Empresa é condenada a pagar R$ 800 mil por não contratar jovem aprendiz

A Endicon Engenharia de Instalações e Construções S.A, foi condenada a pagar indenização por dano moral coletivo, no valor de R$ 800 mil.

De acordo com os autos, a empresa não realiza a contratação de aprendizes conforme as cotas previstas na legislação vigente.

A decisão foi da juíza Giovanna Correa Morgado Dourado, titular da 2ª Vara do Trabalho de Santarém, no âmbito da Ação Civil Pública (ACPCiv 0000587-94.2023.5.08.0122) movida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT).

Conforme a sentença, a empresa deve admitir  em todos os seus estabelecimentos no estado do Pará, “aprendizes matriculados em cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem ou, supletivamente, em escolas técnicas ou entidades sem fins lucrativos, no importe mínimo de 5% e máximo de 15% dos seus trabalhadores  cujas funções demandem formação profissional e estejam elencadas na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), inclusive de motorista e eletricista, observada a proporção de seus empregados, conforme CAGED[Cadastro Geral de Empregados e Desempregados]”.

A Endicon deverá comprovar o cumprimento da obrigação de fazer no prazo de 60 (sessenta) dias, sob pena de multa diária de R$1.000,00 por cada aprendiz não contratado, incidente até a data da efetiva contratação e limitada ao valor de R$200.000,00 (duzentos mil reais) pela totalidade de aprendizes não admitidos.

Os valores deverão ser revertidos em favor de instituição filantrópica indicada, oportunamente, pelo Ministério Público do Trabalho, após o trânsito em julgado da condenação.

“(…) caberá ao órgão ministerial fiscalizar o cumprimento da decisão, especialmente em relação à quantidade de aprendizes contratados pela reclamada, observadas as diretrizes do art.429 da CLT e a totalidade de empregados e atividades de natureza técnico-profissional oferecidas pela reclamada [Endicon]”.

Além da indenização por danos morais coletivos de 800 mil reais, a empresa também arcará com os custos processuais, estabelecidos no valor de R$ 16.773,57.

A Endicon, que se encontra em recuperação judicial, pode recorrer da sentença proferida em novembro de 2023.

A denúncia e apuração da Procuradoria do Trabalho de Santarém

O Ministério Público do Trabalho informou que foi instaurado, no âmbito da Procuradoria do Trabalho no Município de Santarém, o Inquérito Civil nº 000031.2020.08.003/1, autuado a partir de denúncia anônima, na qual houve o relato de que a Endicon infringe os ditames legais trabalhistas, atinentes à cota legal de aprendizagem.

Conforme o fiscal da lei, com vistas a aprofundar as investigações, notificou a empresa para apresentar os documentos, o que foi atendido.

Na análise da documentação, foi observado que a empresa possui 4.758 empregados, mas defende que a base de cálculos da cota de aprendizagem deve ser de apenas 393 funcionários, tendo em vista que estariam excluídos da referida base o total de 4.365 empregados, isto é, 3.988 exercentes de funções que entende “periculosas” e 377 que exercem funções de confiança.

Ainda de acordo com o MPT, a Endicon apresentou a comprovação de contratação de apenas 21 aprendizes por entender que a base de cálculo deveria levar em conta apenas 393 funcionários, e assim, estaria cumprindo o quantitativo de contratações de aprendizes, em razão do acórdão proferido na ação anulatória de autos infracionais (nº 0000964-10.2018.5.08.0003) que excluiu da base de cálculo da cota de aprendizes as funções perigosas e de risco, a exemplo de motoristas, leituristas e eletricistas.

Contudo, para o MPT, a empresa descumpre a cota legal de aprendizagem, pois, considerando que possui 4.758 empregados, a base de cálculos da cota de aprendizagem deve ser de 4.360 funcionários (excluídos da base apenas os 377 funcionários que exercem funções de confiança e os 21 aprendizes já contratados), devendo, assim, a empresa possuir, ao menos, 218 aprendizes matriculados, consonante o artigo 429 da CLT.

Nos autos, o parquet, narra que, “não obstante as inúmeras tentativas do MPT de retificar a conduta da empresa ou de aferir eventual regularidade de sua conduta, a ENDICON manteve-se inerte face todas as tentativas ministeriais de resolver extrajudicialmente a questão, adotando, assim, postura pouco colaborativa, recalcitrando no não atendimento das solicitações do MPT”.

