Qual é a melhor vacina contra a covid-19? Qual protege mais? A porcentagem de eficácia não é a única variável
Uma eficácia de 90% é melhor do que uma de 70%? A resposta parece óbvia, mas não é tão fácil. As explicações simples não costumam se dar bem com a ciência. Por mais inevitável que possa parecer a preferência pela vacina de maior porcentagem publicada nos estudos, não são números comparáveis e não refletem bem o risco que cada indivíduo tem de sofrer a covid-19 após a inoculação. Os especialistas afirmam que qualquer uma das aprovadas é boa e segura.
No Brasil, a vacina da Janssen foi aprovada pela Anvisa para uso emergencial. O Governo Federal comprou 38 milhões de doses cujas entregas estão previstas para começar no terceiro trimestre, entre julho e setembro. A vacinação com esse imunizante na Europa estava prevista para começar na próxima semana, mas os planos foram adiados pela própria empresa depois que os reguladores dos Estados Unidos recomendaram interromper sua administração. O motivo é a investigação de casos de coágulos sanguíneos que ocorreram em seis cidadãos vacinados, algo semelhante ao que ocorreu com a vacina da AstraZeneca.
Das quatro vacinas aprovadas para uso no Brasil pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) ―duas delas ainda em caráter emergencial―, a Coronavac é a que menor eficácia apresentou nos primeiros resultados: 50,38%. A da Janssen apresentou eficácia de 67%, contra 95% da Pfizer e 76% da AstraZeneca. Mas isso não quer dizer que uma seja pior que a outra.
O que é a eficácia?
Essas porcentagens são os primeiros resultados dos estudos de fase III que cada farmacêutica apresentou. Nesses ensaios os praticantes se dividem em dois grupos: um recebe o fármaco e o outro, um placebo. São experimentos com dezenas de milhares de pessoas que são acompanhadas para comprovar quantas delas se infectam com o SARS-CoV-2. Se 10% dos infectados estavam no grupo vacinado e 90% no placebo, quer dizer que a vacina tem uma eficácia de 90%.
É possível comparar a eficácia das vacinas?
Não, para isso seria preciso realizar um só experimento com todas as vacinas aplicando a cada grupo uma vacina e depois comprovar a porcentagem de infectados em cada um. Mas não se fez assim: é algo praticamente impossível e pouco prático nas circunstâncias atuais. Cada experimento tinha um modelo próprio, um contexto diferente de população e distintas variantes do vírus circulando. Foram estudados em momentos e lugares diferentes, portanto não são porcentagens comparáveis. A vacina da Janssen, por exemplo, foi testada quando já estavam circulando as variantes sul-africana e britânica, mais contagiosas e aparentemente mais resistentes às vacinas, algo que não aconteceu quando a Pfizer e a Moderna realizaram seus testes clínicos. Como diz Federico Martinón, chefe do Serviço de Pediatria do Hospital Clínico Universitário de Santiago, mesmo se as porcentagens fossem comparáveis, realmente não são tão diferentes como pode parecer à primeira vista. “Se olharmos mais detalhadamente os intervalos de confiança, vemos que a eficácia é muito parecida entre diversas vacinas”, acrescenta. Em estatística ―e os testes são medidos dessa forma― o resultado não é um número exato, e sim, na verdade, uma janela deles. Quando se diz que uma vacina tem uma eficácia de 76% se está dizendo que seus resultados oscilam por volta de 76% (por exemplo, de 71% a 81%), e esse intervalo pode coincidir em parte com o de uma vacina da que se disse que tem uma eficácia de 82%, mas cuja margem de erro faz com que o resultado vá de 77% a 87%, por exemplo. Ou seja, se os testes clínicos forem repetidos, as margens estatísticas indicam que os valores estimativos de eficácia entre as vacinas podem coincidir (no exemplo anterior, entre 77% e 81%). Além disso, nos testes clínicos nenhum vacinado morreu de covid-19.
Qual é a mais efetiva?
A eficácia é a porcentagem descrita nos testes clínicos, um conceito diferente ao de efetividade, que se refere à capacidade de deter a doença em populações reais, fora dos experimentos controlados, feitos em pessoas saudáveis. Sempre será, portanto, menor. Ainda é cedo para saber com exatidão a efetividade de cada vacina em um cenário real e até que ponto evitam infecções assintomáticas, mas o que os resultados preliminares estão demonstrando é que todas as que já estão sendo utilizadas têm porcentagens muito altas para evitar a doença grave, internamentos na UTI e mortes. Também não se sabe quanto tempo dura a imunidade, algo que só o tempo dirá.
Como posso saber qual vacina me protegerá mais?
A proteção contra a infecção é importante quando se estudam populações, uma vez que se há uma boa parte da população vacinada com fármacos de alta efetividade, o vírus não poderá continuar se propagando. É o que se conhece como imunidade de rebanho. “As porcentagens de todas as vacinas aprovadas são suficientes para chegar a essa imunidade se a maioria da população for inoculada”, diz Vicente Larraga, pesquisador do Conselho Superior de Pesquisas Científicas (CSIC). “Tradicionalmente, sempre se considerou que uma vacina com uma eficácia de mais de 60% é boa”, acrescenta. Mas individualmente, estar infectado de modo assintomático e muito leve é pouco relevante; é muito mais importante se fixar na proteção contra a doença crítica e a morte, que pelos dados conhecidos é semelhante, e muito alta em todas elas.
Fonte: El País