Justiça mantém bloqueio de r$ 72 milhões da Ourominas de Santarém
Posto de compra de ouro da empresa em Santarém continua fechado
A Ourominas Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários LTDA (Ourominas DTVM) pediu à Justiça Federal que suspendesse o bloqueio de bens a que ficou sujeita depois da descoberta de que sua subsidiária em Santarém comprou grandes quantidades de ouro de garimpos ilegais da região oeste do Pará. A Justiça negou o pedido e manteve o bloqueio, que atinge R$ 72 milhões do patrimônio da empresa.
O valor foi calculado com base no aproveitamento econômico apenas do posto de compra de ouro de Santarém. A empresa, ao pedir o levantamento do bloqueio, argumentou que o valor era desproporcional ao seu valor de mercado e que poderia acarretar na extinção da Ourominas DTVM. Mas não apresentou nenhum documento para comprovar tais alegações.
Em síntese, a Ourominas afirma que o bloqueio corresponde a quatro vezes o seu patrimônio líquido; pede que a Justiça envie ofício à Comissão de Valores Mobiliários para confirmar sua situação financeira; e diz que não tem responsabilidade pela conduta de seus representantes em Santarém.
A decisão judicial ressalta que, embora apresente tais alegações, a empresa não juntou qualquer documentação comprobatória que as confirmem, como extratos bancários, balancetes, demonstrativos contábeis. “Assim, indefiro o pedido, ressalvada a possibilidade de sua reapreciação, caso juntados documentos comprobatórios. No mais, incabível a este juízo diligenciar, junto à CVM ou qualquer outro órgão, informações sobre as informações financeiras da requerente”, diz a decisão.
A decisão faz a ressalva de que o bloqueio de bens atinge a Ourominas nacionalmente, mas a suspensão das atividades vale apenas para o posto de compra de ouro de Santarém, de responsabilidade de seus representantes locais. A empresa pode continuar operando em outros locais do país e através de outros representantes.
O bloqueio de bens da Ourominas foi fruto de investigação conjunta do MPF e da Polícia Federal. No início do mês, foram feitas buscas e apreensões em vários endereços em Santarém e Itaituba, como parte de uma operação para combater a venda de ouro extraído ilegalmente na região do Tapajós.
Em Santarém, os investigadores concluíram que, em dois anos, entre 2015 e 2017, o posto de coleta de ouro da Ourominas comprou mais de R$ 72 milhões em ouro ilegal. Em 2015, 100% do ouro comprado pelo posto era de origem clandestina. A Justiça Federal ordenou o bloqueio de bens de Raimundo Nonato da Silva, da Ourominas e da RN da Silva Representações, principais investigados nesse caso. Todas as transações comerciais e bancárias foram feitas com utilização do CNPJ da Ourominas nacional. Entre os crimes investigados, há usurpação de bens da União, falsidade ideológica, receptação qualificada e organização criminosa.
As investigações foram iniciadas após operações de combate a garimpos ilegais de ouro na zona de amortecimento da Terra Indígena Zo’é, uma região no entorno do território indígena onde são vedadas atividades de exploração madeireira ou garimpeira. As operações reuniram MPF, PF, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) e Fundação Nacional do Índio (Funai). Os garimpeiros flagrados trabalhando nas áreas clandestinas revelaram em depoimentos à PF que vendiam o ouro extraído ilegalmente para a Ourominas em Santarém, que exigia apenas o CPF e o RG do vendedor, dispensando as exigências previstas em lei para atestar a origem do ouro.
Os investigadores constataram que a prática de comprar ouro sem documentação de origem correspondeu a 100% do ouro comprado pela Ourominas, no escritório de Santarém, em 2015. Para fazer frente ao volume de negociações, de acordo com depoimentos obtidos, eram feitos saques diários de R$ 500 mil.
A bacia do rio Tapajós está no topo do ranking de garimpo ilegal no Brasil. São centenas de garimpos ilegais, muitos dentro de áreas protegidas como Terras Indígenas e Unidades de Conservação. Nesses locais verificam-se condições de trabalho insalubres, exploração sexual, despejo de material tóxico (metais pesados) diretamente nos rios e igarapés, contaminando fauna, flora e comunidades humanas, com impactos sobre a organização social de povos indígenas e as condições ambientais.
ASSEMBLEIA REÚNE REPRESENTANTES DE 25 POVOS INDÍGENAS KARIB DA CALHA NORTE AMAZÔNICA: Representantes de cerca de 25 povos indígenas que vivem em territórios de ocupação ancestral na região conhecida como calha norte amazônica, na margem esquerda do rio Amazonas, entre o Pará e o Amapá estiveram reunidos em assembleia geral, na aldeia Tawanã, no rio Mapuera, dentro da Terra Indígena Katuxyana-Tunayana. O Ministério Público Federal (MPF) participou dos três dias de debates, entre 14 e 16 de maio de 2018. Um dos principais temas foi a consulta prévia, livre e informada a que povos indígenas têm direito de acordo com a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho.