A Procuradoria do Trabalho de Santarém destaca que a Ação Anulatória de Autos Infracionais, cuida de autos de infração lavrados pela fiscalização trabalhista, no período de 30/09/2015 a 28 /08/2018, referente ao descumprimento da cota naquele lapso temporal e que, por sua vez, os presentes autos cuidam de infrações trabalhistas praticadas pela acionada, atinentes a não comprovação de contratação de tantos aprendizes quantos bastem para cumprir a cota prevista na legislação correlata.

Endicon se defende

Em sua defesa, a Endicon, argumenta  que é uma empresa que atua no seguimento de prestação de serviços e manutenção do sistema de rede elétrica de energia energizada e desenergizada, com 1.703  empregados, incluídos os trabalhadores afastados em gozo de benefício previdenciário, os quais prestam atualmente seus serviços exclusivamente para concessionárias de energia, motivo pelo qual seus empregados, em sua maioria, estão sujeitos às condições perigosas, sendo em sua maioria exercentes das funções de eletricistas e motoristas.

Diz ainda que, do quantitativo acima apontado, 1.136 dos empregados atuam no estado do Pará, sendo que atualmente não presta qualquer serviço no município de Santarém.

Sustenta ainda, que em seu entendimento, a base de cálculo da cota de aprendizes deve ser diferenciada, em razão da exclusão dos eletricistas e motoristas, em atenção ao parâmetro estipulado na CLT, e pede a improcedência da ação.

A análise e decisão da juíza

Após analisar o caso, a juíza Giovanna Correa considerou que “deverão compor a base de incidência do percentual de contratação de aprendizes todas as funções que demandem formação profissional, independentemente de serem proibidas para menores de dezoito anos, considerada a Classificação Brasileira de Ocupações do Ministério do Trabalho e Previdência Social”.

Para a magistrada, “a base de incidência do percentual de contratação de aprendizes deve ser composta por todos os profissionais que desempenham funções elencadas na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), excluído apenas do cálculo de contratação de aprendizes as funções que demandam habilitação profissional de nível técnico ou superior e os cargos de direção, gerência e de confiança”.

“Observe-se que embora seja proibido o exercício de atividades perigosas por menores de 18 anos (…), a lei não dispensou do computo da referida base de cálculo as funções que demandem habilitação, ou mesmo aquelas consideradas perigosas, em razão da possibilidade de contratação de aprendiz até 24 anos de idade.  Portanto, a exclusão dos motoristas e eletricistas da base de incidência do percentual de contratação de aprendizes, além de não possuir amparo normativo, causaria privilégio injustificado às empresas que prestam  serviços para concessionárias de energia, e ofensa aos princípios da isonomia, da livre concorrência e da livre iniciativa (…), comprometendo sensivelmente a empregabilidade de jovens empregados e promovendo indesejável dumping social”, argumentou a Juíza.

“Ao contratar jovens aprendizes, a empresa investe o no capital humano da região, promove o crescimento econômico sustentável e fortalece os laços com a comunidade”, acrescentou.

Na sentença em desfavor da Endicon, a magistrada conclui que ficou incontroverso que a empresa praticou ato ilícito omissivo ao não incluir os cargos de motoristas e eletricistas na  base de cálculos da cota de aprendizagem, bem como não contratar ao longo dos anos aprendizes, nem mesmo na cota mínima, mesmo quando ainda não se encontrava em situação de recuperação judicial.

“Ademais, a testemunha trazida pela reclamada [Endicon], Sr.  Eduardo Ferreira Beltrão, em depoimento, afirmou: ‘Que no total de empregados da reclamada acima de 90% são entre motoristas e eletricistas’, do que se conclui ser uma quantidade expressiva de aprendizes que deixaram de ser admitidos pela reclamada”, disse a Juíza, completando:

“O dano social, decorrente da reiterada negligência da reclamada é patente, pois ao deixar de contratar aprendizes, inviabilizou a inclusão social e profissional de jovens empregados no mercado de trabalho e o aprendizado de ofícios técnico-profissionais, gerando prejuízos à formação educacional desses jovens, que deixam de ser matriculados nos cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem. A culpa lato sensu, na modalidade de dolo (no caso específico), é clara, pois a reclamada teve a intenção de proceder desta forma, ao deixar de contratar empregados aprendizes”.

Por Baía

O  Impacto

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