Vídeo – Procuradora: “Amazônia Protege vai ajudar a combater desmatamentos”
Dra. Luísa Sangoi fala, também, sobre servidores que se corrompem e enveredam para o crime
Nossa reportagem entrevistou a Procuradora da República, Dra. Luísa Astarita Sangoi, que falou sobre um projeto muito interessante chamado Amazônia Protege. Veja a entrevista:
Jornal O Impacto: Como é que funciona e qual a importância do Projeto Amazônia Protege para o monitoramento para preservação da Amazônia?
Dra. Luísa: O Amazônia Protege é uma iniciativa da 4ª Câmara do Ministério Público Federal, por meio do Procurador Daniel Azeredo, que teve a ideia de utilizar imagens de satélite para conseguir verificar a existência de desmatamento em determinadas áreas. A ideia é utilizar a tecnologia a nosso favor. A gente sabe que o Ibama, apesar de esforços, acaba tendo uma deficiência muitas vezes de estrutura, e existem locais na Amazônia que são muito distantes, então, é muito difícil de acertar esses locais, o que torna difícil a lavratura de auto de infração e de servidores chegarem até o local. Só que com a tecnologia, a gente consegue verificar por imagens de satélite os locais e o desmatamento acontecendo ao longo do tempo. Por isso, se torna desnecessário o Ibama ir ao local. Até porque muita vezes ele chega no local, não encontra ninguém, a área em questão está desmatada e sem vegetação, fica difícil de se enxergar como a coisa de desenvolveu ao longo do tempo e essas imagens de satélite propiciam exatamente isso, que você verifique a área onde antes tinha essa quantidade de mata e agora tem menos, você vê o desmatamento acontecendo. Como as pessoas se cadastram no CAR (Cadastro Ambiental Rural), a gente consegue saber a quem pertence aquela área, e a partir desses dados conseguimos ajuizamento para pedir a reparação do dano. Essa ação é importante, porque tornando litigiosa essa área, a pessoa encontra mais dificuldade de obter financiamento e continuar degradando o local e a gente consegue obter uma transparência maior. Na ação, caso o proprietário tenha algum problema com o CAR, a pessoa vai indicar quem é o verdadeiro proprietário da área e assim se descobre quem é o proprietário e se há possibilidade de se firmar um TAC (Termo de Ajuste de Conduta). Eventualmente no meio da ação pode haver um acordo para que pessoa regularize, obtendo assim uma responsabilização e um tratamento certo da questão ambiental naquela área. Um dos maiores problemas da Amazônia é a falta de transparência com relação a quem pertence aquela área, que tenha um registro de imóveis que realmente represente o proprietário da área, muitas vezes está no nome de outra pessoa e chega na região a pessoa que não está, apenas algum empregado e você acaba tendo dificuldades em encontrar o proprietário, então, a gente objetiva com isso delimitar exatamente quem é o dono da área, firmar um TAC com essa pessoa para que se consiga descobrir uma maneira de gerir aquela região de um forma ambientalmente sustentável e garantir um desenvolvimento econômico sustentável na Amazônia.
Jornal O Impacto: Muitas vezes a pessoa desmata uma determinada área cometendo um crime ambiental e coloca à venda aquela área. De repente, alguém chega e adquirir aquela área; a responsabilidade é de quem, do que vendeu ou de quem comprou?
Dra. Luísa: Essa é a questão mais séria, por isso a importância do Amazônia Protege para as pessoas que estão interessadas em adquirir o imóvel. O Ministério Público Federal criou um site do Amazônia Protege em que será possível visualizar quais áreas estão com problema na Justiça para que o adquirente saiba disso antes de comprar. Isso é importante, porque a responsabilidade ambiental é objetiva, ou seja, ela não depende de culpa, não precisa ser a pessoa que desmatou e ela acompanha o imóvel. Então, se a pessoa adquirir o imóvel, consequentemente ela vai responder pelo dano ambiental civilmente, e os juízes tenderiam a condenar essa pessoa. É algo interessante, porque o site do Amazônia Protege vai mostrar essa área que está com problemas. A pessoa que vai adquirir não tem como saber que foi desmatada aquela região, então, é uma forma de proteger também o cidadão que está interessado em adquirir imóveis na Amazônia.
Jornal O Impacto: Recentemente a Amazônia apresentou um crescimento do desmatamento justamente aqui no estado do Pará. Quais são os grandes desafios para o Ministério Público, Ibama e os demais órgãos que têm a responsabilidade de fiscalizar e realmente frear essa prática?
