Governo Jatene desvia finalidade na aplicação da taxa mineral

 

O Ministério Público de Contas do Estado do Pará (MPC) apontou grave desvio de finalidade na aplicação da taxa mineral arrecadada pelo Governo de Simão Jatene em 2016: cerca de 94% dos mais de R$ 476 milhões arrecadados pelo Estado com a taxa no exercício “foram manejados para finalidades, órgãos e bens totalmente distintos do exercício efetivo ou potencial do poder de política mineral”, destaca o parecer de Felipe Rosa Cruz, Procurador Geral de Contas do Estado do Pará. Isso representa um montante de R$ 450 milhões desviados.

O valor arrecadado, segundo o procurador, “por imperativo lógico e legal, deve ser direcionado para o custeio do serviço específico prestado”, no caso em questão, a atividade minerária. E arremata: “tributos com destinação constitucional vinculada como são as taxas e contribuições, não podem servir para o financiamento de matérias estranhas à sua gênese legal, sob pena da mais absoluta inconstitucionalidade”. Felipe é claro: “para o custeio de atividades e serviços gerais do Estado a Constituição reservou o manejo dos impostos… e os valores arrecadados são destinados ao custeio de suas atividades universais, não possuindo vinculação”.

O parecer revela ainda que as secretarias de Estado de Desenvolvimento Econômico, Mineração e Energia (Sedeme), da Fazenda (Sefa), de Ciência, Tecnologia e Inovação (Secti) e de Meio Ambiente (Semas) que, pela Lei, têm de exercer a fiscalização da atividade, utilizaram apenas 6,29% do total arrecadado pela taxa mineral em 2016, mostrando claramente o uso ilegal do recurso.

DOCUMENTO

O documento detalha que, do total arrecadado em 2016, R$ 207,9 milhões foram utilizados para despesas de diversos órgãos do governo, entre eles o Departamento Estadual de Trânsito (Detran), Secretaria Estadual de Desenvolvimento e Obras Públicas (Seop) “o que culminou no desvio de 43,96% do produto de arrecadação da taxa mineral para fins absolutamente estranhos da sua razão criadora”, destaca o procurador.

Os recursos foram usados para restauração e construção e rodovias, reforma de unidades prisionais, concessão de auxílio alimentação e transporte, além de serem utilizados para custear despesas de capital “sem qualquer vinculação a aplicações referíveis ao poder de política mineral”, destaca o parecer, com o relator afirmando que a taxa mineral “vem financiando parcialmente matérias e instituições totalmente estranhas ao seu fato gerador… que degenera o destino que o ordenamento jurídico lhe reservou”, acabando por transformar a taxa num imposto.

De outro lado, R$ 254 milhões não foram utilizados e serviram para ajustar o superávit primário e financeiro do Estado, ou seja, para fazer caixa para o governo, mas que, segundo o parecer, só poderiam ser utilizados para finalidade a que se destina a taxa: o financiamento da fiscalização mineral.

PARA ENTENDER

A Taxa de Controle, Acompanhamento e Fiscalização das Atividades de Pesquisa, Lavra, Exploração e Aproveitamento dos Recursos Minerários (TFRM) foi instituída pela Lei Estadual nº7.591/2011 e regulamentada no Decreto nº 386/2012 e, por sua natureza, são vinculadas na remuneração de uma atividade específica, serviço ou exercício do poder de polícia. Ou seja, os recursos da taxa só podem ser utilizados para a fiscalização, acompanhamento e autorização do serviço prestado pelas empresas mineradoras que atuam no Pará.

2015

A situação é a mesma cometida no exercício de 2015, quando o governador Simão Jatene “torrou” R$ 202,5 milhões dos recursos da taxa para pagar despesas relacionadas a obras e pessoal, burlando a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). O valor desviado por Jatene de sua finalidade em 2015 representou quase a metade dos R$ 414 milhões arrecadados pelo Estado por meio da taxa naquele ano .

Procurador critica contratação de temporários

Apenas 47,1% da população paraense tem acesso a água encanada (Foto: Celso Rodrigues)

A política de recrutamento de pessoal foi criticada no relatório por Felipe Cruz, no que se refere às contratações temporárias. O parecer condena “a prática reiterada e sistêmica do governo do Estado, que já se arrasta por mais de uma década, de contratar servidores públicos temporários em detrimento daqueles recrutados sob as rédeas do concurso público”.

O procurador lembra que entre 2012 e 2016 o Estado do Pará teria admitido mais de 26 mil temporários para diversas funções, número quatro vezes maior que o de concursados no mesmo período, e afirma que “o gestor estadual precisa alinhar a sua política de recrutamento de pessoal com o princípio constitucional do concurso público”.

Na área de saneamento, o parecer informa que o Relatório de Análise de Contas encaminhado pelo governo ao Tribunal de Contas do Estado (TCE) informa que “o programa de Saneamento Básico não atingiu nenhuma meta estabelecida das 7 ações planejadas, apresentando o pior desempenho entre
os programas em 2016”.

SANEAMENTO

A situação se torna extremamente grave quando o Sistema Nacional de Informações Sobre Saneamento (SNIS) mostra que só 47,1% da população paraense tem acesso a água encanada (24º lugar entre as 27 unidades da federação) e que apenas 4,9% do esgoto é coletado no Pará, colocando o Estado na 25ª colocação.

Apesar das irregularidades de remanejamento ilegal de recursos da taxa mineral, “prática reiterada e sistêmica” de contratação de temporários; e do não atingimento de metas estabelecidas pelo próprio governo na área de saneamento básico, a análise o MPC foi pela regularidade das contas, com expedição de recomendações e determinações a serem cumpridas pelo governo do Estado.

A publicação das inúmeros inúmeras determinações e recomendações feitas pelo TCE e MPC, ocorreu em 2017. O governo teria 180 dias, a contar da data de publicação, para apresentar ao TCE as providências adotadas para atender as recomendações.

O prazo encerrou dia 24 de novembro do ano passado e, segundo o deputado Ozório Juvenil (MDB), integrante da Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária (CFFO) da Assembleia Legislativa do Estado (Alepa), nada foi apresentado pelo governo do Estado.

Juvenil já solicitou à comissão que os secretários que tiveram relação direta com os gastos fossem convocados à comissão para explicar as situações apontadas no relatório. “Dos secretários da Saúde e Educação, por exemplo, queremos saber os motivos das duas áreas estarem tão ruins no Pará”, informa.

FISCALIZAÇÃO

Ele explica que a taxa mineral foi criada e aprovada para ser aplicada na fiscalização das empresas que atuam no Estado. “Hoje a taxa está sendo usada até para custeio, para pagar gratificação de servidor público, o que é proibido por lei, num claro desvirtuamento de seu uso. Ao mesmo tempo o governo cria uma desvinculação da utilização da taxa”.

O deputado lembra que são os impostos que devem pagar as despesas gerais do Estado. “A taxa não pode ser desvirtuada para pagamento de despesas gerais. O governo precisa explicar isso”. Juvenil lembra que o Estado tinha até o final de 2017 para indicar as medidas e fazer as correções nas pendências apontadas no relatório do MPC e informar ao TCE. “Até o momento isso não ocorreu”.

Fonte: Diário do Pará

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