Petrolíferas pressionam governo a indexar contratos
Vamos para o quarto ano seguido com o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medido pelo IBGE, com alta anual próxima de 6% ou até um pouco acima (em 12 meses até junho está em 6,7%). Essa persistência de alta de preços, apesar de não ser explosiva, segundo analistas, acaba criando demanda adicional ao governo para reposição da inflação passada, a chamada indexação. Essas pressões ficaram claras ontem, com empresários brasileiros e estrangeiros pleiteando da Agência Nacional do Petróleo (ANP) que o novo modelo de partilha do pré-sal — cujo primeiro contrato, da área de Libra, terá prazo de 35 anos — inclua cláusulas de correção monetária. Enquanto isso, trava-se no governo, entre os ministérios da Fazenda e do Trabalho, uma queda de braço sobre a indexação do seguro-desemprego.
— A resistência da inflação em patamar, não explosivo, mas relativamente alto, perto de 6% nos últimos anos, acaba levando a mais demandas de reajustes — diz o professor da PUC Rio, Luiz Roberto Cunha.
Ontem, empresários do setor de petróleo voltaram a pedir algum tipo de indexação nos contratos do pré-sal. Para defender a atualização monetária do dinheiro gasto para explorar petróleo, o presidente no Brasil da gigante francesa Total, Denis Palluat, argumentou que há riscos que a empresa não pode controlar:
— Podemos controlar riscos inerentes à atividade, mas a inflação não depende de nós. A inflação depende da política do governo, das condições econômicas.
Mas, no governo, o Ministério da Fazenda é contra a indexação dos contratos. E, segundo a diretora geral da ANP, Magda Chambriard, o governo não pretende conceder a correção da inflação para os investimentos que serão realizados em Libra:
— Por enquanto, não estamos considerando essa hipótese (de correção monetária), porque o valor dos investimentos será compensado em tempo muito curto.
Para Paulo Levy, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), como os investidores serão remunerados em petróleo, a indexação não se encaixa neste caso:
— Pode haver o temor de quebra de contrato ou de regras não muito claras.
Apesar de o Plano Real, que estabilizou a economia em 1994, ter proibido por lei a indexação de contratos com prazo inferior a um ano, hoje os índices de inflação ainda exibem parcela próxima de 30% de sua composição contaminada pela inflação passada, segundo cálculos de Cunha. São basicamente os preços de serviços e as tarifas administrados. O aumento do peso dos serviços tanto na economia brasileira como no orçamento das famílias também explica a persistência da indexação:
— O peso dos salários é grande no setor. Portanto, o salário mínimo com reajuste anual acima da inflação e a oferta apertada no mercado de trabalho fazem a indexação ganhar mais força.
Além de tarifas e contratos, outro resquício da indexação no Brasil, segundo especialistas, é a regra de remuneração da caderneta de poupança.
Até mesmo no governo, há pressões contra e a favor da reposição inflacionária. Os ministérios da Fazenda e do Trabalho divergem sobre a forma como o seguro-desemprego e o abono salarial (PIS) são corrigidos. Preocupada com a elevação das despesas do Orçamento, a Fazenda quer que os benefícios, no caso de quem ganha acima do mínimo, continuem sendo reajustados pelo INPC (índice de inflação), regra adotada no início do ano. A pasta do Trabalho, por sua vez, quer seguir a mesma regra de correção do salário mínimo. O piso salarial é indexado pelo INPC acrescido da taxa de expansão da economia de dois anos antes.
R$ 25,7 bi com seguro-desemprego
Enquanto o mínimo foi corrigido em 9% em janeiro, o seguro-desemprego para quem ganha acima do piso subiu 6,2%. Já o abono, que equivale a um mínimo, também passaria a ser corrigido apenas para repor as perdas com a inflação. Para isso, será preciso alterar a Lei 7.998/1990, que instituiu o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e definiu as regras do abono.
O principal argumento da equipe econômica é que a fonte de recursos, o FAT, tem registrado déficit, o que obriga o Tesouro Nacional a fazer aportes. Segundo o Ministério do Trabalho, será necessário injetar R$ 7 bilhões no Fundo neste ano.
As despesas com seguro desemprego saíram de R$ 19,9 bilhões em 2010 para R$ 25,7 bilhões em 2012. Só no primeiro semestre deste ano (dados preliminares), os gastos já somam R$ 12,2 bilhões. O custo com o abono foi de R$ 12,3 milhões em 2012. Segundo os técnicos da área econômica, a indexação ao salário mínimo dificulta o combate à inflação.
— Não existe nada dizendo que os benefícios tenham que seguir a regra do salário mínimo. Temos uma preocupação fiscal com esse tema — disse um técnico.
Levy, do Ipea, acredita que esse movimento pela reposição inflacionária esfrie com a esperada queda da inflação:
— Soma-se a isso a postura mais rigorosa do Banco Central, ao subir juros.
Elson Teles, economista do Itaú Unibanco, lembra do nosso histórico de inflação, que alcançou mais de 2.000% ao ano meses antes do Plano Real, em 1994:
— Só com índices próximos de 3% reduziremos o atual nível de indexação.
Fonte: O Globo