Projeto em Ponta de Pedras deve ser suspenso até que comunidades sejam consultadas, recomenda MP

A 13ª Promotoria de Justiça de Santarém expediu Recomendação nesta sexta-feira, 15 de outubro, para que o Município e as secretarias de Meio Ambiente e de Infraestrutura suspendam ou se abstenham de emitir qualquer autorização/licença para a instalação do Complexo Turístico da Vila de Ponta de Pedras, até que seja realizada a consulta prévia das 19 comunidades tradicionais localizadas na região Eixo Forte, que sofrerão os impactos diretos e indiretos do empreendimento, nos termos da Convenção 169 da OIT, além de outras medidas. A vila é um balneário às margens do rio Tapajós e fica a aproximadamente 37 quilômetros de Santarém, inserida na Área de Proteção Ambiental Alter do Chão.

A Recomendação é da promotora de Justiça Lílian Braga, titular da 13ª Promotoria de Justiça de Meio Ambiente de Santarém. O projeto foi anunciado pela prefeitura de Santarém. Na primeira etapa deve constar um muro de arrimo em gabião, calçadão em concreto estampado; urbanização ao redor das barracas, reordenamento das barracas, feira de artesanato e banheiros públicos. Conforme informações prestadas ao MPPA pela Federação das Associações de Moradores, Comunidades e Entidades do Projeto de Assentamento Agroextrativista do PAE Eixo Forte (FAMCEEF), não foi realizada a consulta prévia, livre e informada das comunidades locais que poderão ser afetadas com a construção.

O município já deflagrou processo licitatório na modalidade Tomada de Preços (nº 004/2021-SEMINFRA) para a obra de construção do Complexo Turístico, sem consultar as 19 comunidades sobre a sua pertinência e a afetação na dinâmica da vida das localidades. A Seminfra já protocolou na Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Santarém a solicitação de Licença Prévia para a obra (nº 2021.LP.0000709).

A promotoria considera que o projeto poderá afetar diretamente a paisagem local, interferindo nos objetivos da APA Alter do Chão e na faixa de Área de Preservação Permanente às margens do Rio Tapajós. O balneário de Ponta de Pedras recebe esse nome por conta das formações rochosas peculiares que emergem e submergem à beira da praia, durante os períodos de cheia e de seca do Rio Tapajós, representando um dos maiores referenciais turísticos do município, além de sediar uma popular manifestação cultural da região, o tradicional Festival do Charutinho.

A APA constitui Unidade de Conservação de Uso Sustentável e tem como objetivos básicos proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais (Lei nº 9.985/00). A APA Alter do Chão, criada pela Lei Municipal n.º 17.771/2003, possui 16.180,00 hectares, abrangendo as comunidades do Caranazal, São Raimundo, São Pedro, Jatobá, São Sebastião, Ponta de Pedras e a vila de Alter do Chão.

O licenciamento ambiental é o procedimento destinado a licenciar atividades ou empreendimentos utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental. Durante o procedimento, está previsto a realização de audiência pública para informar sobre o projeto e discutir os estudos, sendo um instrumento de participação popular fundamental no processo de Avaliação de Impacto Ambiental (AIA), conforme as Resoluções CONAMA 01/86 e 009/87. O poder público também deve realizar estudos junto as comunidades tradicionais interessadas, com o objetivo de avaliar a incidência social, espiritual e cultural e sobre o meio ambiente que as atividades de desenvolvimento, previstas, possam ter sobre esses povos, conforme art. 7°, 3 e 4, da Convenção 169/OIT.

Recomendações

A promotoria recomenda ao prefeito de Santarém e aos secretários de Meio Ambiente e de Infraestrutura, que suspendam ou se abstenham de emitir qualquer autorização/licença para a instalação do Complexo Turístico da Vila de Ponta de Pedras, até que seja realizada a consulta prévia, livre e informada das 19 Comunidades Tradicionais localizadas na Região Eixo Forte, que sofrerão os impactos diretos e indiretos do empreendimento, nos termos da Convenção 169 da OIT.

E que promovam audiências públicas para informar as comunidades tradicionais do Eixo Forte e da APA Alter do Chão sobre o projeto e seus impactos socioambientais, e discutir acerca dos estudos ambientais, com o objetivo de dirimir dúvidas e recolher as críticas e sugestões a respeito, abordando, especialmente, dez aspectos que são listados na Recomendação, incluindo o conhecimento de todas as comunidades sobre a arquitetura do projeto, se concordam e se veem benefícios; se o mesmo está alinhado com a realidade socioambiental e paisagística da vila de Ponta de Pedras; se as comunidades têm projetos de implantação de complexo turístico a partir de outros projetos arquitetônicos e outras questões.

O MPPA recomenda que as audiências públicas sejam amplamente divulgadas, inclusive na imprensa, e devem ocorrer em local acessível aos interessados. Os destinatários devem se abster de realizar qualquer atividade de instalação/construção até que seja realizada a consulta, além de elaborar estudos junto aos povos interessados, com o objetivo de se avaliar a incidência social, espiritual, cultural e sobre o meio ambiente que as atividades de desenvolvimento previstas possam ter sobre esses povos, nos termos do art. 7°, 3 da Convenção 169/OIT.

Recomenda ainda que adequem o projeto aos objetivos da APA Alter do Chão, definidos no art. 4º da Lei Municipal nº 17.771/2003, especialmente no que diz respeito à manutenção das paisagens naturais e dos atributos culturais relevantes, e, ainda, para fomentar o Turismo de Base Comunitária na região, que possui como princípios, dentre outros, a conservação da sociobiodiversidade, a valorização da história e da cultura local e o protagonismo comunitário.

Os recomendados devem informar ao Ministério Público, no prazo de cinco dias, quais providências foram adotadas para o atendimento da Recomendação, e encaminhar para a 13ª Promotoria de Justiça o cronograma de audiências públicas e consultas prévias para tratar sobre o projeto, com antecedência mínima de 45 dias do início das oitivas.

A omissão na remessa de resposta no prazo será considerada como recusa ao cumprimento da Recomendação, ensejando a adoção das medidas legais pertinentes, inclusive, ação de improbidade administrativa em face do gestor público responsável.

Turismo de Base Comunitária

Conforme indicativo do ICMbio, nos últimos anos cresceu a demanda dos povos e comunidades do interior ou entorno das Unidades de Conservação, por atividades de turismo. O Turismo de Base Comunitária é um modelo de gestão protagonizado pela comunidade, gerando benefícios coletivos, promovendo a vivência intercultural, a qualidade de vida, a valorização da história e da cultura dessas populações, e a utilização sustentável para fins recreativos e educativos, dos recursos da Unidade de Conservação. As comunidades da região do eixo forte, por suas características naturais e paisagísticas, já receberam capacitação para ser desenvolvido em seu território o turismo de base comunitária, que viabilizaria a produção de renda para as famílias locais.

Os associados da FAMCEEF, a qual representa 19 comunidades da Região do Eixo Forte, dentre as quais: São Raimundo, Jatobá, Nova União, Ponta de Pedras, Santa Rosa, Irurama, Santa Luzia, São Francisco do Carapanari, São Sebastião, Pajuçara, Santa Maria, Fátima do Urucurutuba, Ramal dos Coelhos, e outras, procuraram o MPPA demonstrando interesse em participar das discussões do empreendimento, tendo em vista que poderão ser afetados direta ou indiretamente pelo projeto. (Com informações do MPPA)

O Impacto

 

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