O procurador da República Camões Boaventura e o assessor do MPF Rodrigo Magalhães Oliveira conduziram uma oficina sobre o direito de consulta e consentimento em caso de obras e projetos que afetem povos indígenas. A oficina trouxe relatos de casos concretos de construção de protocolos, como o que foi elaborado pelo povo Munduruku, do Tapajós, em que estão estabelecidos os princípios pelos quais eles devem ser consultados. A oficina teve tradução simultânea nas línguas waiwai e tiriyó e teve o apoio do Instituto de Pesquisa e Formação Indígena (Iepé).
Os povos da região da calha norte estão discutindo internamente a elaboração de seus próprios protocolos de consulta e apresentaram, durante a assembleia, a memória das obras e projetos impostos pelo regime militar brasileiro com graves danos, incluindo a remoção forçada de indígenas para o Parque do Tumucumaque pela Força Aérea Brasileira. De acordo com dados dos próprios indígenas, são 25 etnias que vivem em seis territórios ao longo das calhas dos rios Mapuera, Trombetas, Katxuyru, Kaxpacuro, Nhamundá, Paru D’Oeste e Paru D’Leste.
Além dos debates sobre consulta prévia, livre e informada, foi discutida a questão da demarcação da Terra Indígena Katxuyana-Tunayana. Parte das famílias desse território sofreu deslocamento compulsório pela ação do governo ditatorial e de missões religiosas, mas retornaram à calha do rio Trombetas, retomando territórios de ocupação tradicional. Os estudos para a demarcação dessa terra se iniciaram em 2003 e o Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação (RCID) foi publicado em 2015. O relatório não teve nenhuma contestação e tem parecer favorável da procuradoria federal especializada da Fundação Nacional do Índio (Funai). O procedimento de demarcação ficou parado na presidência da Funai com a recente troca de comando, mas após ofício do MPF (veja aqui), foi encaminhado esta semana para o Ministério da Justiça, que dá a palavra final sobre a demarcação,
Ângela Katxuyana afirmou que a resistência do povo Kahyana começou em 26 de setembro de 1968, data em que houve o deslocamento compulsório para o Parque Indígena do Tumucumaque.
Emocionada, a liderança lembrou: “Nos separaram do Kuhá (rio Trombetas), nos separaram de nossas terras, dos nossos parentes”, “lá não tinha floresta”, “passamos a viver de favor na terra dos parentes Tiriyó, e isso foi muito duro”. Com pesar, lembrou que sua avó morreu de depressão ao chegar em uma terra muito diferente da sua, sem a densa floresta. Destacou que o episódio está na memória dos antepassados e das gerações presentes.
Saúde indígena – O terceiro dia da assembleia foi dedicado às questões da saúde indígena, com a apresentação do projeto de construção da nova Casa de Saúde Indígena (Casai)e de um novo Pólo Base para o atendimento da saúde indígena em Oriximiná, que já foi aprovado pelo Conselho Distrital de Saúde Indígena (Condisi) e está em fase de elaboração dos projetos estrutural, elétrico e terraplanagem. A obra está avaliada em R$ 4 milhões. Também foi informada a construção de um posto de saúde na aldeia Mapuera, para atendimento dos indígenas da região.
Em julho de 2017, o MPF fez uma inspeção surpresa nas instalações da Casai e do Polo Base do Distrito Sanitário Indígena em Oriximiná e constatou uma grave situação de precariedade, com falhas graves na infraestrutura dos prédios, no serviço nas aldeias, insuficiência das equipes de atendimento, riscos de atraso na execução do plano distrital de saúde indígena, entre outros pontos críticos. A inspeção resultou em um relatório (confira aqui) que ajudou a apressar o encaminhamento das obras para as novas estruturas, agora prestes a começar.
Os indígenas destacaram a precariedade do transporte até as Aldeias Ayaramã (mais a montante no rio Trombetas, leva-se até cinco dias e 250 litros de gasolina para chegar a partir da aldeia Mapuera) e Turuni. Os Tiriyó informaram que o acesso às aldeias do parque do Tumucumaque é feito exclusivamente por transporte aéreo, e que várias aldeias estão sem cobertura para casos de emergência, porque as pistas de pouso não estão regularizadas. Os indígenas solicitaram a contratação de agentes indígenas de saúde para as Aldeias Ayaramã e Tamiuru, bem como de barqueiros para as aldeias Ponkuru, Tamiuru e Inajá. Nos dois primeiros casos, os indígenas pleitearam também a construção de postos de saúde, uma vez que os atendimentos estão sendo feitos em locais precários e improvisados. Com informações do MPF.
Fonte: RG 15/O Impacto