Empresas são acusadas de revender 4,3 toneladas de ouro de garimpos ilegais

O ministério Público Federal, através dos procuradores da República Adriano Augusto Lanna de Oliveira, Gilberto Batista Naves Filho, Igor da Silva Spindola, Igor Lima Goettenauer de Oliveira e Priscila Ianzer Jardim Lucas Bermúdez, recorreu à Justiça pela anulação parcial de sentenças a favor de três empresas acusadas de revender ouro extraído de forma ilegal no Pará. Os casos foram julgados e as empresas não foram consideradas culpadas.

Iniciados em 2021, os processos surgiram a partir de ação do MPF contra as distribuidoras de valores mobiliários FD’Gold, Carol e OM, após estudo desenvolvido pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) chamado “Legalidade da produção de ouro no Brasil”, que revela com perfeição os descaminhos do ouro brasileiro e conduz a uma perturbadora visão sobre a extração ilegal de ouro procedente de áreas proibidas, como terras indígenas.

A metodologia empregada pela UFMG permitiu constatar o predomínio da ilegalidade na cadeia do ouro ao cruzar dados públicos sobre a produção mineral brasileira, como as informações prestadas pelas empresas no pagamento da Contribuição Financeira por Exploração Mineral (Cfem), nos registros de Permissões de Lavras Garimpeiras (PLGs) da Agência Nacional de Mineração (ANM) e nas imagens do monitoramento da floresta amazônica do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

“Da produção de 30,4 toneladas de ouro do estado do Pará, no período de 2019 a 2020, ao menos cerca de 17,7 toneladas (58,4%) foram extraídas com falsa indicação de origem, seja pelas evidências de extrapolação dos limites autorizados para a lavra pela ANM, seja pela indicação de áreas de floresta intacta ou sem título de lavra vigente como origem do ouro”, explicou o MPF nas ações judiciais.

Análises de imagens de satélite apresentaram evidências de irregularidades na produção de ouro, pois não havia sinal de exploração minerária em nenhuma das áreas apontadas pelas empresas como locais de extração do ouro.

As investigações do MPF, que contaram com levantamento científico feito em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), concluíram que as 4,3 toneladas de ouro não vieram de áreas legalizadas e sim de um dos muitos garimpos ilegais que proliferam nos municípios de Itaituba, Jacareacanga e Novo Progresso, no sudoeste do Pará, áreas marcadas pela degradação ambiental, pelo desflorestamento, pelo revolvimento de solos, pelo lançamento de efluentes e pela emissão de resíduos de mercúrio na natureza.

As investigações classificaram a situação socioambiental desses municípios como “desesperadora”, e que não existe uma especial e rigorosa resposta do Sistema de Justiça diante do ilícito. “A incorporação ao mercado lícito de produtos oriundos da destruição da floresta deve ser asfixiada, sob pena de se permitir ao agente econômico obter vantagem da ilegalidade, da destruição de ecossistemas e da violação a direitos de povos indígenas, com a externalização de todos os resultados negativos de sua conduta para a coletividade”, pontuou a investigação.

Após solicitação do Ministério Público Federal, a Universidade Federal de Minas Gerais compartilhou os dados públicos relativos à identidade dos principais compradores de ouro com origem ilegal nos municípios de Itaituba, Jacareacanga e Novo Progresso. Foi compreendida a ilegalidade como origem do minério, de permissões de lavra garimpeira inexploradas, temporalmente vencidas ou não ainda emitidas (procedimentos em fase de requerimento).

“Cuidados mínimos preventivos a danos ambientais não foram adotados, consolidando-se uma prática empresarial de cegueira deliberada que acabou por contribuir para a proliferação dos danos associados ao garimpo ilegal na região”, assinalam os membros do MPF no recurso.

Nos três processos judiciais ajuizados, as contestações das empresas não foram disponibilizadas ao MPF. Sem acesso a essas manifestações, o MPF não pôde apresentar réplicas ou indicar possíveis novas provas que considerasse necessárias. Esse fato implica na violação da legislação processual.

O MPF, portanto, requereu ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) que anulasse os atos processuais praticados a partir dessas ocorrências e cassasse as sentenças decretadas nos processos. Proferidas no final de setembro, as sentenças consideraram que as acusações do MPF contra as empresas não procedem.

No requerimento, também há o pedido para que as empresas revisem suas políticas de responsabilidade ambiental, a implantação de mecanismos de transparência a respeito dos títulos minerários que embasam as compras de ouro em regiões auríferas nos municípios mediante publicação mensal, em ferramenta virtual e facilmente acessível, do rol de títulos minerários (número dos processos administrativos) de que oriunda as compras do mês imediatamente anterior. O MPF também insiste no pedido para que sejam suspensas as atividades das empresas no sudoeste do Pará e a condenação das três distribuidoras de valores a pagar um total de R$ 10,6 bilhões por danos sociais e ambientais.

Os recursos destacam que as fraudes apontadas nas ações e que a quantidade de ouro adquirida pelas empresas, se referem ao chamado esquentamento chapado de ouro, em que a vinculação do ouro a Permissões de Lavra Garimpeira validamente emitidas pela Agência Nacional de Mineração e temporalmente vigentes e áreas florestadas sem nenhum traço de exploração garimpeira são utilizadas para dar aparência de legalidade a transações de aquisição de ouro de origem ilegal, geralmente de terras indígenas e unidades de conservação.

O MPF ressalta que essa falsa indicação de origem, pelo caráter grosseiro da fraude e pelos valores envolvidos, seria de fácil identificação por parte das empresas, por meio de diversas medidas preventivas, se acaso houvesse mínimo interesse das distribuidoras de valores.

As empresas têm prazo de 15 (quinze) dias para apresentar contrarrazões.

Por Rodrigo Neves com informações do Ministério Público Federal
Imagem: Reprodução/arquivo Ibama 2018

 

 

 

O Impacto

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