Eymar Franco receberá homenagem da ALAS
O presidente da Academia de Letras e Artes de Santarém (ALAS), Ednaldo Rodrigues, confirmou a Sessão da Saudade promovida pela entidade, na sexta-feira (23/07), às 17h, na sala histórica de Júri do Centro Cultural João Fona, para homenagear o escritor Eymar da Cunha Franco, que faleceu no dia 12 de abril de 2011. Eymar Franco fazia parte dos primeiros integrantes da ALAS, que ingressaram no dia 28 de dezembro de 2004, ocupando a Cadeira Nº 13, que leva o nome do poeta Genesino Braga.
O presidente também informou que os integrantes da ALAS elegeram o historiador Hélcio Amaral de Sousa para falar sobre a vida e a obra de Eymar Franco, em nome da Academia. Em nome da família vai falar a viúva do escritor, Cecília Tavares Franco. Os demais acadêmicos presentes na sessão, como de costume, vão fazer seus pronunciamentos em homenagem ao ex-acadêmico.
A sessão da saudade organizada pela ALAS é uma solenidade voltada a parentes e amigos do homenageado. Trata-se de um evento fechado que marca a despedida do escritor. No encerramento do evento, o presidente da entidade decreta vacância na cadeira de Nº 13 e de acordo com o Estatuto Social da Academia, a diretoria tem até seis meses para recompor o quadro social de membros efetivos.
O ex-burocrata da ONU que “dialoga” com a Matinta Perêra (*)
Pouso Alto. A velha placa de madeira à beira do km 15 da rodovia BR-163, que liga Santarém (PA) à Cuiabá (MT), na localidade rural de Cipoal (um “quase” bairro de Santarém), indica o nome do sítio de 5,5 hectares logo à frente. Remete ao nome de uma cidade mineira carregada de uma simbologia esotérica que só pode ser explicada pela emblemática figura de seu morador, um burocrata paraense que no ano 1980 – no auge de uma promissora carreira no exterior – trocou as salas de conferências da ONU (Organização das Nações Unidas) mundo afora, por um retorno às suas origens no rio Tapajós.
O pomar de frutas cítricas (hoje são mais de 500 pés de laranjeiras, limoeiros e tangerineiras, ¼ do que restou dos áureos tempos quando chegou a produzir e exportar para a região) de Pouso Alto, exala um perfume convidativo a quem, como eu, senta na varanda para ouvir estórias (ou histórias?) de seus “diálogos” com a lendária figura amazônica da Matinta Perêra e de sua experiência com a eubiose, uma ramificação brasileira da teosofia, doutrina esotérica que defende a existência de uma fonte única e eterna para todo conhecimento e demonstra a identidade essencial entre os grandes mitos das culturas mundiais.
Prestes a completar 86 anos, em 17 de setembro, Eymar da Cunha Franco é agrônomo aposentado, escritor e poeta (três livros já publicados). Conversa com certa dificuldade, apoiado sempre por sua segunda esposa, a ex-comerciária e prima em segundo grau Ana Cecília Tavares Franco, 30 anos mais nova. “Ela é, hoje, minha razão de viver”, me diz Eymar com um olhar lânguido e apaixonado ao se referir à Cecília, que convive com ele há oito anos. Recuperando-se de uma queda sofrida há dois meses em sua casa e que afetou sua coluna – mas não seu humor – ele resume o momento que vive:
– Cheguei numa fase da vida em que me sinto plenamente realizado e, como diz um amigo, quero que o resto se f…”, diz às gargalhadas, acompanhadas de uma forte tosse proveniente do vício de fumar pelo menos um maço de cigarros por dia e de um olhar repreensivo, e ao mesmo tempo cúmplice, da esposa, por proferir um palavrão na frente do jornalista.
Pertencente à família Franco, o menino nascido na fazenda Urucurituba, no município de Aveiro, a 12 horas de barco de Santarém, aos nove anos seguiu para estudar na capital do Estado, iniciando seu vôo alto na careira internacional. Hoje, é um velho sábio que faz da crendice popular sua melhor companheira no Pouso Alto.
Códex Alimentarius – Combinando a erudição adquirida nas viagens a diversos países do mundo com a sabedoria do povo amazônida e suas lendas, Eymar relembra o espírito empreendedor de seu bisavô, Alberto José da Silva Franco, comerciante português que chegou ao Pará em 1836, no meio da revolução popular conhecida como Cabanagem (1835/1840) que combatia a elite lusitana no poder. Em seu livro de memórias “O Tapajós que eu vi” (ICBS, 1998), ele conta que o patriarca dos Franco foi um das centenas de portugueses que saíram de Belém naquele período e refugiaram-se na região. Às margens do rio Tapajós, adquiriu uma área de terra onde até hoje existe uma Casa Grande, símbolo do Brasil Império. Mas foi para lá que ele pediu para voltar, no momento em que representava o Brasil em importantes grupos de estudo mundiais.
Eymar foi funcionário por mais de 40 anos do Ministério da Agricultura, passando por diversas funções até ser indicado para representar o Brasil no Códex Alimentarius, fórum internacional de normalização de alimentos estabelecido pela FAO e OMS, órgãos das Nações Unidas para a agricultura e saúde, respectivamente. Criado em 1963 com a finalidade de proteger a saúde dos consumidores e assegurar práticas eqüitativas no comércio regional e internacional de alimentos, o Códex obrigou Eymar a participar de incansáveis reuniões nos EUA, Suíça e dezenas de outros países, além das viagens por todos os estados brasileiros para disseminação das normas. Isso levou o velho agrônomo, especializado em controle de produtos vegetais e com faro adquirido na vida da fazenda, a preferir o retorno para assumir a Base Física do Ministério da Agricultura em Fordlândia (Aveiro), sob protestos de sua chefia que o considerava louco.
Na área adquirida pelo magnata americano Henry Ford, para a implantação de um mal sucedido empreendimento de produção de látex nas primeiras décadas do século passado e reassumida pelo governo brasileiro já em decadência, Eymar aliou seu conhecimento e responsabilidade para liderar os ociosos trabalhadores que sequer cuidavam da preservação da Vila Americana, um casario de madeira no meio da floresta com arruamento e sistema de água e luz que muitas cidades amazônicas não tinham. Depois de revitalizar a vila, Eymar decidiu se estabelecer em Santarém.
Diálogos com Matinta – “Sou cético em relação à política e à situação que vejo no país e na Amazônia”, declara Eymar ao explicar sua “mania de conversar com a Matinta Perêra”. Ele afirma que os “diálogos” são “uma fuga dessa realidade que nos cerca, através da alegoria amazônica”. A lenda da Matinta Perêra é uma das histórias que ouvia dos caboclos do Tapajós desde menino. Nos “diálogos”, muitos deles já publicados em jornais locais, Eymar “discute” alguns problemas da atualidade com a Matinta, personagem da mitologia amazônica representada por uma velha vestida de preto, com os cabelos bastante assanhados caídos no rosto, que costuma sair ao escurecer, de preferência nas noites sem luar, em busca de tabaco e assustando as pessoas através de um forte assobio.
“Dia desses”, fala sério Eymar, “a Matinta andou me dizendo que não gosta do George Bush, pois ele é um perigo para a Amazônia”. Quão sábia é a Matinta, penso eu. Outro dos “diálogos”, que estão sendo reunidos para a produção de um livro de crônicas, faz da Matinta sua cúmplice no ato de fumar:
Fonte: RG 15/O Impacto