‘Tribunal Popular’ que acontecerá em Santarém julgará simbolicamente o projeto da Ferrogrão
Diferentes povos indígenas, comunidades tradicionais, organizações e movimentos sociais promoverão, no dia 4 de março, das 9h às 18h, um ‘Tribunal Popular’ para julgar simbolicamente o projeto da Ferrogrão, seus impactos socioambientais e as empresas cúmplices destas violações. A atividade visa influenciar uma decisão pendente do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o mega-projeto, patrocinado pelas grandes traders do agronegócio, como Cargill, Bunge e Dreyfus.
Organizado pela APIB, COIAB, Associação Pariri, Instituto Kabu, Movimento Tapajós Vivo, Comissão Pastoral da Terra, GT Infra, Amazon Watch, Inesc, Fase e Stand Earth, o evento ocorrerá em Santarém, no Pará, no Auditório da unidade Tapajós da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA).
Dezenas de indígenas de povos como os Munduruku, Kayapó, e Apiacá, juntamente a quilombolas, assentados, especialistas e demais habitantes da região participarão da audiência. Alessandra Korap Munduruku, vencedora do Prêmio Goldman 2023, devido ao seu êxito na expulsão da mineração industrial das terras Munduruku, será uma das lideranças presentes.
O evento ocorre no mesmo mês em que o juiz Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal deve voltar a decidir sobre as possibilidades de desenvolvimento da ferrovia no contexto da Ação Direta de Inconstitucionalidade que conquistou a suspensão liminar do projeto. No ano passado, Moraes autorizou a retomada dos estudos sobre a Ferrogrão e ensejou a criação de um Grupo de Trabalho do Ministério dos Transportes (Portaria 994/2023) para acompanhamento do tema.
Ameaças
Criada para escoar as commodities de soja e milho produzidos no centro-oeste até os portos da Amazônia – como alternativa “mais barata” ao trajeto até o Porto de Santos –, a estrada de ferro deve percorrer quase mil quilômetros de Sinop, em Mato Grosso, até Miritituba, no Pará, passando por Itaituba, no oeste paraense. Se sair do papel, a ferrovia pode desmatar 49 mil quilômetros quadrados (km²) em 48 cidades, além de modificar o traçado de 17 unidades de conservação e afetar seis terras indígenas e três áreas indígenas com presença de povos isolados. A área é 64% superior ao desmatamento recorde da Amazônia em 2022, de 17,7 mil km², maior que o estado do Rio de Janeiro e países como Eslováquia, Dinamarca e Holanda.
Além de ignorar as alternativas logísticas, o projeto tem estudos técnicos falhos, viabilidade econômica e socioambiental questionável, provocará um aumento do desmatamento e da grilagem de terras e promoverá a expansão da fronteira agrícola e industrial da mineração em um bioma ameaçado e de importância crítica. Dados da PUC-Rio e da Climate Policy Initiative estimam que haverá uma perda equivalente a mais de 285 mil campos de futebol de vegetação natural – o que corresponde à emissão de mais de 75 milhões de toneladas de carbono.
Estudos mostram que pelo menos 16 Terras Indígenas da Amazônia e 104 assentamentos rurais serão afetados pelos impactos sinérgicos e cumulativos da ferrovia. O projeto afeta profundamente os modos de vida e os direitos dos habitantes da região, que não foram consultados, em flagrante violação à Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho.
Há dez anos no papel e com custo subestimado em R$ 24 bilhões, a Ferrogrão tem prazo de concessão de uso de 69 anos e é motivo de protesto desde que foi concebida, não só pela alteração nos limites de unidades de conservação, mas principalmente pela condução do processo que desde o início não ouviu os povos Munduruku, Kayapó e Panará, dentre outros, diretamente afetados pelo projeto. Vale lembrar que novos portos, hidrovias e rodovias também estão inclusos no conjunto de obras, com mais impactos econômicos, sociais e ambientais.
Mais informações:
Cartilha Ferrogrão PPI: cartilha-ferrograo-mai2020.pdf (socioambiental.org)
Apresentação Ferrogrão PPI: Apresentação do PowerPoint (socioambiental.org)
Impactos ambientais da Ferrogrão: PB Os-impactos-ambientais-da-Ferrogrão-1.pdf (climatepolicyinitiative.org)
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Fonte: Ascom / Uma Gota No Oceano
Foto: Instituto Kabu
Mete o pé na bunda de quem está na frente e passa a ferrovia,quem gosta de trabalhar agradece