Dra. Luísa: Nós do Ministério Público Federal encontramos uma dificuldade bem grande com relação à questão. O esvaziamento do Ibama, que muitas vezes não tem concurso, encontra seu quadro de servidores esvaziado, isso dificulta essa fiscalização no local. As leis ambientais no Brasil existem e são firmes, mas existe uma dificuldade de fiscalização por conta do tamanho da Amazônia, as áreas são muito distantes. O Amazônia Protege entra exatamente nesse contexto, dos órgãos públicos se reinventarem, Ministério Público Federal e Ibama, de tentarem buscar alternativas que hoje a tecnologia nos proporciona para combater o desmatamento apesar de muitas vezes a gente não conseguir acessar determinadas localidades e por meio dessas imagens de satélite, a gente consegue realmente visualizar desmatamentos acontecendo, de uma forma muito mais eficiente do que um servidor que chegasse lá na região, pois você visualiza a progressão temporária do desmatamento na região. É uma coisa que o ser humano não conseguiria fazer. Um servidor ao chegar lá teria que fazer uma análise, isso realmente é bem mais difícil. Você vê as coisas acontecendo através das imagens do satélite. O CAR também é acessível pela internet, através dele você pode ver quem está se autodeclarando proprietário da área, que apresentou documentação e com base nisso a gente consegue obter uma responsabilização ambiental para reparar aquele dano ambiental e principalmente tornar mais clara a propriedade daquela área, porque eventualmente se não for a pessoa do CAR, isso vai acabar aparecendo no processo e o real proprietário da área vai aparecer e isso gera uma responsabilização, algo que é a maior dificuldade no Brasil. A gente conseguiu uma transparência com relação a quem é o responsável por aquela área, coisas que em outros países vemos com clareza pelo registro imobiliário. No Brasil, por conta de um déficit em os nossos registros imobiliários que por sinal não são atualizados, encontramos dificuldades de saber quem é o dono, então, o objetivo é esse, gerar uma transparência com relação ao proprietário daquela área e uma responsabilidade clara com relação a, aquele é o proprietário desde tal data e ele vai se comprometer a determinados compromissos para garantir o desenvolvimento sustentável na Amazônia e não simplesmente desmatar tudo e acabar com nosso terreno e muitas vezes até economicamente inviabilizar a região, desmata e aproveita todo aquele potencial e esgota o terreno que não dá para mais nada.
Jornal O Impacto: Observamos, também, que nessas operações que são deflagradas em conjunto com outros órgãos de segurança, têm acontecido prisões de empresários do ramo que agem de forma clandestina e lamentavelmente como em outras instituições e outros órgão, há um envolvimento em algumas vezes de outros servidores nessas falcatruas e deslizes. Como a senhora avalia essa participação de servidores e como se pode combater isso?
Dra. Luísa: Infelizmente isso acontece em várias instituições públicas. A gente vê no Brasil, acaba acontecendo de alguns servidores se desviarem indo pelo caminho da ilicitude, praticando crimes. Nesses casos, a única maneira de combater esse comportamento de uma forma incisiva, são essas operações na esfera criminal, através da Polícia Federal e Ministério Público Federal. O próprio Ibama que possui bons servidores, que tentam combater lá de dentro mesmo, é o caminho. Não há outro realmente, quando desemboca para esse lado da participação de servidores, é só direito penal mesmo e prisão.
Jornal O Impacto: Muitas vezes são aplicadas multas em madeireiras e até mesmo em outros segmentos do ramo do setor madeireiro e essas multas embora sejam de volumes muito alto, em algumas situações vai protelando e acaba não sendo recolhida, e quando recolhe demorou demais. Isso não facilita a vida dessas madeireiras?
Dra. Luísa: Com certeza. Na verdade, o grande problema em todo setor público do Brasil, seja no judiciário, Ministério Público Federal e Ibama, existe essa burocracia e dificuldade de se obter resultados na Justiça e no próprio MPF. Existe, às vezes, uma demora e eu acho que a tecnologia tende a suavizar isso e o Amazônia Protege se enquadra nessa tendência. Os sistemas, a informatização, a celeridade dos processos é muito importante, a cobrança das multas em tempo hábil, o fato de a gente conseguir atuar de uma forma mais imediata, não temos que esperar que vá algum servidor, diante de uma quantidade tão pequena que existe de servidores do Ibama, que alguém vá na região, em um local super distante, pega um avião. Isso é gasto, é difícil. A dimensão do Brasil é muito grande, tudo dificulta, muitas vezes há falta de orçamento para instituições como o Ibama e Incra fazendo fiscalizações, isso dificulta. Tem vários fatores que dificultam e geram essa morosidade. Na minha opinião, a atuação imediata dos órgãos, uma resposta mais imediata com cobrança de multas, com ações judiciais que têm um trâmite rápido, que se consiga acordos firmados, celeridade no processos, sejam administrativos do Ibama com cobranças de multa, que haja uma cobrança rápida, que tenha um resultado imediato das empresas; que as pessoas físicas ou processos judiciais mais ágeis, respostas mais certas do Ministério Público e de todos órgãos públicos, tendam a modificar essa realidade e eu acredito que o Amazônia Protege dentro dessa tendência de Tecnologia e informatização, tende auxiliar na resposta rápida, evitar que haja o gasto desnecessário com deslocamento de servidores, muitas vezes para nada, quando se possa utilizar imagens de satélite, quando se pode utilizar vários dados que estão na própria internet, que possibilitem uma resposta mais ágil pelo Estado. Finalizou a procuradora.
Por: Edmundo Baía Junior
Fonte: RG 15/O Impacto