado.
Esse tipo de negócio já foi duramente criticado pela presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia. Em evento com jornalistas, questionada sobre as gravações usadas na operação “lava jato” com políticos dizendo que tinham ministros “garantidos” no Supremo, a ministra foi direta: “Há blefe o tempo todo”. Ela afirma que esse tipo de discurso é algo quase corriqueiro entre advogados, que querem convencer seus clientes de seus poderes.
Fonte: Conjur